Tem sido interessante essa virada na carreira de ator de Ben Stiller da comédia para o drama (ou para a dramédia, ao menos). Ele tem feito, em geral, tipos inseguros que funcionam como uma evolução no que ele já fazia nas comédias. Pode-se dizer que esta nova fase começou em A VIDA SECRETA DE WALTER MITTY, dirigido pelo próprio Stiller, passou por ENQUANTOS SOMOS JOVENS, de Noah Baumbach, e chega agora com este novo O ESTADO DAS COISAS (2017), de Mike White, realizador que tem uma carreira mais extensa como roteirista e aqui se aventura em sua segunda experiência na direção.
É mais um filme em que Stiller interpreta alguém em crise de meia-idade. Na verdade, não há nada de errado com a vida de Brad Sloan (Stiller). Ele trabalha em uma empresa sem fins lucrativos, é casado com uma mulher encantadora (Jenna Fisher) e agora está ajudando o filho inteligente e educado (Austin Abrams) a entrar em um novo e excitante momento de sua vida: entrar na universidade. O problema de Brad é que ele tem a mania de ficar comparando suas realizações com as de seus colegas de escola, que se tornaram milionários e famosos.
O ESTADO DAS COISAS é um filme que deve ser visto sem muita expectativa, até por ser mesmo uma obra pequena e sutil em suas emoções. É também um filme bem engraçado, por mais que os pensamentos do protagonista sejam tão perturbadores para ele que cheguem a ser quase doentios. No entanto, é muito fácil encontrar espectadores que se identificarão de alguma forma com Brad Sloan.
Um dos destaques do filme – e que pode incomodar a alguns – é o uso intensivo do voice-over do protagonista, em um trabalho muito bom do fluxo de consciência, apresentando monólogos ora divertidos, ora amargos, sobre a vida. Um dos méritos do filme é saber ser honesto consigo mesmo, não deixando de explicitar as falhas de seu herói. Essas falhas estão ali à sua frente, como se houvesse um véu cobrindo seu olhar. Daí ele receber uma resposta tão boa da jovem garota universitária, que o considera um egocêntrico que não sabe a sorte que tem, ao ouvir suas lamúrias.
Entre os pensamentos de destaque do personagem, estão os momentos de sonho, ao visualizar, por exemplo, o filho sendo aceito na Universidade de Harvard em um momento de celebração em família; porém, o próprio personagem começa a ter pensamentos sombrios que o põem para baixo novamente, como a possibilidade de ele ter inveja do próprio filho, que poderá ser tão melhor do que ele jamais foi capaz de ser na vida.
As cenas de Brad desejando as jovens meninas também são hilárias, bem como o modo como ele imagina o amigo de escola que hoje vive aposentado e morando com duas garotas em uma praia havaiana. Curioso, aliás, como a praia sempre aparece como um lugar de sucesso na vida. Muito bom também o encontro com o agora famoso e arrogante apresentador de televisão vivido por Michael Sheen, um ator que funciona muito bem para fazer tipos assim, vide o recente DE VOLTA PARA CASA, com Reese Witherspoon.
Se há algum problema com o filme talvez seja a timidez com que o diretor utiliza as cenas dramáticas, talvez com medo de transformar o seu filme inteligente em um dramalhão, especialmente nos momentos de emoção intensa do personagem de Stiller. Ainda assim, do jeito que ficou, é um prazer do início ao fim poder ver uma obra como O ESTADO DAS COISAS.
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