sábado, dezembro 18, 2021

AMOR, SUBLIME AMOR (West Side Story)



A experiência de ver a nova versão de AMOR, SUBLIME AMOR (2021), dirigida por Steven Spielberg, não foi das mais agradáveis para mim. Senti as dores das horas passando, da música que raramente me pegava, do romantismo à moda antiga que não estava funcionando comigo. E por mais que a estranheza de ver um filme assumidamente anacrônico seja interessante, me peguei pensando no que Woody Allen falou quando disse que quando queria fazer NOIVO NEURÓTICO, NOIVA NERVOSA, pensou em MULHER ABSOLUTA, de George Cukor, como modelo (ou em qualquer outra comédia estrelada por Spencer Tracy e Katharine Hepburn), mas que não queria replicar algo que para ele ficou antigo, ultrapassado. Certos filmes são obras-primas, mas porque são vistas como obras de seu tempo. É estranho pegar um musical dos anos 1950 que foi para o cinema em 1961, por Robert Wise e Jerome Robbins, e trazê-lo para o século XXI.

Mas sei que Spielberg, mesmo sendo um cineasta da Nova Hollywood, tem esse espírito mais antiquado, se comparado com seus colegas contemporâneos. E sei também o quanto estamos testemunhando um retorno dos musicais aos cinemas (e aos streamings). Há vários filmes novos do gênero e confesso que já deixei de ver vários, principalmente aqueles mais conectados diretamente com o teatro, como os pensados por Lin-Manuel Miranda. Sei que pode ser uma bobagem de minha parte, mas também se deve à falta de tempo mesmo. Aliás, até cheguei a ir ao cinema para ver QUERIDO EVAN HANSEN, por consideração ao diretor Stephen Chbosky, mas o projetor da sala deu problema e saí para ver outro filme.

Então, a impressão que tenho é que o cinema hollywoodiano da primeira metade dos anos 1960 ainda estava muito antiquado, se comparado com o cinema europeu moderno, e até com o cinema brasileiro. A contracultura estava dominando o mundo e os executivos parece que tinham medo de enfrentar essa nova realidade, por mais que alguns cineastas já estivessem acenando para os novos ventos, como o próprio Nicholas Ray, em JUVENTUDE TRANSVIADA. A década de 1960 talvez tenha sido a mais desafiadora para o cinema americano, principalmente para dois de seus mais importantes gêneros, o musical e o western. Enquanto isso, na Europa, esses mesmos gêneros estavam sendo reinventados de maneira brilhante, especialmente na França e na Itália, respectivamente.

Uma das coisas de que mais gostei no filme de Spielberg foi o visual (mais uma vez a fotografia está a cargo do parceiro Janusz Kaminski), que dá ao filme uma textura interessante, que remete diretamente aos tons do musical de 1961, mas também ao tipo de fotografia semelhante aos filmes produzidos na época. Isso torna seu filme charmoso e plasticamente belo.

Quanto à trama, mesmo sabendo que é um fiapo de trama sem muita profundidade – o filme original já era assim -, me incomodou muito a estupidez dos personagens masculinos. Todos (talvez em menor escala Anton, vivido por Ansel Elgort) são uns imbecis, tanto os americanos brancos quanto os porto-riquenhos, em sua busca por briga sem sentido algum. Sei que é possível ver isso como uma espécie de alegoria da própria guerra em si, provocada por homens, mas talvez seja por demais simplista fazer esse tipo de comparação, sem levar em consideração outros fatores.

Por isso gosto do momento “pós-guerra” do filme, quando parece que finalmente, após a tragédia que acarreta mortes de ambos os lados das gangues, a narrativa ganha um tipo de melancolia que me agrada. E aí vem a canção mais bela, “Somewhere”, interpretada, desta vez por Rita Moreno (no filme de 1961 era pelo casal de atores, Natalie Wood e George Chakiris). A canção, aliás, eu aprendi a amar por causa de Renato Russo, que a interpreta lindamente no disco Stonewall Celebration Concert, de 1994.

