segunda-feira, junho 22, 2009

LOKI - ARNALDO BAPTISTA



O que dizer de LOKI - ARNALDO BAPTISTA (2009)? O documentário é tudo que eu esperava e muito mais. Até me senti um pouco "abutre", querendo que o filme enfatizasse os aspectos mais marcantes e traumáticos da vida de Arnaldo Baptista - sua relação com Rita Lee, o envolvimento com o LSD, sua tentativa de suicídio e as sequelas que ele carrega até hoje. E o filme não se acovarda e nem soa sensacionalista, lucrando com as desgraças do artista. Pelo contrário, não tem como não perceber em todos os envolvidos com o projeto um carinho e uma admiração enormes por esse homem especial cuja importância na história da música brasileira até hoje é subestimada. E o documentário coloca o músico no merecido lugar no panteão dos grandes artistas. Pena que para isso seja necessário o aval até do filho do John Lennon, que aparece entre aqueles que dão seus depoimentos.

O diretor Paulo Henrique Fontenelle tem a sabedoria de não querer inventar muito. Seu registro é convencional, dentro da estrutura do documentário, mas a força da história de vida de Arnaldo, das preciosas imagens documentadas dos Mutantes no auge e no declínio, passando pela fase de depressão emocional e loucura do artista até o momento da emocionante reunião do grupo (sem Rita Lee) já são suficientes para tornar o filme imperdível. Mas os depoimentos tornam tudo ainda mais rico. Vê-se diversas vezes as pessoas com aquele brilho especial no olhar, ao lembrar de determinados momentos em que suas vidas se cruzaram com a do cantor e compositor. Entre aqueles que dão seus depoimentos, os mais conhecidos são Sérgio Dias, Gilberto Gil, Tom Zé, Lobão, John Ulhôa, Zélia Duncan, Nelson Motta, Rogério Duprat, Roberto Menescau e Liminha, embora pessoas menos conhecidas e mais ligadas à intimidade do artista tragam depoimentos ainda mais importantes.

As imagens de arquivo são brilhantes, flagrando momentos de plena alegria de Arnaldo, quando ele estava completamente apaixonado por Rita Lee - linda nos anos 60, como pode também ser visto no filme AS AMOROSAS, de Walter Hugo Khouri, que conta com uma performance dos Mutantes. Pequenos detalhes, como o olhar de completa devoção por ela nos shows mostram o seu grau de paixão e adoração. Sente-se a falta de Rita Lee no documentário, mas é até compreensível sua ausência. Talvez ela ainda guarde mágoa dele, principalmente depois do que ele fez, ao tentar se matar no dia do aniversário dela. Rita Lee também se negou a participar dos shows de reunião dos Mutantes, sendo substituída por Zélia Duncan. E por falar no show de reunião, como não se emocionar ao ver Arnaldo cantando com Tom Zé "Qualquer bobagem"? E como não sentir um prazer tremendo ao ver um público gigante cantando junto com a banda a "Balada do louco", sabendo da dimensão que essa canção ganhou com o histórico de vida de Arnaldo Baptista?

Outro acerto do filme é a escolha pela ordem cronológica dos acontecimentos. Depois de uma pequena introdução que registra um pouco do momento atual, o filme não perde muito tempo na infância do artista e parte direto para o que interessa, que é a formação dos Mutantes. Nota-se desde o início que Arnaldo tinha uma personalidade muito alegre, quase inocente. Rita Lee foi sua primeira namorada, sua primeira mulher. E ele não aguentou a barra quando ela o abandonou e deixou a banda. Quando Arnaldo também deixa os Mutantes, aí é que o clima fica triste mesmo, como atestam muito bem o baterista Dinho Leme e o baixista Liminha. Era o fim. Mas também era o início de uma fase solo, que embora muito sofrida, resultou num disco histórico, LÓKI? (1974), considerado por muitos um dos maiores discos da música brasileira. É também o disco onde se pode ver a persona desnuda do artista.

Uma das coisas que mais mexem comigo é afirmação de felicidade na letra de "Balada do Louco". Eu fico imaginando se ele está sendo sincero quando diz ao final da canção "eu sou feliz". Talvez esteja, já que em seu atual estado parece ter revertido à mente de uma criança, embora fale com lucidez de tudo que passou, dos momentos mais dolorosos. Em certo momento, Liminha chega a atribuir um pouco da culpa do fim da banda e das sequelas de Arnaldo ao contato com o LSD. Ele parece se sentir um pouco culpado por isso. O irmão Sérgio Dias também se sente culpado por ser mais um daqueles que não compreendiam Arnaldo, que o consideravam um louco durante os anos de silêncio e afastamento. E sentimentos como culpa, carinho, amor, rejeição, solidão e euforia se misturam. Ver o filme é mergulhar um pouco nesse oceano de emoções.

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