quarta-feira, novembro 12, 2014

BOYHOOD – DA INFÂNCIA À JUVENTUDE (Boyhood)























Richard Linklater acabou se tornando um diretor famoso pelo interesse no fluxo do tempo em seus filmes. BOYHOOD – DA INFÂNCIA À JUVENTUDE (2014) seria uma espécie de versão mais arriscada do que ele havia feito nos filmes de Jesse e Celine, ANTES DO AMANHECER (1995), ANTES DO PÔR-DO-SOL (2004) e ANTES DA MEIA-NOITE (2013). Se a (por enquanto) trilogia foi sendo montada de maneira acidental, o mesmo não se pode dizer de sua nova empreitada.

Que nem é tão nova assim, era apenas secreta: Linklater começou a filmar em 2002 e terminou em 2013, acompanhando a vida de um garoto dos 6 aos 18 anos chamado Mason (Ellar Coltrane). A título de curiosidade, o cineasta russo Nikita Mikhalkov já havia feito algo parecido, entrevistando anualmente sua própria filha, em formato documentário, em ANNA DOS 6 AOS 18 – filme que não vi ainda, mas me bateu uma vontade enorme de ver o quanto antes.

Conhecendo Linklater e seu interesse por temas políticos e filosóficos, já era de se esperar que haveria no filme momentos de reflexão, seja a partir de questionamentos existenciais dos próprios personagens, seja através de belos momentos de uma vida normal, ainda que cheia de percalços, principalmente por causa das várias mudanças de residência proveniente de problemas financeiros ou dos casamentos fracassados da mãe, vivida por Patricia Arquette.

Ethan Hawke é o pai ausente, mas esforçado, que tenta de tudo para fazer a alegria dos filhos nas vezes em que aparece para visitá-los (Lorelei Linklater, filha do diretor, participa como irmã de Mason). Hawke faz um pai cheio de carisma e bom humor, que muito lembra seu personagem Jesse, especialmente o do terceiro filme, já às voltas com a paternidade e com a difícil relação com a esposa. Seu personagem é responsável por muito da brilho do filme. Há tantos pais ruins no cinema americano (muitas vezes pela formação familiar dos diretores) que chega a ser até um alívio ver um pai como o interpretado por Hawke.

Seu personagem representa também um lado mais democrata de um estado americano dominado por pessoas que compram armas como se comprassem roupa, o Texas. Bem o tipo apresentado por Michael Moore em TIROS EM COLUMBINE. Há, inclusive, um aniversário de Mason, em que ele é presenteado com um rifle pelo avô. Essa cultura das armas é vista com um leve tom de crítica social. Apesar disso, o fato de a trama nunca sair do Texas também pode ser visto como uma espécie de homenagem ou visão carinhosa para com seu terra natal, mostrando, inclusive, algumas de suas belezas naturais nas cenas de passeio.

De tanto destacar a figura do pai e outros aspectos secundários de BOYHOOD, dá até para pensar que os personagens adultos são mais interessantes e importantes que o jovem protagonista, o que se constituiria numa falha do projeto de Linklater. É uma maneira de ver as coisas, mas também podemos ver o quanto é vazio e até mesmo triste a fase da adolescência. Até pelo fato de o protagonista ser um tipo mais introspectivo desde a infância.

A primeira cena, aliás, já foca no rosto ainda angelical do garoto, deitado na grama e olhando o céu azul, como se já tivesse discernimento suficiente para pensar sobre a vida. O ator que faz o garoto conta em entrevista que nem lembra dessas primeiras cenas. Então, não deixa de ser mesmo curioso tentar imaginar o que se passa na cabeça de uma criança de seis anos, ainda que todos já tenhamos passado por essa fase.

A opção do filme por momentos que valorizam mais os fatos normais da vida do protagonista em vez de situações extraordinárias é quebrada em alguns momentos bem interessantes, como os fatos envolvendo o padrasto alcoólatra e a ida do garoto para a universidade.

No mais, são quase sempre situações corriqueiras que ganham um brilho especial por mostrarem momentos de encanto (ou de desencanto), algumas vezes contextualizadas por algum hit radiofônico do momento (bonito o começo, ao som de "Yellow", do Coldplay). Mas apesar de a maior parte da trilha sonora prestigiar a música produzida no período, por causa da influência dos pais e pessoas mais velhas, Beatles, Bob Dylan e Pink Floyd também são mencionados, cantados ou tocados.

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