terça-feira, outubro 31, 2006

A CRIANÇA (L'Enfant)



Há algo de bressoniano neste A CRIANÇA (2005), filme dos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne vencedor da Palma de Ouro em Cannes. Digo isso principalmente por causa daquele final, que deveria ser catártico - e talvez o seja para algumas pessoas - mas que não me comoveu de fato. O final do filme me lembrou bastante o final de PICKPOCKET, de Robert Bresson. Tanto pelo tipo de sentimento envolvido, quanto pela própria situação e modo de vida dos personagens. Bom, a comparação com Bresson pode ser encarada como um elogio, claro.

A CRIANÇA é o tipo de filme que cresce à medida que pensamos nele. O fato de os Dardenne terem nos dado mais espaço para respirar, tirando a câmera da nuca do protagonista - como acontece em O FILHO (2002) -, é um ponto a favor do filme, nos dando mais chance para nos distanciar do personagem e ter a opção de julgar ou não os seus atos. Ao menos, eu, inconscientemente, o fiz. Quando Bruno (Jérémie Renier) vende o próprio filho recém-nascido, confesso que fiquei indignado. Talvez pelo meu lado canceriano, que valoriza a maternidade acima de muitas coisas, tenha contribuído para isso. Por isso, achei totalmente justo o "castigo" que Sonia (Déborah François) lhe inflingiu. Mas ao mesmo tempo, o filme consegue ser até hitchcockiano no sentido em que torcemos pelo personagem em vários momentos, como quando ele quer reaver a criança ou quando ele foge depois de ter cometido um delito. Inclusive, não deixa de ser curioso como eu não julguei o personagem quando ele roubou, mas o fiz quando ele cometeu o "pecado mortal" de vender a criança. É hitchcockiano também o modo como a câmera, o ponto de vista, muda de Sonia para Bruno, que é um personagem muito mais rico e cheio de nuances que a jovem mãe. Quando a câmera persegue Sonia no começo do filme, é como se ela também estivesse à procura do rapaz. E quando o encontra, não larga mais.

Quanto ao prêmio em Cannes, não sei se a Palma de Ouro foi merecida. Já nem me lembro mais quais foram os outros filmes que concorrem no ano passado. A surpresa foi que essa foi a segunda vez que os Dardenne ganharam o festival, um fato inédito. A primeira foi com ROSETTA (1999), que dizem ser excelente. Quero ver. Estou na expectativa pra conferir também o vencedor de Cannes deste ano, THE WIND THAT SHAKES THE BARLEY, de Ken Loach, que está dividindo opiniões. Aliás, qual filme hoje em dia não divide opiniões?

Nenhum comentário: