quinta-feira, maio 29, 2014

PELO MALO



Alguns filmes têm a capacidade de ficar conosco durante dias e até meses, com imagens fortes e penetrantes. Isso acontece quando afeta de alguma maneira nossos sentimentos. E PELO MALO (2013), essa pequena produção venezuelana, de enredo aparentemente simples, já pode ser considerada uma das melhores surpresas do ano. Os inúmeros prêmios que o filme ganhou em diversos festivais fazem sentido depois que o assistimos.

No caso de PELO MALO, os principais sentimentos que o filme reserva para o espectador não são tão agradáveis. É ver o filme e sair do cinema com um gosto amargo na boca. Mas ainda assim admirado com a obra que se acabou de ver, que carrega muitas influências dos filmes iranianos protagonizados por crianças, como ONDE FICA A CASA DE MEU AMIGO?, de Abbas Kiarostami, O BALÃO BRANCO, de Jafar Panahi, e FILHOS DO PARAÍSO, de Majid Majid.

Na trama de PELO MALO, cujo título em espanhol sabiamente não foi traduzido para o português no Brasil, um jovem garoto está prestes a voltar às aulas, mas antes precisa tirar uma fotografia para a escola. Ele tem cabelos cacheados, mas deseja tirar uma foto com cabelo liso e roupa de cantor. A situação de sua família não é das melhores: a mãe, que antes trabalhava como vigilante noturna, foi demitida, e vive à procura de emprego, sem poder nem mesmo pagar a foto do menino.

Mas o que parece uma trama envolvendo preconceito racial (por causa do "cabelo ruim" do título) revela-se outra bem diferente, quando a mãe começa a achar que o comportamento de seu filho está um pouco estranho e que ele pode vir a ser gay. Assim, o filme segue dois núcleos: o do garoto e seu desejo inocente de conseguir algo simples, e da mãe, que passa por situações de humilhação para conseguir o emprego de volta. Entre os dois polos, um sentimento negativo se instala a ponto de intoxicar não apenas os personagens, mas a nós, espectadores, também.

Afinal, como lembrar das duas últimas cenas finais e não ficar com um nó na garganta diante do que nos é apresentado? Seja relativo às palavras duras que ouvimos, seja relativo à imagem que antecede os créditos. É quando percebemos a força imensa desse pequeno filme. Confesso que até agora meu coração ainda pesa.

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