Nesse “pós-guerra”, há também uma bela conversa entre Maria (a estreante Rachel Zegler) e sua amiga Anita (Ariana DeBose). Aliás, arriscaria dizer que as duas atrizes são as melhores jovens aquisições do elenco. Por mais que goste muito de Elgort, são elas duas que passam mais verdade em seus papéis. Inclusive, Ariana está muito bem na cena de outra das canções muito famosas do musical, “America”, seja cantando, seja dançando.

Não deixa de ser interessante como os filmes batem de maneira tão diferente nas pessoas, já que AMOR, SUBLIME AMOR tem sido amado por boa parte de minha bolha cinéfila e está aparecendo em várias listas de melhores do ano. Considero-me uma pessoa de espírito romântico (chorei a sessão inteira de OS GUARDA-CHUVAS DO AMOR, de Jacques Demy), mas em nenhum momento do filme de Spielberg eu me encantei ou mesmo me solidarizei com o Romeu e a Julieta nova-iorquinos. Talvez tenha visto excesso de técnica, talvez tenha sentido, por parte do diretor, uma vontade de ser muito fiel ao musical de Arthur Laurents, Leonard Bernstein e Stephen Sondheim, que tanto lhe fez a cabeça quando criança e que era uma paixão de seu pai, a quem o filme é dedicado.

De todo modo, tenho respeito pelo filme, por Spielberg, pelo musical mais clássico, pelos atores, que além de tudo cantam também, pela proposta de trazer atores latinos para papéis latinos em vez de maquiarem atores brancos como fizeram em 1961. Respeito. Mas com um distanciamento emocional. Infelizmente.

+ DOIS FILMES

KING RICHARD - CRIANDO CAMPEÃS (King Richard)

Um filme que foca mais no jeito genioso e muito particular de Richard Williams no que na história de suas filhas, as famosas tenistas Venus e Serena Williams. É interessante como KING RICHARD - CRIANDO CAMPEÃS (2021), de Reinaldo Marcus Green, responde a possíveis questionamentos que poderiam surgir a partir de ações, como o fato de Richard ser um pai que quis treinar duro com as filhas para que elas fossem grandes tenistas, mas que, mais à frente, se mostra muito inteligente e interessado nos estudos e na condição de criança das meninas, após conseguir um contrato muito bom com um treinador. Como é um filme que celebra essa conquista de duas meninas negras em um esporte comumente associado à elite branca, essa questão dos obstáculos enfrentados, sendo eles de um bairro pobre, é sempre enfatizada, e com razão. Afinal, o trabalho das duas representa um exemplo, portas sendo abertas. Senti falta de mais inventividade no modo como são filmadas as partidas de tênis, mas não era o objetivo do diretor. Assim, dentro do que se propõe, é uma bela cinebiografia que radiografa determinado momento na vida de Richard e das filhas, além de ser, como geralmente filmes de esporte são, uma história de superação com bons textos e momentos divertidos.

NOITE PASSADA EM SOHO (Last Night in Soho)

A decepção foi grande, levando em consideração que eu havia gostado muito do filme anterior de Edgar Wright (EM RITMO DE FUGA, 2017), que gosto do gênero horror e sou fã do estilo muito próprio de Anya Taylor-Joy. Infelizmente o que temos aqui é um filme sem criatividade no roteiro e sem uma atmosfera de filme de horror que funcione. São quase duas horas da personagem de Thomasin McKenzie fugindo de assombração ou de alguma alucinação e vivendo situações já manjadas, vistas de maneira muito mais elegante e inteligente em outros filmes do gênero. Há algum charme na brincadeira de voltar no tempo (anos 1960), até porque a década escolhida é mágica. Pena que não foi o suficiente e acabei vendo que o anterior do diretor é uma exceção em sua filmografia, no que se refere a me agradar de fato.

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