segunda-feira, agosto 08, 2016

OS AMANTES CRUCIFICADOS (Chikamatsu Monogatari)



Tem sido muito gratificante entrar em contato, ainda que aos poucos, com a obra de Kenji Mizoguchi. O que eu percebo é que preciso estudar melhor o trabalho dele, para que também comece a perceber os aspectos formais que ainda não se tornaram tão evidentes para mim. Por enquanto, o que eu percebi foram mesmo os aspectos temáticos, e a preferência do cineasta por grandes tragédias humanas.

OS AMANTES CRUCIFICADOS (1954) não foge a essa regra. As circunstâncias em que se encontram os heróis da historia são bem trágicas. Novamente, são pessoas que lutam contra um sistema de convenções opressor. No caso, temos um senhorio que trata com mão de ferra seus empregados, que ganham uma ninharia, mas que acabam se sujeitando às suas regras, por falta de opções.

O sujeito, além de procurar trair a esposa, assediando a jovem namorada de um funcionário seu, Mohei (Kazuo Hasegawa), é extremamente hipócrita. Ao ver um casal de amantes crucificados que passa pela rua, prestes a serem executados em público por cometerem adultério, ele afirma que eles merecem, que esta é a lei para quem desobedece. As coisas se complicam para os personagens quando um irmão de sua esposa pede dinheiro emprestado e é Mohei quem vai tentar salvar a situação, ainda que através de meios ilícitos.

Ao confessar o que ia fazer, Mohei prejudica não apenas a si, mas faz sofrer tanto sua namorada oculta, quanto a própria esposa de seu senhor, que o quer bem, e fica revoltada com a atitude do marido em relação ao empregado. Ao fugirem os dois de casa, a mulher, Osan (Kyôko Kagawa), e Mohei, mexem não apenas com o clã do poderoso homem, mas também com seus próprios sentimentos adormecidos.

E é então que o filme ganha contornos bem românticos, ou ultrarromânticos. A cena de Mohei e Osan no barco é uma das mais belas dos filmes de Mizoguchi. Porém, diferente de um contido SENHORITA OYU (1951), que traz a tragédia para um território fechado e opressivo para os personagens, OS AMANTES CRUCIFICADOS opta pela catarse, pelo sentimento de quase bem-estar com o fato de deixar os sentimentos aflorarem com força. Mesmo que isso custe a sua vida. É quase uma visão cristã, em que é necessário perder a vida para ganhar a alma.

OS AMANTES CRUFICICADOS flagra Mizoguchi em pleno domínio de seu ofício, pouco tempo depois de ter lançado o que talvez seja sua obra-prima máxima, CONTOS DA LUA VAGA (1953). E poder ter o privilégio de acompanhar essa evolução, ainda que de maneira um pouco desordenada, é maravilhoso.

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