quinta-feira, junho 11, 2015
DE CABEÇA ERGUIDA (La Tête Haute)
Há várias razões para encarar DE CABEÇA ERGUIDA (2015) como uma obra merecedora de nossa atenção. Além de conseguir o que MOMMY, de Xavier Dolan, não conseguiu, trata-se de uma obra cheia de momentos emocionantes. Há quem diga que se trata de um filme excessivamente panfletário da justiça francesa, mas esse detalhe em nenhum momento me incomodou, mesmo quando a diretora Emmanuelle Bercot (ELA VAI, 2013) torna-o bem explícito. Há tantos filmes patrióticos e belicistas americanos que são excelentes, não é?
O mérito desse posicionamento bem à esquerda no tratamento do problema da delinquência juvenil, mesmo quando tudo parece perdido, é perceber o quão árduo é o processo de fazer de um jovem violento e complicado uma pessoa normal, por assim dizer. Exagerar nos atos de violência do rapaz faz parte da construção da história, de modo que ela incomode, crie momentos em que odiamos e outros em que temos amor pelo jovem tempestuoso.
O filme já começa com a jovem mãe (Sara Forestier, de OS NOMES DO AMOR) em uma audiência com a juíza vivida por Catherine Deneuve e cansada de tentar tudo que sabia no tratamento da complicada criança de sete anos, que com o tempo acaba sendo cuidada pelo Estado. A juíza em si é um exemplo de autoridade, mas principalmente de bondade e justiça, personificação do que o sistema francês quer se fazer mostrar. Aliás, do que qualquer sistema jurídico gostaria de ser.
DE CABEÇA ERGUIDA dá um salto de alguns anos, quando jovem Malony (o estreante Rod Paradot) se torna um expert em roubar carros para fazer manobras perigosas. É o que ele mais gosta de fazer. Estudar é um caso complicado, para dizer o mínimo; trabalhar também, embora com algum esforço das autoridades e dos educadores ele consiga algum progresso.
O problema é que para cada passo de progresso, ele regride três, quatro passos com sua atitude sempre pendendo para a violência. Algumas crises de violência chegam até a assustar e provocar um sentimento de mal estar e uma vontade de tomar uma atitude mais punitiva para aquele garoto mal criado. Uma prisão, por exemplo. Na França, menores de 18 anos vão presos, ainda que para que isso ocorra se desenrole um longo processo. Na atual discussão brasileira sobre a possível diminuição da maioridade penal, ver DE CABEÇA ERGUIDA não deixa de ser uma boa ideia, embora não se trate aqui de um jovem criminoso que cometeu um homicídio ou algo do tipo. Trata-se de educar um garoto.
E educar não é fácil. Mesmo para jovens que não sejam garotos-problema como Malony. E essas tentativas na maioria das vezes frustradas dos educadores, da juíza, da mãe e do próprio garoto são exemplos de como é preciso ter espírito forte, pois a autoestima até do profissional fica em frangalhos diante de tantas dificuldades. Desistir parece o caminho mais fácil. Mas entra aí um elemento forte, que é o amor. E por isso talvez tenha sido necessário uma diretora, uma mulher, para contar essa história.
DE CABEÇA ERGUIDA foi o filme de abertura da edição deste ano do Festival de Cannes. Fato raro para uma obra quase obscura dentro de um festival que costuma prestigiar grandes autores e abrir com grandes produções.
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