sexta-feira, novembro 20, 2015

NINGUÉM AMA NINGUÉM... POR MAIS DE DOIS ANOS


Nelson Rodrigues é um dramaturgo e contista tão interessante que adaptá-lo para as telas (ou para os palcos) é quase sinônimo de sucesso certo. Então, por que diminuíram a quantidade de obras dele adaptadas para o cinema? A última havia sido a segunda versão de BONITINHA, MAS ORDINÁRIA, de Moacyr Góes, que contém uma sucessão de equívocos que só mesmo um diretor como o Góes era capaz de perpetrar. Pelo menos trouxe à luz a beleza de Letícia Colin, ainda que bem verde. Além de Leandra Leal, claro. Mas é um trabalho que passa longe da antológica versão de Braz Chediak (1981).

NINGUÉM AMA NINGUÉM... POR MAIS DE DOIS ANOS (2015), de Clovis Mello, já é cheio de acertos, embora esteja longe de ser perfeito. A começar pelos belos e provocadores cartazes, que emulam o estilo dos desenhos da virada das décadas de 1950 e 60, que é justamente o tempo em que se passam as histórias presentes no longa.

Como se trata de uma adaptação de várias pequenas histórias numa tentativa de amarrá-las numa única narrativa, difícil não lembrar de A VIDA COMO ELA É..., a série de pequenos e deliciosos episódios produzidos por Daniel Filho e exibidos no Fantástico. Perceber que aqueles episódios são ainda muito mais ousados e picantes que o novo filme não deixa de ser um pouco desanimador, mas pelo menos é recompensador ir ao cinema para rir novamente desse universo rodrigueano, de mulheres safadas (no bom sentido) ou mandonas e de homens cornos ou cafajestes.

Nesse universo atrevido, algumas histórias se destacam e ficam mais vivas na memória, enquanto outras se resolvem de maneira tão rápida que caberiam num curta de dez minutos, como o caso da mulher que tem o desejo de transar com o melhor amigo do marido. Aliás, há duas situações desse tipo. Só que uma termina em tragédia, enquanto a outra é levada para o território do humor. Trata-se da história interpretada por Gabriela Duarte, que aparece aqui bem ousada e cheia de sex appeal.

Mas a melhor história é mesmo a estrelada por Marcelo Faria, que interpreta um sujeito pobre que casa com uma garota rica, mas que com o tempo passa a mandar demais na vida dele. Há dois momentos em especial que provocam boas gargalhadas, justamente os momentos em que o personagem chuta o balde. No meio disso tudo, há um caso com a bela empregada doméstica. Aliás, o filme tem uma generosidade em relação à sensualidade feminina e à beleza anatômica de seus corpos que é de deixar a gente feliz. Afinal, o cinema brasileiro anda muito bem comportado quando não faz muito tempo era o cinema mais sensual do mundo.

O que houve de lá pra cá? Perdemos a ginga? Ficamos mais hipócritas? Copiamos demais o modelo americano? Ou o sexo passou a ser aquele defeito que muitos diziam do nosso cinema? De todo modo, sopros de sensualidade e sem-vergonhice como esses, ainda que tímidos em comparação com os de nosso passado glorioso, são bem-vindos.

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