quinta-feira, setembro 08, 2011

OS MESTRES LOUCOS (Les Maîtres Fous)



Jean Rouch é mais conhecido pelo documentário experimental EU, UM NEGRO (1958), que já estava na minha "lista de filmes a ver o quanto antes" desde que li o ótimo texto de João Moreira Salles, presente no livrinho "Ilha Deserta – Filmes". Mas foi numa aula do curso de mestrado, quando o professor se referiu a este OS MESTRES LOUCOS (1955), que eu fiquei com uma curiosidade (mórbida) de conferir esta obra dotada de imagens fortes e impressionantes.

Trata-se de um documentário de cerca de meia hora de duração que mostra o ritual dos haouka, na Costa do Ouro africana. O filme inicialmente apresenta os "personagens" que farão parte desse ritual. Todos eles têm os seus humildes trabalhos na "vida real". E a vida real não é muito generosa com esse povo, que na época da realização do filme era colônia dos ingleses. Há um catador de garrafas, um estivador, um guarda, um pedreiro etc. Como que para mostrar a sua força ou talvez zombar ou mesmo assimilar como um antropófago os costumes do colonizador, eles participam de um ritual grotesco. Pelo menos, aos olhos de quem não está acostumado a ver tal coisa.

No tal ritual, os homens são possuídos por entidades que passam a representar membros da elite política dos ingleses colonizadores. As cenas de possessão são impressionantes, pois todos eles tremem e falam com uma baba branca e espessa escorrendo pela boca. Ao fundo, a voz de Jean Rouch descreve o processo, de maneira até rápida demais para apreendermos toda aquela estranha realidade. O ápice do ritual acontece com a matança de um cachorro. Confesso que quando os vi trazendo o inocente animal para o sacrifício, eu fiquei com o coração na mão. A ideia é mostrar a força e a coragem, ao matar e comer um animal que normalmente não se mata e nem se come. Após a matança, é feita uma mesa redonda para saber se eles comerão o animal vivo ou cozido. O mais forte do grupo é o que tem direito à cabeça do cachorro.

No dia seguinte, todos estão de volta aos seus trabalhos, um deles, que estava com problema de impotência sexual e foi considerado impuro para participar do ritual, ficou curado, segundo a narração de Rouch, que provavelmente entrou em contato direto com o grupo. Apesar de o filme ter me causado náuseas, o ineditismo das imagens e a sua força fizeram com que eu ficasse ainda mais interessado no trabalho sem igual do cineasta e etnógrafo Jean Rouch. A Costa do Ouro se renomeou Gana, após sua independência, em 1957.

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