segunda-feira, julho 11, 2022

THOR – AMOR E TROVÃO (Thor – Love and Thunder)



O cinema é uma caixinha de surpresas. Melhor dizendo: a nossa relação com os filmes é uma caixinha de surpresas. Depois de ter achado um saco os três primeiros filmes do Thor – sendo que os dois primeiros ainda têm o “mérito” de serem bem esquecíveis –, eis que me pego curtindo cada momento de THOR – AMOR E TROVÃO (2022), a segunda incursão de Taika Waititi na Marvel, mais uma vez brincando com a solução cômica encontrada para fazer com que o Deus do Trovão dê certo em sua versão cinematográfica. E sabemos que muito disso se dá graças ao ótimo timing cômico de Chris Hemsworth – basta lembrar também de seu papel engraçadíssimo no subestimado CAÇA-FANTASMAS, de Paul Feig. Aliás, de uma coisa a gente não pode reclamar dos estúdios Marvel: de sua capacidade certeira de conseguir encontrar atores perfeitos para os personagens.

O fato de eu ter gostado do filme pode ter sido culpa das baixas expectativas vindas tanto dos filmes anteriores do Thor, quanto das mais recentes produções do UCM. Ou pode ser culpa dos bodes. :) Aqueles bodes trouxeram a minha primeira gargalhada, embora desde o início eu tenha valorizado a figura trágica de Gorr, o Carniceiro dos Deuses (Christian Bale), um dos vilões mais interessantes das histórias recentes da Marvel, surgido mais ou menos na mesma época da Poderosa Thor Jane Foster (Natalie Portman), nos runs mais bem-sucedidos de Jason Aaron na Casa das Ideias.

Como o filme tinha pouco tempo para desenvolver a personagem de Foster, ela fica um pouco prejudicada, mas não a ponto de se tornar descartável. Ao contrário: Jane Foster é a personagem que traz o amor de volta, e traz o amor em uma embalagem deliciosamente cafona, como as produções B de fantasia dos anos 1980. Nesse sentido, até mesmo as fontes usadas nos créditos combinam, assim como o sentimento usado como arma final contra o mal. E combinam com o hard rock oitentista também.

O senso de humor aqui está mais afiado que em THOR - RAGNAROK (2017) e com a vantagem de personagens cativantes aparecerem mais azeitados, como o Rei Valquíria (Tessa Thompson, apaixonante) e o gigante de pedra Korg (interpretado pelo próprio diretor). Sem falar na participação de Russell Crowe como Zeus, em uma chave totalmente zoada e sem a menor vergonha do ridículo. E falando em chave, gosto de como acontece uma mudança de tom lá perto do final, nas cenas em preto e branco. É, sem dúvida, um filme que tem os seus muitos problemas, mas não se levar a sério e encontrar o seu próprio rumo e ritmo faz dele merecedor de respeito.

No mais, espero que a turma do Guns N'Roses tenha curtido a infinidade de homenagens. Acho até que eles exageraram na dose de Guns na trilha (tem até um personagem que se chama Axl!), mas quando eu me peguei arrepiado com a cena que entra aquele solo do Slash em “November Rain” eu percebi que tinha mesmo era que me entregar ao filme.

É uma grande bobagem? Sim, com certeza. Mas, uma vez que você relaxa e se deixa levar por essa grande bobagem, as quase duas horas de duração vão passar voando. Assim como você também vai relevar os problemas de montagem ou algumas cenas mais atabalhoadas – a primeira aparição de Jane Foster empunhando o Mjolnir, por exemplo, parece saída de uma série de cenas que foram deixadas na mesa de edição.

Outra coisa que eu acho válido para se curtir o filme é não se sentir obrigado a rir das piadas. Esse tipo de sentimento com relação ao filme pode estragar a apreciação, e é mais ou menos a relação que eu tenho com os dois filmes dos Guardiões da Galáxia. Além do mais, gosto muito de como o filme lida com a comédia e consegue fazer transições muito boas para o drama e até a tragédia. É só lembrar que o filme começa nos apresentando à trágica história de um homem que resolve abdicar da fé e assassinar todos os deuses que encontrar pelo caminho. É fácil compreender esse tipo de sentimento quando se convive com perdas.

E em paralelo, THOR – AMOR E TROVÃO é também a história de um deus que perdeu muitos entes queridos ao longo de poucos anos. Um deus que é apresentado de maneira abobalhada, mas que em nenhum momento deixa de ser um herói. E aprendemos que um herói vale mais do que muitos deuses – que o diga Zeus.

+ DOIS FILMES

LIGHTYEAR

A Disney andou botando as produções da Pixar de escanteio dos lançamentos exclusivos nos cinemas. Foi assim com SOUL (2020), LUCA (2021) e RED – CRESCER É UMA FERA (2022). Teve que vir um spin-off de TOY STORY (1995-2019) para que a companhia do Mickey resolvesse lançar uma produção deles nos cinemas. E eu diria que LIGHTYEAR (2022), de Angus MacLane, é um belo filme. Funciona tanto como uma aventura de ficção científica como uma diversão para crianças - dependendo da idade. É o INTERESTELAR da Pixar, no sentido que há a questão da busca de uma salvação e os resultados que se veem são tão difíceis quanto frustrantes, além de trazerem a questão da disparidade temporal entre quem fica e quem viaja. O filme explora bem a solidão do protagonista e a relação de afeto dele com o gatinho-robô e um grupo de novos recrutas dispostos a ajudá-lo. Há uma cena que lembra a relação entre Luke Skywalker e Darth Vader e não sei se houve uma intenção da parte dos roteiristas para que assim parecesse. Esse enfrentamento simbolizaria uma luta interior de Buzz, e isso o eleva a um herói mais complexo do que se poderia imaginar.

TUDO EM TODO LUGAR AO MESMO TEMPO (Everything Everywhere All at Once)

MATRIX encontra DOUTOR ESTRANHO NO MULTIVERSO DA LOUCURA para o público descolado contemporâneo. Talvez a principal diferença de TUDO EM TODO LUGAR AO MESMO TEMPO (2022), de Dan Kwan e Daniel Scheinert, seja a vontade de não ser tão sério, de brincar com as possibilidades sem querer fazer tanto sentido. Ao mesmo tempo, acho que isso é um dos pontos fracos do filme. Além do mais, pelo menos pra mim, o humor não funciona, embora eu ache a cena dos dildos muito interessante como forma de trazer uma novidade, algo semelhante ao que talvez possa ser visto em mangás ou na cultura pop oriental como um todo. O misto de vidas da protagonista vivida por Michelle Yeoh até faz referência a Wong Kar-Wai, mas de maneira muito discreta, e justamente quando tenta trazer uma espécie de moral da história, essa moral, ou essa mensagem, acaba sendo incoerente com o próprio espírito do filme, mais frenético e muito pouco interessado na monotonia do cotidiano. Ou não?

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