domingo, abril 03, 2022

SERVANT – TERCEIRA TEMPORADA (Servant – Season Three)



Acabei de reler o texto que escrevi um ano atrás sobre a segunda temporada de SERVANT e percebi que na temporada passada Leanne, a personagem mais interessante da série, vivida por Nell Tiger Free, já iniciava um processo de mudança bem radical em sua maneira de ser e de ver a vida, e também de ter consciência de seu poder de manipulação e de sua autoestima, que também tem a ver com sua negação da opressão relacionada à seita que ela participava. Por outro lado, agora que ela matou a tia no final da temporada passada (e escondeu o corpo dentro da casa, sendo que os dois atos podem ser vistos como atos simbólicos), ela sabe que, a qualquer momento, pode ser alvo dos membros da seita.

E assim começa a terceira temporada (2022), com seus episódios dedicados principalmente a mostrar essa situação de clausura e medo de Leanne, que trouxe de volta o bebê Jericho, para alegria do casal Dorothy (Lauren Ambrose) e Sean (Toby Kebell). Sean, inclusive, passa a se ligar mais na fé, entra em uma igreja evangélica, acreditando que o milagre da volta de Jericho precisa sim ser celebrado, ele acredita que precisa ser grato a Deus. Aliás, que cena fantástica a que mostra o diálogo de Sean com Leanne, quando ela diz que não foi Deus quem trouxe de volta Jericho.

Por mais que a série ganhe muito pelo seu mistério, um dos maiores méritos de SERVANT está em seu capricho visual. M. Night Shyamalan deu o tom, dirigindo alguns episódios (nesta terceira, ele dirige apenas o primeiro), e convida cineastas jovens e talentosos para seguir o estilo, embora percebamos também certa liberdade criativa no uso da câmera, dos ângulos, das opções visuais. Percebe-se, por exemplo, o quanto a filha do cineasta, Ishana Shyamalan, mostra serviço nesse sentido nos episódios assinados por ela.

Entre os demais jovens diretores convidados, vale destacar a presença de Carlo Mirabella-Davis, do horror psicológico DEVORAR (2019); de Kitty Green, a diretora de A ASSISTENTE (2019), outra obra que lida com a tensão de maneira forte; e a dupla Severin Fiala e Veronika Franz, de BOA NOITE, MAMÃE (2014). Outros nomes novos e cujos trabalhos não conheço ainda, e creio que merecem nossa atenção, são Dylan Holmes Williams (THE DEVIL’S HARMONY, 2019) e a dupla Logan George e Celine Held (TOPSIDE, 2020). Prestemos atenção nesses nomes.

Esta terceira temporada é totalmente dominada por Leanne, mas com Dorothy sendo, mais uma vez, sua inimiga, em um embate muito tenso dentro de um espaço relativamente pequeno. Alguns episódios são muito especiais. Adoro "Tiger", quando Leanne aceita sair de dentro de casa para uma festa na rua e acaba enfrentando uma situação de perigo. É um dos poucos episódios situados fora da casa. Em "Donut", vemos uma tentativa de uma colega de Dorothy de usar Leanne para derrubar a ex-colega com ajuda da bruxinha, tendo resultados arrepiantes. E os dois últimos episódios, com a tentativa de Dorothy de se afastar ou de afastar Leanne, fecham muito bem (e com um baita choque) uma temporada que começou mais tranquila que as anteriores.

Para uma temporada que parecia demorar muito na situação de medo de Leanne de sair de casa, o modo como a trama avança a partir da segunda metade faz com que ela seja talvez a melhor até o momento. O olhar de Dorothy na cena final da temporada já prenuncia o que vem de perturbador por aí. E talvez deixemos de simpatizar tanto assim com Leanne, a bruxa (ou seja lá o que ela é) que aprendemos a amar, apesar de tudo.

+ DOIS FILMES

O RITUAL - PRESENÇA MALIGNA (The Banishing)

Apostar apenas na atmosfera sem ter tanta preocupação com um roteiro é uma tarefa que apenas grandes diretores ou cineastas muito talentosos podem se dar ao luxo. Infelizmente não é o caso de O RITUAL - PRESENÇA MALIGNA (2020), de Christopher Smith, que tem um problema em lidar com a história em si, que chega a se tornar desinteressante até para quem conta, mas que possui sim alguns momentos visuais muito interessantes. A cena da personagem de Jessica Brown Findlay correndo "em duplicatas" pela casa assombrada, por exemplo, é muito boa, embora pareça copiada de TWIN PEAKS ou de algum filme do Mario Bava. Há também uma preocupação do diretor em não parecer vulgar e por isso não há muitos jump scares - acho isso válido. Também há uma correlação com o mal causado pelo nazismo, já que a história se passa pouco antes da entrada da Inglaterra na Segunda Guerra.

MORBIUS

Não sei se o pessoal que cria esses filmes com personagens da Marvel exclusivamente para a Sony (ainda que em conjunto e com o aval da própria Marvel) quer fazer o público desistir dessas tranqueiras ou quer fazer uma espécie de teste de paciência ou de fidelidade com o espectador. A fidelidade de fato existe - eu sou um dos vários que assiste, mesmo que sem vontade e bastante cansado, todos esses filmes com heróis e vilões da Casa das Ideias para o cinema - e talvez por isso eles ainda estejam se mantendo firmes com esses projetos toscos. Em MORBIUS (2022), dirigido por Daniel Espinosa, temos um filme que até poderia resultar em algo decente, uma história de um cientista "maluco" que se transforma em um vampiro pelo caminho dos experimentos científicos, mas que infelizmente vai ficando cada vez mais desinteressante até chegar ao ápice na cena da luta de Morbius com seu antagonista no metrô. É o momento em que gritamos "tirem-me daqui!" ou olhamos para o relógio, com impaciência. E o que é aquele primor de diálogo da cena pós-créditos, hein? Só deixa explícito que não existe uma pessoa interessada em fazer algo minimamente razoável. E o pior é que aponta para continuações, junções com outros heróis e vilões etc.

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