sábado, dezembro 27, 2008
FATALIDADE (A Double Life)
Nos finais de ano, a gente tem vontade de encerrar algumas coisas, "passar a régua". E aqui no blog eu costumo fazer as tradicionais peregrinações pela obra de cineastas. Infelizmente não deu para encerrar ainda a da obra de Mojica – restam dois filmes – e de Truffaut – resta um filme -, mas já consegui fechar a segunda peregrinação pela obra de Hawks. E se o ano de 2007 foi marcado pelos filmes de John Ford, a maior parte de 2008 foi marcada pela presença constante no blog da obra de George Cukor, que eu iniciei há aproximadamente um ano, mais exatamente na véspera de Natal de 2007, com ROMEU E JULIETA (1936), e pude encerrar no mês de agosto, com o seu filme-testamento, o belo RICAS E FAMOSAS (1981). Foi muito bom poder acompanhar a filmografia de Cukor. Ainda que não tenha gostado de todos os filmes vistos, gostei da grande maioria e fui respeitando cada vez mais a obra do homem.
Nesse intervalo de tempo, FATALIDADE (1947) ainda não havia sido lançado em DVD e nem eu havia conseguido o filme via divx. Pelo menos, não com as necessárias legendas. O DVD da Lume Filmes – que pode ser vista como a distribuidora-revelação do ano – é uma edição simples, mas traz o principal, que é o filme em cópia restaurada. Então, enquanto não são lançados outros filmes importantes mas ainda não vistos de Cukor, complemento a peregrinação com FATALIDADE, um dos filmes que o cineasta fez na década de 40, influenciado pela estética noir, quando Cukor pôde mostrar que era hábil também em filmes de suspense, como já havia comprovado em À MEIA-LUZ (1944).
Em FATALIDADE, Cukor, apesar de estar em território relativamente novo, o suspense, sente-se em casa ao trabalhar com o teatro, bastante presente em sua obra. Na trama, Ronald Colman é um ator de sucesso que tem um problema grave: ele absorve a personalidade dos personagens que interpreta. Por isso, ele costuma levar uma vida tranqüila quando faz comédias, mas quando trabalha em tragédias ou em papéis mais densos, sua vida particular sofre com isso. O seu casamento com sua parceira de palco (Signe Hasson) já foi prejudicado por causa dessa sua loucura. Agora, o ator é chamado para personificar ninguém menos que Othelo, o mouro trágico e ciumento da obra de Shakespeare. Assim, aos poucos, ele passa a absorver o ciúme, a obsessão, a paixão e a loucura do personagem, levando o ator a cometer atos que ele jamais imaginou que cometeria.
Cukor é tão bom que ele mesmo deveria ter dirigido uma versão de Othelo para o cinema, já que as cenas em que vemos a performance de palco da peça são de arrepiar. Em especial o momento em que Othelo tira a vida de Desdêmona. Sei que sou um pouco suspeito pra dizer isso, já que essa é uma das peças de Shakespeare que eu mais gosto, muito por causa do excepcional filme de Orson Welles, mas Cukor sabe tornar essas cenas no teatro especiais, fazendo com que eu me sentisse na platéia, comovido e em silêncio diante de obra tão magnífica.
FATALIDADE foi indicado a quatro Oscar: ator, direção, roteiro original e trilha sonora, tendo ganhado dois: ator, para Ronald Colman, e trilha sonora, para Miklós Rózsa. O filme também conta com a presença de Shelley Winters em seu primeiro papel importante nas telas.
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