Apesar de ser um filme intimista e cujos melhores momentos se passam em interiores, ÚLTIMO TANGO EM PARIS (1972) traz algo da grandiloquência que se faria presente em obras posteriores de Bernardo Bertolucci, como 1900 (1976), O ÚLTIMO IMPERADOR (1987) e O CÉU QUE NOS PROTEGE (1990). Isso se deve talvez à presença de um ator do porte de Marlon Brando, um gigante da atuação saído direto do sucesso estrondoso de O PODEROSO CHEFÃO, mas que aqui se mostra mais contido, como pede o personagem e o tom do filme.
ÚLTIMO TANGO EM PARIS é bastante citado pela antológica cena da manteiga, usada como lubrificante para o sexo anal entre os amantes vividos por Brando e Maria Schneider, e também pelas cenas de sexo de modo geral, mas não dá pra dizer hoje que se trata de um filme a ser visto pelo sexo. Um espectador provavelmente se sentiria frustrada se fosse vê-lo exclusivamente pelas cenas sensuais. Afinal, elas são importantes, mas não o que há de mais importante. Sem falar que o sexo no filme é agressivo, mais uma necessidade ou um vício do que um prazer.
Além do mais, a primeira cena dos dois é um estupro. Talvez nos dias de hoje o filme não fosse bem visto por isso. Nos anos 1970, uma cena de estupro como a de SOB O DOMÍNIO DO MEDO, de Sam Peckinpah, podia até mesmo trazer algo de dúbio no comportamento da moça agredida. Uma ousadia que raramente se encontra nos novos filmes.
A trama de ÚLTIMO TANGO EM PARIS é muito simples. Um homem à deriva e deprimido e uma jovem mulher que está prestes a casar disputam o aluguel de um apartamento decadente. No lugar vazio de móveis daquele primeiro dia, os dois trocam poucas palavras. Mas não demora muito para que Brando rasgue a calcinha da moça e faça sexo com ela de maneira quase animalesca. Seu corpo já perto da fase gorda parece que vai quebrar ao meio aquela jovem franzina, de rosto angelical, mas de seios fartos e belos.
E o filme bem que poderia se concentrar apenas nos encontros dos dois nesse mesmo apartamento, pois esses são justamente os melhores momentos. Não que as demais cenas, fora daquele ambiente fechado, não sejam também boas, mas aquele lugar, usado como uma espécie de fuga de suas vidas reais, em que os dois são estranhos que não conhecem o nome um do outro (faz parte do jogo imposto por ele), tivesse algo de muito especial. Como se fosse um lugar que não existisse no mundo real, um universo paralelo.
O fato de ela aparecer algumas vezes nua e ele não pode ter a ver com o fato de Brando não ter mais o mesmo corpo de galã dos anos 1950, mas, para a trama, faz mais sentido pensar que ela se desnuda mais para ele, ela está mais à sua disposição, como um objeto sexual pronto para receber as ordens dele. E esse universo só deles, seu abrigo, é bem valorizado pela fotografia em tons pastéis do fiel amigo e colaborador Vittorio Storaro.
O final pode parecer um tanto irreal/surreal, estranho, mas todo o filme parece carregado de um torpor que faz com que cada cena se assemelhe a um sonho. Especialmente as que mostram eles dois. As que mostram as vidas particulares de ambos – ele lidando com o suicídio da esposa; ela, com o namorado metido a cineasta (Jean-Pierre Léaud) – têm menos esse aspecto.
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