segunda-feira, novembro 27, 2017

NÃO DEVORE MEU CORAÇÃO

O novo filme de Felipe Bragança parece ser cheio de boas intenções. Gosto de como ele divide por capítulos a sua narrativa, com letras grandes e de destaque e títulos chamativos. A trilha sonora meio anos 80, com uso de sintetizadores, também contribui para algo elegante e retrô (está na moda, não é?). Mas tudo isso parece algo que funcionaria melhor com uma melhor condução na direção. A carreira de Bragança como cineasta até agora não emplacou, pelo menos não dentro de um circuito mais amplo. Mas é compreensível que ele queira um tom diferente, e nisso está a sua principal qualidade.

Seu NÃO DEVORE MEU CORAÇÃO (2017) é uma obra irregular, que aproveita o talento e experiência de dramaturgia de Cauã Raymond, que manda muito bem nas cenas com a família (com o irmão menor e com a mãe), mas seu estilo de atuar acaba ficando um pouco contrastado com o trabalho menos naturalista de interpretação dos atores jovens e pouco experientes. O resultado é uma obra torta do ponto de vista da atuação, e que não chega a passar o sentimento que parece querer passar, seja o amor imenso do pequeno Joca (Eduardo Macedo) pela indiazinha paraguaia da fronteira (Adeli Gonzales), seja a relação de Fernando, o personagem de Cauã, com o ambiente hostil que o cerca.

Este ambiente hostil traz como cenário principal uma guerra entre gangues de motoqueiros: de um lado um grupo de brasileiros do Mato Grosso do Sul com pinta de fascistas; do outro, um grupo de paraguaios-guaranis que têm visto todos os dias corpos dos seus serem desovados no rio Apa, o rio que separa o estado brasileiro do país. Bragança parece querer dar à trama um ar de fábula, a exemplo do que havia feito com A ALEGRIA (2010), ainda mais estranho e menos palatável.

Essa história de amor e ódio tem os seus momentos. Há algo de ACOSSADO no momento em que o garotinho, inebriado pelo amor que sente pela jovem índia, conta algo sobre o irmão. Essa é uma das melhores cenas do filme. Mas é uma pena que ela pareça deslocada em uma obra que parece optar pelo distanciamento das emoções. Ou trazê-las através da estranheza, quem sabe.

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