quarta-feira, fevereiro 11, 2015

PRESENÇA DE ANITA



Na época que PRESENÇA DE ANITA (2001) foi exibido na televisão, eu já tinha um certo preconceito com as produções da Rede Globo. Não apenas as telenovelas, mas o que era produzido em conteúdo supostamente mais caprichado, como as minisséries. Ainda assim, sempre que a tevê estava ligada, eu não conseguia tirar os olhos daquela garota só de calcinha em cenas tão ousadas e com um brilho tão especial no olhar, que ofuscava todos os demais e ainda destoava um pouco na interpretação, que fugia um pouco do "padrão Globo de qualidade".

Mel Lisboa foi um achado e tanto e o seu papel repercutiu tanto em sua vida que ela não conseguiu mais ser tão produtiva depois do vendaval que se transformou sua vida, com direito a ensaio para a revista Playboy (um dos mais belos de todos os tempos) e gente estranha a perseguindo e a assustando. Uma pena que ela não tenha feito muito cinema. Os poucos filmes em que trabalhou são bem pouco expressivos. Mas seu papel como Anita foi suficiente para elevá-la ao panteão das maiores musas do audiovisual brasileiro.

A minissérie marcou época também por ser extremamente ousada e picante, exalando sexo e sensualidade, não só na relação entre Anita e Nando (José Mayer), mas há também uma subtrama bem interessante da personagem de Vera Holtz, a irmã de Lúcia Helena, vivida por Helena Ranaldi. Aliás, não sei se é coincidência ou não ela ter o nome de Helena, que costuma ser o nome das protagonistas das telenovelas de Manoel Carlos, o roteirista da minissérie.

Outro elemento que chama bastante atenção na minissérie é seu enredo ligado ao sobrenatural. Anita, desde a primeira vez que entra em cena, já demonstra sentir uma atração forte pelo mórbido, ao se mudar para um sobradinho em que ocorreu uma tragédia envolvendo dois amantes. Um sujeito matou a namorada e em seguida matou a si mesmo. Anita conta a Nando o quanto acha esse tipo de paixão excitante e fascinante. E é justamente por isso que ela havia se mudado para lá. Inclusive, até adota para alguns o nome de Cíntia, o nome da moça assassinada, como se quisesse encarnar seu espírito.

Mais tarde, veremos que esse aspecto sobrenatural não é em vão na série, que para muitos é lembrada mais como uma simples história de traição. Aliás, não tão simples assim, pois há uma diferença de idade grande entre os amantes, e há também as várias vezes em que Anita fala de um sujeito bem mais velho que a apresentou para a vida e para o sexo, desde a adolescência, o que deixava Nando completamente indignado. Por isso é difícil não fazer ligações com Lolita, de Vladimir Nabokov.

Enquanto isso, Helena Ranaldi, ou melhor, Lúcia Helena, sofre o fato de o marido estar cada vez mais distante, inventando desculpas para se afastar dela. Trata-se de uma personagem bem ingênua. Ela ama demais Nando para deixar que sua família estrague ainda mais o que está prestes a desmoronar, o seu casamento. Dá, inclusive, para comparar o enredo básico com o da recente série THE AFFAIR, que também traz a história de um escritor meio loser que começa a ter um caso com outra mulher e arranja a desculpa de que está pesquisando material para o seu livro.

PRESENÇA DE ANITA também tem um quê de JANELA INDISCRETA, ao mostrar alguns dos acontecimentos do sobradinho pelos olhos de um homem e um adolescente que moram numa mercearia em frente. Eles veem o que acontece ali quando Anita está com Nando e o rapazinho chega a se aproximar bastante de Anita, a ponto de perder a virgindade com ela em determinado episódio.

Uma das boas surpresas da minissérie pra mim foi não saber exatamente como acabava. Já havia visto o spoiler da cena da facada em algum especial da emissora, mas não sabia o que acontecia depois, o que acaba por tornar a série especial, memorável mesmo, com direito a uma inventiva montagem paralela.

A única coisa que poderia diminuir mesmo na minissérie é a quantidade de vezes que toca "Ne me quitte pas". Para quem vê em ritmo de maratona, isso chega a incomodar. Mas deve funcionar para quem assiste um episódio por dia, como foi justamente pensada.

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