sábado, maio 06, 2023

GUARDIÕES DA GALÁXIA VOL. 3 (Guardians of the Galaxy Vol. 3)



Acho que os executivos da Marvel devem estar num misto de alegria e tristeza com o lançamento de GUARDIÕES DA GALÁXIA VOL. 3 (2023). Alegria por estarem lançando finalmente um material de ótima qualidade, com um trabalho de direção, roteiro e efeitos visuais de dar gosto em meio a tantos filmes do estúdio que decepcionaram ou causaram tanto revolta quanto desânimo entre os fãs, o que pode significar diminuição no número de futuros espectadores; tristeza, por estarem perdendo James Gunn para a concorrente, que agora se dedicará à criação do universo compartilhado da DC Comics, a partir do próximo ano.

Quanto a mim, o terceiro filme dos heróis menos improváveis do universo Marvel no cinema me pegou como os outros dois não havia conseguido. Na verdade, tenho até pouca lembrança dos outros e vou ter mais tarde que refrescar um pouco a memória nos registros aqui do blog sobre eles. Mas, afinal, o que este terceiro filme tem que os outros não têm? Tem uma perfeita união de drama e comédia e tem uma capacidade de nos deixar interessados e temerosos pelos destinos finais de seus personagens. 

E isso começa de maneira muito bonita e triste com as primeiras imagens, de Rocket Raccon (voz de Bradley Cooper), com olhos marejados, escutando “Creep”, do Radiohead, em versão acústica, no ipod de Peter Quill (Chris Pratt), que por sua vez chora e bebe feito um gambá pela falta de sua amada Gamora (Zoe Saldana). Mas não tiremos o foco de Rocket. Este terceiro filme é o que mais nos leva às profundezas das memórias dolorosas do pequeno e peludo herói. Nascido um guaxinim, ele foi transformado numa criatura antropomórfica pelo Alto Evolucionário (Chukwudi Iwuji) – desde já um dos melhores e mais complexos vilões já apresentados no MCU. E ver esses flashbacks de Rocket é bastante doloroso para o espectador, já que lida com maldade humana versus construção de vínculos de amizade em meio à tortura e à privação de liberdade.

Aliás, é muito curioso como, dentro de filmes que são lembrados pelo humor, temos personagens com traumas pesados. E só agora isso vem à tona com força, já que este terceiro filme tem a intenção de ser uma clara despedida. E é justamente por sabermos disso que cresce uma apreensão pelo destino de seus personagens. Inicialmente de Rocket, que é seriamente alvejado por Adam Warlock (Will Poulter), personagem muito importante para mim na infância, quando tive contato com suas histórias escritas por Jim Starlin, lançadas pela Editora Abril em formatinho no mix Heróis da TV – sim, falar da Marvel é encher o texto de hipertextos e perder o foco do que se estava falando antes.

Enfim, podemos voltar ao começo do filme, com Rocket ouvindo “Creep” (canção poderosíssima e tristíssima) e para os instantes em que somos apresentados àquele espaço que parece ser a atual casa dos Guardiões da Galáxia, onde vivem outros seres apresentados em filmes anteriores. Também somos lembrados nesses instantes iniciais no quanto todos ali se amam e se cuidam. Há dois heróis na equipe que representam com muita força esses papéis materno e paterno, geralmente não associados a uma inteligência mais racional, mas a um tipo de poder amoroso incrível. São eles Drax, o Destruidor (Dave Bautista) e Mantis (Pom Klementieff). À medida que o filme vai se desenvolvendo, esse sentimento de amor entre eles vai contaminando a audiência. Vejo isso como um acerto e tanto de Gunn, um cara que sabe unir humor, violência, ação e drama em doses certas.

GUARDIÕES DA GALÁXIA VOL. 3 pode até não ser um filme perfeito. A gente sente que houve um problema na montagem para o filme não passar de duas horas e meia. Senti isso especialmente na cena do reaparecimento de Gamora. Ela se junta à equipe de maneira muito brusca e claramente tesouraram cenas. Ainda assim, os pontos positivos do filme se sobrepõem aos problemas. Como não ficar encantado com a cena em que o grupo veste trajes espaciais para chegar até uma nave inimiga? A cena é de encher os olhos e nem o escuro das lentes dos óculos 3D conseguiu tirar o brilho dela (e do filme, no geral, eu diria – está longe, por exemplo, do breu que foi a experiência de ver PANTERA NEGRA – WAKANDA PARA SEMPRE). Percebe-se um interesse em Gunn em fazer uma obra o mais próximo da perfeição no que se refere a grandes aventuras espaciais.

