domingo, fevereiro 14, 2016
O QUARTO DE JACK (Room)
Último dos oito candidatos deste ano a melhor filme a entrar em cartaz no Brasil, O QUARTO DE JACK (2015), de Lenny Abrahamson, é desses que causam sentimentos de comoção em diversos momentos. É um filme pequeno que se agiganta com seu tema forte e pesado, com as interpretações inspiradas da bela e talentosa Brie Larson e do garotinho Jacob Tremblay, e com cenas que trazem um sentimento de impotência, claustrofobia e indignação. Ao mesmo tempo, exalta a beleza e a grandeza do mundo, esse mundo tão desconhecido dos olhos e da cabeça do pequeno Jack.
A princípio, especialmente se o espectador não se deixou levar pela tentação de ver o trailer ou ler qualquer crítica, há um sentimento de inquietação ao não sabermos ainda o motivo de a mãe vivida por Brie Larson e Jack viverem sozinhos e trancados em um quarto minúsculo sem saírem para lugar algum. Mas as respostas vêm em breve, assim como uma série de outros sentimentos perturbadores, causados pela raiva, urgência pela liberdade e sede de justiça.
Lenny Abrahamson poderia muito bem ter optado por uma janela de aspecto mais fechada, a fim de tornar aquele espaço pequeno ainda menor, mas ele opta pelo scope, dando àquele espaço uma relativa grandeza na cabeça de Jack, que nunca conheceu outro lugar em sua curta vida (cinco anos). Demora um pouco para ele aceitar, por exemplo, que aquilo que ele vê na televisão velha e com má sintonia não é mágica, mas pessoas de verdade que existem em um mundo de verdade, do outro lado daquelas paredes. Trata-se de uma clara alusão ao mito da caverna de Platão.
Uma vez que fica difícil escrever sobre o filme sem entregar alguns spoilers, já peço desculpas e recomendo ao leitor que o veja antes de ler ou ver qualquer coisa que possa estragar a experiência e as surpresas. Dito isso, O QUARTO DE JACK pode ser dividido claramente em dois momentos: antes e depois do quarto. Tanto para os personagens quanto para nós, espectadores.
Um dos méritos do filme, além de conseguir envolver e trazer também uma carga de suspense no momento da fuga do garotinho e da torcida para que o plano da mãe de conseguir liberdade dê certo e no meio disso trazer uma cena de tirar a respiração, de tão linda (o olhar de Jack pela primeira vez para o céu azul enquanto está na caminhonete do velho Nick), é que podemos acompanhar o que acontece com os personagens depois disso.
Não se trata, portanto, de um mero filme sobre sequestro, fuga e final feliz. As cicatrizes e os traumas daqueles anos todos confinados gerarão ainda muito interesse na segunda parte do filme, com a difícil readaptação à vida normal, tanto pelo garoto quanto por sua mãe, que enquanto está sozinha no quarto com ele precisa ser forte para dar amor e educação ao garotinho de cabelos longos, além também de ele representar o principal motivo de ela ainda querer estar viva dentro desse cenário hediondo.
Por isso esse segundo momento é tão bom quanto o primeiro, trazendo ainda mais cenas comoventes, como a que envolve a relação de Jack com a avó (Joan Allen) e o marido dela, e o modo como a mãe de Jack cai em depressão em se ver diante daquele mundo que os acolhe, mas que também procura tirar proveito de sua experiência perturbadora de aprisionamento e abuso sexual.
O QUARTO DE JACK é baseado em um romance da escritora irlandesa-canadense Emma Donaghue, que tem um histórico interessante de livros sobre personagens femininas fortes. Dois de seus livros receberam prêmios especiais de ficção lésbica. E se Room não possui marcas de lesbianismo, há sim um forte apelo feminino, ao mostrar Joy, a personagem de Brie, como uma mulher que recusa, com toda a razão, a ideia de que Jack seja produto da ação de um estuprador, mas sim que o garoto é dela, e só dela. Esta declaração, inclusive, é um dos momentos mais fortes deste filme sensível e doloroso.
O QUARTO DE JACK concorre ao Oscar nas categorias de melhor filme, direção, atriz (Brie Larson) e roteiro adaptado.
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