quarta-feira, outubro 19, 2011

MELANCOLIA (Melancholia)



Como o filme anterior de Lars Von Trier descontruiu completamente a imagem que eu tinha dele – pela segunda ou terceira vez –, resolvi dar um tempo entre o momento em que vi MELANCOLIA (2011) e o momento em que escreveria a respeito. Quando vi ANTICRISTO (2009), a princípio não gostei, mas suas imagens insistiam em permanecer fortes em minha memória e o filme foi crescendo para mim, assim como o respeito ao diretor, que eu tinha perdido lá com DANÇANDO NO ESCURO (2000). Depois de DOGVILLE (2003), então, nem quis ver os outros dois longas dele, de tão desapontado que fiquei.

Como se vê, trata-se de um diretor complicado e que provoca reações das mais diversas no público. Com MELANCOLIA não seria diferente. Se ANTICRISTO foi um filme que ele fez para exorcizar a depressão, MELANCOLIA é a continuação desse processo. Menos agressivo, menos visceral, mais humano e mais reflexivo. E a ideia de que a depressão é o fim do mundo tem tudo a ver. Quem já sofreu desse transtorno sabe o quanto ele deixa a pessoa debilitada e sem ver sentido nenhum na existência. Chega-se ao ponto de querer trocar tudo o que se tem de material – pois o material não importa – pelo restabelecimento de sua saúde mental e espiritual.

Em entrevista do diretor à revista Veja, ele revela muitas coisas interessantes, como o fato de sua mãe, no leito da morte, ter lhe contado que o homem que ele acreditava ser seu pai não o era de verdade. Pelo menos, não biologicamente. E isso mexeu e muito com a cabeça de Von Trier. Outro detalhe importante da entrevista se refere a uma declaração de Ingmar Bergman sobre Von Trier. Bergman disse que quando Von Trier começasse a usar a si mesmo em seus filmes, então talvez ele passasse a considerá-lo digno de alguma atenção como cineasta. Foi uma declaração forte, mas que agora parece fazer muito sentido para Von Trier.

E gostando-se ou não de MELANCOLIA – no meu caso, deixo claro que gostei bastante, embora o filme não tenha me levado às lágrimas -, é definitivamente um filme para ser visto no cinema. Especialmente por causa da sequência final, tão poderosa e intensa. Sem falar na capacidade do diretor de compor planos exuberantes, alguns que ele considera dignos de uma câmera lenta.

E como não respeitar um cineasta que apesar de nunca ter pisado em solo americano conseguir reunir um elenco internacional, com atores do porte de Kirsten Dunst, Charlotte Gainsbourg, Kiefer Sutherland, Charlotte Rampling, John Hurt, Stellan Skarsgård, Udo Kier, além do rosto conhecido de quem já assistiu TRUE BLOOD, Alexander Skarsgård? E todos estão ótimos em seus papéis.

A divisão do filme em duas partes, com os nomes das duas irmãs, Justine (a personagem de Kirsten Dunst) e Claire (a personagem de Charlotte Gainsbourg), foi muito feliz. Justine é a personagem que sofre de depressão crônica. Ela está na festa de seu casamento e precisa se fazer de feliz, quando na verdade a apatia e a profunda melancolia a consomem. Não demora muito para ela estragar a própria festa. Já Claire é aquela mulher que se apega até o fim à vida, que se desespera ao saber que o fim está próximo. Enquanto a irmã diz que a Terra vai acabar e ninguém vai sentir falta, ela quer pelo menos aproveitar os últimos instantes, por mais que a angústia a consuma.

Essas duas personagens representam dois aspectos de uma personalidade em conflito, quando em depressão. Ora ela quer agir, recuperar a vida e as coisas que importam, como a família, por exemplo; ora ela age com completa apatia, com o olhar triste como se visualizasse o vazio. No pior sentido do termo. E em tempos em que esse mal do século parece cada vez mais próximo de nossa sociedade, associado a rumores de fim do mundo, nada mais representativo de uma época do que MELANCOLIA.

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