No mais, há o bom uso das canções pop, das mixtapes, um conceito já abraçado desde o primeiro filme e que tanto serve para incluir canções ótimas em cenas e criar um vínculo emocional maior com o espectador, quanto nos lembrar do presente que é a música do planeta Terra, trazida por Peter Quill, para aqueles heróis. Fiquei feliz, por exemplo, ao ouvir “We care a lot”, do Faith No More, com aquele baixozão poderoso. E há um monte de canções pouco óbvias que podem servir como apresentação para muitos. Canções de Alice Cooper, Bruce Springsteen, The The, Heart, Rainbow, Earth, Wind & Fire, The Flaming Lips, Florence + the Machine etc.

Então, o que temos em GUARDIÕES DA GALÁXIA VOL. 3 é uma bem-sucedida junção de drama e comédia, momentos bastante sombrios com outros cheios de luz, o amor vencendo o mal, mas não sem deixar aquele gosto ligeiramente amargo no final, como se a dança dos personagens funcionasse mais como uma luta contra a depressão do que uma celebração de fato. Essa complexidade de sentimentos traz, a meu ver, mais pontos a favor para o filme, que até ajuda um pouco a compensar a sua conclusão com excesso de fofura, como que herdeira de O RETORNO DE JEDI. Finalmente temos o melhor filme da Marvel desde VINGADORES – ULTIMATO

+ TRÊS FILMES

TILL - A BUSCA POR JUSTIÇA (Till)

Há filmes que são necessários por sua temática. E é o caso de TILL - A BUSCA POR JUSTIÇA (2022), de Chinonye Chukwu, que conta a história de uma mãe procurando, em 1955, lutar para condenar os assassinos de seu filho adolescente, linchado no Mississipi. A história dos Estados Unidos é cheia dessas manchas e infelizmente isso não se tornou coisa do passado, já que há um monte de neonazistas em atividade na chamada "terra da liberdade". Um dos pontos fortes deste filme é a força da interpretação de Danielle Deadwyler, atriz que até então desconhecia, mas que me deixou muito impressionado. Há uma cena que considero o ponto alto do filme, quando se vê um super-close dos olhos dela, seguido da imagem do trem que traz o caixão de seu filho, e o choro de dor, logo em seguida. Grande momento, que deve mesmo ser assim, derramado de lágrimas e de dor. E há outros muito bons, inclusive na parte dedicada ao tribunal, que foge do padrão justamente por se passar num estado altamente racista e antes das lutas por direitos civis da década seguinte. Mamie Till foi uma das precursoras dessa luta e por isso sua história merece ser conhecida. Nada como o cinema para popularizar as histórias.

NADA DE NOVO NO FRONT (Im Westen Nichts Neues)

Impressionante filme antibélico este NADA DE NOVO NO FRONT (2022). Um dos mais bonitos e bem cuidados dos últimos anos. Há um cuidado com as imagens, com a beleza da paisagem que contrasta com o horror da guerra, mostrada com toda a crueldade; há um cuidado com a trilha sonora, que antecipa as desgraças que os jovens recrutas verão logo que chegarem às trincheiras. Há um cuidado com os atores, em especial o estreante Felix Kammerer, que faz o soldado Paul. É através dele que somos levados à guerra, no que há de pior, principalmente, mas também aos momentos de breve trégua e alegria, como quando roubam um ganso e fazem uma bela e deliciosa refeição entre si. O diretor Edward Berger não nos poupa das cenas gráficas, das lutas corpo a corpo, das mortes às vezes duras de serem finalizadas, da crueldade dos generais. E há o momento em que ficamos aguardando o armistício, que é muito cruel. Milhares de jovens morrem enquanto os alemães decidem a rendição. Uma das grandes produções de 2022, sem dúvida.

PACIFICTION

Nem todo cineasta é capaz de dilatar o tempo. Albert Serra consegue com PACIFICTION (2022). O problema é que a experiência de ver um filme dele, em geral, é dolorosa, e seus personagens são incrivelmente chatos. A começar pelo protagonista, vivido por Benoît Magimel (ENQUANTO VIVO), um homem que representa o estado, ou seja, a França, naquelas paradisíacas ilhas da Polinésia francesa. Albert Serra parece querer fazer seu público passar por algum tipo de prova, de ter que aguentar mais de uma hora até entregar o que parece ser uma espécie de anti-thriller, anti-filme de gênero. Acho que o que eu mais gosto são as cenas noturnas, especialmente no mar, próximo do final, ou na praia, quando se instala uma espécie de tensão, embora seja uma tensão ligeiramente afastada do suspense. Até mesmo quando o filme traz momentos de deslumbramento visual o faz com um ar de apatia ou enfado. Mesmo com as tensões seríssimas apresentadas, o personagem de Magimel parece estar sob efeito de sedativo. Incomodou-me também a fotografia digital que me fez lembrar de MIAMI VICE, de Michael Mann, embora sem a mesma textura e optando por encobrir os personagens e as paisagens com uma baixa luminosidade, o que passa a impressão de que é problema da cópia ou da projeção. E isso é tão desagradável quanto irritante. Pode ser questão de se acostumar com a proposta visual e narrativa, para então passar a apreciá-lo. Mas não deu pra mim.

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