sexta-feira, outubro 28, 2011
EXISTENZ
O problema de eu ter adotado a caixa alta como padrão para os títulos dos filmes no blog surge quando aparecem filmes que fazem distinção das letras maiúsculas e minúsculas. Caso de eXistenZ (1999), um dos melhores e menos incensados trabalhos de David Cronenberg. O X e o Z maiúsculos destacados se justificam pelo fato de que o termo "isten" em húngaro quer dizer "Deus". A língua húngara também aparece quando o "joystick”, ou melhor, o pod usado pela personagem de Jennifer Jason-Leigh, emite um som que quer dizer "obrigado" em húngaro. Esses são dados pegos do IMDB que eu achei curiosos.
Quanto à revisão do filme, depois de quase dez anos, para mim foi uma grata surpresa. Não tinha percebido o quanto ele era ótimo. Subiu muito em meu conceito e já garantiu espaço no meu top 5 Cronenberg, o que é muito para um autor tão importante. O filme segue um pouco uma linha sensual, como em CRASH – ESTRANHOS PRAZERES (1996), mas dialoga mais com MISTÉRIOS E PAIXÕES (1991). No entanto, trata-se de uma obra muito melhor e mais interessante do que a adaptação do romance de William Burroughs. A semelhança se deve principalmente a dois fatores: a abertura para ligar os jogos virtuais aparece na forma de um ânus, novamente o orifício de destaque na obra do diretor; e o aspecto viajante do filme.
EXISTENZ é tudo o que MISTÉRIOS E PAIXÕES quis ser e não conseguiu: apresenta uma história na qual os personagens (Jennifer Jason-Leigh e Jude Law) se deixam perder em um universo irreal, levando o espectador junto. Em EXISTENZ essa viagem é mais prazerosa e o filme é ao mesmo tempo gostoso de ver e angustiante na preocupação com a realidade. E ainda tem a discussão filosófica sobre o que é realidade que o filme propõe, como quando Jude Law retorna ao seu corpo carnal e começa a achar o mundo "de verdade" menos real. O jogo de realidades virtuais dentro de realidades virtuais é fascinante.
Jennifer Jason Leigh está bem sensual. Muito bom ver este momento da carreira de Cronenberg em que ele valoriza a sensualidade feminina, bastante explorada no anterior CRASH – ESTRANHOS PRAZERES. A cena de sexo de Jennifer com Law no mundo alternativo é um dos pontos altos do filme e que ainda traz a pergunta: até que ponto a vontade e o desejo é do personagem e até que ponto é do próprio jogador?
Pra quem não conhece a trama, Jennifer Jason-Leigh é Allegra Geller, uma designer de jogos virtuais que cria um jogo revolucionário chamado "eXistenZ", que uma vez ligado a um orifício colocado nas costas do jogador, leva-o a um mundo quase perfeito, em comparação com o mundo real. Ela é atacada por um fanático que empunha uma arma estranha e orgânica, mas consegue sobreviver. O personagem de Jude Law é o homem que a leva em segurança e começa a manter uma relação de maior aproximação com a moça, a ponto de os dois compartilharem juntos uma aventura perigosa no eXistenZ.
A música novamente de Howard Shore, o mais presente parceiro nas obras de Cronenberg, ajuda a tornar a atmosfera do filme ainda mais misteriosa, assim como a fotografia belíssima de Peter Suschitzky, outro colaborador habitual do cineasta. A cópia em resolução 720p disponível na internet está maravilhosa e faz jus à fotografia do filme. Há também um clima que lembra um pouco os filmes noir da década de 40, mas acrescido de algo de psicodélico ou ciberpunk, com predomínio do niilismo. As estranhas criaturas dos filmes de Cronenberg se apresentam principalmente na figura dos pods. A mistura daquilo que seria eletrônico com o orgânico é uma evolução da tão propagada "nova carne" de VIDEODROME (1983).
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