quinta-feira, julho 14, 2022

MS. MARVEL



Não durou muito a minha empolgação com MS. MARVEL (2022). Na verdade, a empolgação não foi apenas minha. Nos canais de YouTube que cobriam a série, o entusiasmo predominava. Mas o medo de que a minissérie perdesse o rumo a partir do momento que se tornasse uma história tradicional de super-herói, com direito a luta com vilão etc. estava no ar. MS. MARVEL começou com dois episódios adoráveis, que nos ambientam na rotina de vida da adolescente Kamala Khan (Iman Vellani) e sua dificuldade de pertencimento, sendo ela uma paquistanesa vivendo em Nova Jersey. Até há um gostinho das antigas histórias do Homem-Aranha nos quadrinhos.

Comecei a ler os quadrinhos da heroína, talvez a mais importante surgida na última década na Marvel, mas confesso que não me animei muito com as histórias, por mais simpáticas que fossem. Os próprios poderes da personagem, de fazer crescer os braços, pernas, corpo e até de se transformar em alguma coisa ou pessoa me pareceu muito Homem-Borracha. Enfim, os poderes talvez tivessem algo de simbólico do sentimento da personagem, mas isso não os torna exatamente geniais por isso.

Para a versão do MCU, não achei de todo ruim a mudança nos poderes e nas origens. Para começar, a Marvel no cinema por enquanto não trouxe ainda os Inumanos – a não ser pela aparição do Raio Negro em DOUTOR ESTRANHO NO MULTIVERSO DA LOUCURA. E isso foi em um outro universo. Ou seja, por mais que o estúdio da Casa das Ideias já tenha fabricados um monte de filmes e agora também de séries, não dá tempo de aplicar tantos personagens que fazem parte de décadas de histórias em quadrinhos nas telas.

Então, a solução foi trazer uma nova origem para Kamala Khan, ou para os poderes dela, no caso. Assim, tudo começa quando ela ganha um bracelete, herança de sua bisavó. Mais adiante seremos apresentados a um flashback dessa sua bisavó, interpretada por uma atriz paquistanesa muito bonita chamada Mehwish Hayat. Aliás, muita gente reclamou desse longo flashback da personagem, mas para mim foi um alívio diante de uma trama principal totalmente desinteressante e mal planejada.

O bracelete começa a manifestar um poder de trazer uma espécie de luz materializada, algo parecido com o que o Lanterna Verde faz com seu anel. Aos poucos, Kamala vai aprendendo a usar esse poder e no começo é divertido, pois ela não tem controle ainda sobre ele. Com a ajuda do amigo Bruno, que tem um quê de gênio, ela começa a treinar e depois descobre coisas sobre sua família e sobre suas possíveis origens.

Falando em família, achei muito interessante a série ter trazido um pouco dessa cultura paquistanesa, que é bastante invisibilizada. Há uma série de filmes e produções para a televisão que fazem sucesso apenas entre quem é originário do país - ou talvez em certos festivais. Assim, a cena do casamento do irmão, por exemplo, tão colorida e cheia de alegria, é mostrada com muito respeito àquela cultura. Há também um interesse em trazer um pouco da história do Paquistão e a questão do surgimento do país a partir de um marco chamado partição, que separou o território que antes era um único país chamado Índia, na época ainda sob o controle dos ingleses.

Enfim, não sei se vale a pena contar sobre as cenas de ação mal dirigidas, ou sobre o roteiro desinteressante – cheguei a ver um comentário numa rede social que dizia que o roteirista deveria ser preso. No fim das contas, a série serve apenas como apresentação de uma personagem que será uma das protagonistas de THE MARVELS, um dos filmes importantes da Marvel para o próximo ano.

É também mais uma produção da produtora que valoriza as minorias e contribui para o sentimento de respeito ao diferente – assim como aconteceu com SHANG-CHI E A LENDA DOS DEZ ANÉIS e ETERNOS. O ruim de a série ter caído tanto é que as boas lembranças acabam ficando esquecidas. Uma pena. Mas a cena pós-créditos ajuda um bocado a trazer de volta o entusiasmo para o filme que virá, que trará novamente Kamala, uma personagem muito bem-vinda.

+ DOIS FILMES

O CALOURO (Shithouse)

Tive alguns sentimentos conflitantes em relação ao protagonista de O CALOURO (2020), vivido pelo próprio Cooper Raiff, que assina direção e roteiro. Ele faz o papel de um sujeito muito carente de amigos e ainda muito apegado à mãe e à irmã. O fato de se sentir sozinho na faculdade e longe de casa faz com que ele fique em um estado constante de vulnerabilidade. E há momentos em que o personagem está tão vulnerável que parece ridículo. Por outro lado, é possível simpatizar e também se identificar com o personagem, especialmente se em algum momento de sua vida você se sentiu também assim. Além do mais, não o culpo por ter ficado apaixonado pela jovem vivida por Dylan Gelula (a atriz é encantadora). Até porque há toda uma situação de viverem uma noite juntos, conversando. Em certo ponto, até lembra um pouco os filmes de Richard Linklater. Ainda que mais despido de filosofia, Raiff tem o dom de nos deixar o tempo inteiro interessados na conversa, na química que se estabelece entre os dois, e no quanto o casal passa a se conhecer numa única noite. O epílogo traz uma espécie de conforto para o espectador para um filme que parecia se encaminhar para um estado de solidão e de choque de realidade. Felizmente a opção pelo calor no coração diminui um pouco o tom agridoce. Que bom que o filme seguinte de Raiff já está disponível para apreciação.

O PRÓXIMO PASSO (En Corps)

O novo filme de Cédric Klapisch talvez seja o seu melhor trabalho. Digo "talvez" porque não cheguei a ver nem um terço do que ele dirigiu, mas é uma obra muito fácil de ser gostada, é um filme pequeno sobre a busca de um novo rumo para uma bailarina que sofre um acidente durante uma apresentação de balé. O PRÓXIMO PASSO (2022) tem uma ótima condução narrativa e o tempo em que as coisas acontecem parece sempre ser o tempo ideal. É no espaço que funciona como uma espécie de ambiente para recuperação física e espiritual que a moça (Marion Barbeau) entra em contato com um grupo de dança contemporânea, que tem um estilo muito diferente da dança clássica, mais livre e também mais calcado no chão e no peso. Achei tão interessante essa dança que acho que se visse esse filme nos meus 15-16 anos eu ficaria tentado a integrar um desses grupos. O filme é sutil e abre um pouco de espaço para o humor dentro da situação de tristeza da personagem. Há também um capricho visual nas cores e no som que chama a atenção.

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