domingo, fevereiro 10, 2008

AS MULHERES (The Women)



E continua minha peregrinação pelo cinema de George Cukor. Dessa vez, consegui por vias alternativas - já que não encontrei na locadora daqui - uma cópia de AS MULHERES (1939), um dos filmes mais importantes do diretor. Afinal, se Cukor é conhecido como o grande diretor de mulheres, um filme estrelado apenas por mulheres tinha que ser dirigido por ele mesmo. Segundo o IMDB, são 130 papéis femininos no filme inteiro. Até os animais mostrados no filme (cães e cavalos, por exemplo) são fêmeas. Nem mesmo vozes masculinas são ouvidas. Quando as personagens falam com seus maridos ou namorados pelo telefone, só ouvimos suas falas e expressões, seja de tristeza ou de alegria. O filme já começa com uma interessante apresentação das personagens principais, que são mostradas em comparação com bichos. Norma Shearer, a protagonista, é apresentada como um cervo, Joan Crawford, como uma onça, Rosalind Russell, como um gato, Mary Boland, como um macaquinho, Paulette Goddard, como uma raposa, Joan Fontaine, como uma ovelha. São comparações que tem tudo a ver com o papel que cada atriz recebeu no filme.

No início, AS MULHERES me incomodou. Afinal, o filme mostra o lado mais superficial do "sexo frágil", começando com um travelling de um grande salão de beleza freqüentado por dondocas da alta sociedade. E é a partir de uma fofoca de uma manicure que surge a principal trama do filme: o marido da personagem de Norma Shearer - que havia feito ROMEU E JULIETA (1936) - estaria tendo um caso com uma balconista de loja de perfumes - Joan Crawford, apresentada como a grande vilã do filme. Quando Norma descobre, sua mãe recomenda que ela releve, não brigue com o marido, que logo logo ele abandonaria a amante e voltaria para os braços da esposa fiel. Mas ela não se conforma, acreditando que as mulheres modernas daquela época não podiam mais admitir esse tipo de comportamento de seus maridos. E o divórcio acaba acontecendo. Mas até chegar ao divórcio, vemos as mulheres como verdadeiras bitches - não via algo parecido desde SHOWGIRLS, de Paul Verhoeven -, brigando por seus maridos e se mostrando fingidas em relação às amigas.

A partir da segunda metade, o filme vai deixando um pouco a comédia e ganha ares de melodrama, por isso fui gostando mais. Inclusive, Joan Fontaine tem uma cena particularmente emocionante no filme. No livro "Afinal, Quem Faz os Filmes", Cukor conta que sua performance na cena do telefonema, quando ela volta para o namorado, depois de ter anunciado que estava grávida, foi surpreendente para todos que estavam no set. E essa cena acabou por influenciar no fato de ela ter sido escolhida para estrelar, no ano seguinte, REBECCA, A MULHER INESQUECÍVEL, a estréia de Hitchcock em Hollywood.

AS MULHERES tem em seu elenco as principais estrelas da MGM. Faltou a Greta Garbo, mas vai ver Greta estava muito acima das demais para participar desse filme que tem um certo ar de vulgaridade que não combina com ela. Ainda assim, trata-se de um elenco notável. Outro grande destaque do filme é uma seqüência de cerca de dez minutos filmada em technicolor. É uma cena de um desfile de moda, onde as mais variadas cores aparecem como que para ilustrar a incrível eficiência daquele belo sistema de cores adotado na época. No mesmo ano, inclusive, Cukor iniciou a super-produção de David O. Selznick E O VENTO LEVOU (1939), mas não chegou a concluir o trabalho, tendo sido demitido. Mas foi ele quem preparou o terreno e o elenco para os vários diretores que passariam pelo filme. E antes de partir para outros filmes de Cukor, pretendo rever esse grande clássico e comentar por aqui. Só que vai levar mais um tempinho, já que também pretendo ver os principais documentários presentes nos extras da edição comemorativa.

Quanto ao filme em questão, AS MULHERES, podemos dizer que, do elenco principal, a atriz que teve uma carreira mais longeva foi mesmo Joan Crawford, que passou a receber quase sempre papéis de mulheres perversas, coisa que só se acentuou na época de sua "decadência", quando ela se tornou uma das grandes damas dos filmes de terror da década de 60. Quanto às outras, um ano depois, Rosalind Russell estrelaria JEJUM DE AMOR, do mestre Howard Hawks. Lembrando que em AS MULHERES, ela faz uma seqüência de briga com Paulette Goddard, com direito até a mordida de verdade na panturrilha. E Paulette ficou com as marcas dos dentes de Rosalind por alguns dias. Parece que havia muito conflito entre as atrizes e Cukor foi um gênio em ter conseguido domar, com sua delicadeza particular, todas aquelas estrelas que brigavam para brilhar mais que as outras. Lembrando que no ano seguinte, Paulette estaria em O GRANDE DITADOR, de Charles Chaplin. Quanto a Norma Shearer, ela se aposentou bem cedo, depois de ter feito apenas mais três filmes.

P.S.: Saiu uma nova edição da Revista Zingu! Que dessa vez conta com listas de melhores de 2007, tanto no cinema quanto em DVD. Eduardo Aguilar, no seu "Cantinho do Aguilar", também comenta os seus favoritos do ano que passou. E continua a matéria sobre as grandes musas do cinema produzido na Boca do Lixo. E falando em musa, Adilson Marcelino homenageia Zezé Macedo, que é mais lembrada hoje em dia pelo papel de Biscoito do programa do Chico Anísio.

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