Ver um filme de horror de gosto duvidoso (não necessariamente ruim) é uma arte que deve ser cultivada. O gênero é pródigo em trazer variedades de opiniões e intensas paixões. Lembro o quanto os hoje cultuados filmes de horror italianos eram tão mal recebidos: ou com pedradas ou com ignorância pela maior parte da crítica. Não era todo mundo que via um filme de Lucio Fulci, por exemplo, como uma obra-prima. Esse tipo de revisão veio acontecer com mais força na virada do milênio, principalmente, com o culto de vários especialistas do gênero e a cada vez maior aproximação da crítica.
Daí chegar em uma sala de cinema e ver um filme de terror russo dublado em inglês é algo quase inusitado. A dublagem em inglês, vale destacar, é tão vagabunda que percebemos as diferentes fontes de áudio em diálogos entre personagens pelos ruídos de fundo. Claro, queríamos que fosse diferente: por pior que possa ser A NOIVA (2017), terceiro longa-metragem de Svyatoslav Podgaevskiy, o filme poderia se beneficiar de seu áudio original em russo.
Entre seus acertos, só o ponto de partida já é carregado de uma morbidez perturbadora: o fato de certas famílias pintarem olhos nas pálpebras fechadas de seus mortos a fim de que, na fotografia, suas almas não os abandonem é de chamar a atenção. Não é o primeiro filme que fala de fotografias de mortos. Todos devem lembrar do ótimo OS OUTROS, de Alejandro Amenábar, que destacou esse costume que foi de fato celebrado no passado.
Mas A NOIVA é mais inventivo, ao colocar essa questão dos olhos pintados e da transferência dos espíritos para uma virgem. Assim, no prólogo do filme, que acontece no final do século XIX, há essa tentativa de transferência do espírito de uma noiva para uma outra jovem que é tomada à força de seu lar e enterrada viva, vestida de noiva. Essa história em si poderia ser melhor explorada e contada, como uma boa história gótica de horror. Em vez disso, o filme prefere dar um salto para o mundo contemporâneo.
Na trama principal, uma moça é convidada a finalmente conhecer a família de seu noivo, que até então evitara o contato com seus pais. O encontro com a família dele acontece em um vilarejo afastado e longe de tudo e logo percebemos que essa família guarda segredos bem peculiares, como um quarto onde mora uma pessoa que nunca sai de lá. Mas a coisa fica incômoda mesmo para a personagem quando o noivo desaparece e ela não sabe o seu paradeiro.
Um dos destaques positivos do filme é a forma como é explorada a casa, cheia de paredes falsas que supostamente seriam dutos de ventilação, mas que nos apresentam a um lugar maior e mais curioso. Outro momento que podemos listar como sendo bom é uma cena que ocorre à noite, quando a moça segue uma das familiares do noivo e acaba descobrindo o que não devia. O movimento de câmera e o sentimento de medo no ar poderiam muito bem caber em um filme de horror de melhor qualidade, até pela boa fotografia e direção de arte.
Infelizmente, o ritmo pouco animador e os sustos fáceis inspirados em clichês do horror ocidental, acabam por tornar A NOIVA em algo tão vulgar quanto algumas das piores produções recentes. O que o torna diferente é justamente esse quê exótico que faz com que seja possível, com um pouco de boa vontade, enumerar uma série de momentos em que um bom filme poderia muito bem estar ali presente, caído entre as tantas falhas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário