Já faz algumas semanas que eu tive o prazer de rever este documentário de Martin Scorsese. Tinha visto pela primeira vez quando foi exibido na televisão – acho que na extinta Rede Manchete. Era uma série de documentários sobre as cinematografias de diversos países em comemoração aos 100 anos de cinema. Apenas o cinema americano ganhou um doc tão longo. Mas, levando em consideração a grandeza do cinema produzido nos Estados Unidos, quatro horas de filme ainda é pouco. E Scorsese mostra tanto entusiasmo e amor pelos filmes que nos sentimos contagiados. Está um pouco cansado do cinema e quer revitalizar a sua fé e o seu amor? Basta rever UMA VIAGEM PESSOAL ATRAVÉS DO CINEMA AMERICANO (1995). Como ainda falta eu ver mais da metade dos filmes citados por Scorsese, vejo que ainda tenho uma longa e deliciosa jornada pela frente. Graças ao documentário, vi recentemente AURORA, de F.W. Murnau, e CIDADE TENEBROSA, de André De Toth, e baixei outros. Que infelizmente ainda não tive tempo de ver devido à vida tão cheia de trabalho e tão pouco espaço para os prazeres.
O fato de o documentário ser bem pessoal torna-o muito gostoso de ser visto. Da primeira vez que assisti, lembro que o filme que mais me deixou com muita vontade de ver foi SANGUE DE PANTERA, de Jacques Tourneur. Só pude vê-lo anos depois, quando foi lançado em dvd no Brasil. Hoje em dia, está muito mais fácil conseguir qualquer um dos filmes citados. Chamou-me a atenção a memória que Scorsese tem de quando ele tinha quatro anos de idade e foi levado para o cinema. O filme era DUELO AO SOL, de King Vidor, e ele ficou impressionado com aquilo, com aquele colorido, com a violência e a sexualidade. Nas cenas violentas, ele disse que tapava os olhos. E para que alguém lembre, de maneira tão viva, de algo que aconteceu tão cedo em sua vida, só pode mesmo ser algo extremamente marcante. Como sabemos que foi. E quem sabe não veio daí a sua obsessão pela violência?
Scorsese procura não abordar os filmes de sua geração, que tomou de assalto a velha Hollywood. Ainda assim, podemos ver uma cena de BONNIE AND CLYDE – UMA RAJADA DE BALAS, de Arthur Penn, e até mesmo um trecho de OS IMPERDOÁVEIS, de Clint Eastwood, produção dos anos 90. A exceção ao clássico de Clint se dá ao fato de que o filme representa o último suspiro dos westerns.
O interessante do documentário é que Scorsese faz questão de enfatizar as produções B, filmes que não alcançaram tanta popularidade. Não entram obras tão populares como E O VENTO LEVOU, CASABLANCA ou O MÁGICO DE OZ. Talvez também porque não sejam tão especiais para Scorsese. Mas como sempre a regra tem as suas exceções e obras como UM CORPO QUE CAI, de Alfred Hitchcock, CIDADÃO KANE, de Orson Welles, SANSÃO E DALILA e OS DEZ MANDAMENTOS, ambos de Cecil B. De Mille, 2001: UMA ODISSEIA NO ESPAÇO, de Stanley Kubrick, e RASTROS DE ÓDIO, de John Ford, são mencionadas com destaque. Mas isso porque esses filmes se encaixam na divisão que Scorsese faz entre os diretores: o contador de histórias, o ilusionista, o contrabandista e o iconoclasta. Orson Welles, com seu longa de estreia, por exemplo, seria um iconoclasta que não poderia ficar de fora. Ele atacou de frente o sistema. E pagou muito caro por isso.
Não dá pra falar de tudo o que impressiona no documentário, pois levariam muitas linhas, mas algumas cenas de filmes que eu ainda não vi me marcaram tremendamente. Caso de ALMAS EM FÚRIA, de Anthony Mann (a sequência do enforcamento é de dar um aperto no peito), A IMPERATRIZ GALANTE, de Josef Von Sternberg (um dos filmes onde o diretor paga tributo à sua estrela Marlene Dietrich), e ALMAS PERVERSAS, de Fritz Lang (a sequência do ataque com faca de Edward G. Robinson a Joan Bennet ainda tem um grau de violência impressionante, mesmo com os banhos de sangue explícitos do cinema contemporâneo). Enfim, são muitos filmes e é até uma boa deixar o livro na cabeceira para de vez em quando lembrar que tem várias obras-primas o esperando enquanto você está num programa meia-boca num cinema de shopping.
Demorei a escrever sobre o documentário, pois estava querendo terminar o livro baseado nele antes. Ainda que não acrescente nada de novo, recomendo o livro pela beleza da encadernação e das fotos (se bem que algumas poderiam ser coloridas) e pelas transcrições de diálogos.
Agradecimentos especiais a Carol Vieira.
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