sábado, junho 27, 2015

QUATRO FILMES FRANCESES


Meu saldo de filmes vistos no Festival Varilux foi bem aquém do esperado. Acabei perdendo pelo menos uns dois que gostaria muito de ver, mas pode ser que consiga assistir quando pelo menos um deles entrar em circuito. Dos cinco vistos, já postei sobre o meu favorito, DE CABEÇA ERGUIDA, de Emmanuelle Bercot, e resolvi escrever, em forma de pílulas, sobre os outros quatro, todos no mínimo bons.

O DIÁRIO DE UMA CAMAREIRA (Journal d’une Femme de Chambre)

Do mesmo diretor do ótimo ADEUS, MINHA RAINHA (2012) e de 3 CORAÇÕES (2014), que deve ser exibido no Cinema de Arte em breve, O DIÁRIO DE UMA CAMAREIRA (2015) é mais uma boa adaptação da obra de Octave Mirbeau. A mesma que já foi adaptada em 1946 por Jean Renoir e em 1964 por Luis Buñuel. Perguntado sobre por qual dos dois (grandes) autores ele teria se inspirado para fazer o seu trabalho, o diretor Benoît Jaquot afirmou ter tentado fazer sua própria versão, pensando apenas no romance. Pode-se dizer que ele foi feliz em sua adaptação, até por poder contar mais uma vez com Léa Seydoux no papel principal. Como bem falou um amigo meu em homenagem à atriz, ela parece ter nascido para esses papéis de época, especialmente quando se mostra ao mesmo tempo recatada e fogosa. Em O DIÁRIO DE UMA CAMAREIRA ela é Célestine, uma jovem que, por força das circunstâncias, torna-se uma empregada doméstica de uma família rural. Ela odeia aquilo. Odeia principalmente sua patroa sádica. Há algumas cenas que são saídas de sonhos dela. Outras nos deixam na dúvida. É um filme que cresce à medida que pensamos nele, além de ser cheio de grandes momentos. Destaque também para Vincent Lindon, grande ator, que mais uma vez rouba as cenas em que aparece. Seu papel é importante para dimensionar a obra num período em que a sociedade europeia alimentava o ódio antissemita.

HIPÓCRATES (Hippocrate)

Basicamente um filme sobre o início da vida de médico, HIPÓCRATES (2014), de Thomas Lilti, se revela também uma bela obra sobre a amizade e a cumplicidade. Vincent Lacoste (que aparece em um papel pequeno, mas marcante, em O DIÁRIO DE UMA CAMAREIRA) é Benjamin, filho do dono de um hospital que está dando início a suas primeiras experiências práticas na área médica. Sentimos uma certa aflição, por exemplo, ao vermos o personagem tentando efetuar uma punção lombar em um paciente. Abdel (Reda Kateb) é o sujeito que chega para salvar a pátria do paciente, mas também para deixar Benjamin desconcertado. Ele percebe que aquele imigrante ali tem muito mais experiência e segurança que ele, que ainda nem sabe direito se quer ou não ser médico. Divertidos os momentos em que os jovens médicos de plantão assistem HOUSE na TV. Trata-se de um filme de narrativa bem simples, clássica, mas bastante eficiente na construção dramática, em especial quando se aproxima do final e vemos a aproximação dos dois protagonistas em situações no mínimo perturbadoras para iniciantes.

GEMMA BOVERY - A VIDA IMITA A ARTE (Gemma Bovery)

Fico me perguntando o que seria de GEMMA BOVERY – A VIDA IMITA A ARTE (2014, foto), de Anne Fontaine, se não fosse a beleza, a sensualidade e o carisma de Gemma Arterton. Aliás, não pesquisei, mas o filme, a julgar pelo próprio título, foi feito para que a atriz inglesa brilhasse. E ela brilha como em nenhum outro filme, como uma espécie de versão contemporânea da personagem trágica de Gustave Flaubert. Ela faz o papel de Gemma, moça casada com um sujeito chamado Charles (Jason Flemyng). O nome do casal chama a atenção do francês apaixonado pela obra literária, interpretado por Fabrice Luchine, no papel aqui de um padeiro local que fica especialmente interessado na vida de Gemma, que, a seu ver, parece ter tudo para repetir os feitos da personagem literária, a começar por uma ou duas traições, que culminariam em sua morte. GEMMA BOVERY equilibra bem a comédia e o drama, mas o que fica mesmo na memória é Gemma Arterton, que faz com que mendiguemos cada parte de seu corpo a todo momento, como fez um tempo atrás Claudia Cardinale em O LEOPARDO, de Luchino Visconti.

SAMBA

Depois do sucesso popular de INTOCÁVEIS (2011), Eric Toledano e Olivier Nakache estão de volta, novamente contando com o carisma e a simpatia de Omar Sy, que interpreta o personagem título, um homem de Senegal que se encontra em situação ilegal na França. É em uma de suas prisões que ele conhece uma mulher (Charlotte Gainsbourg) que lhe dá carinho e atenção, ainda que com seu jeito reservado e um tanto desajeitado. Aliás, ambos são desajeitados e isso acaba por torná-los mais simpáticos ao espectador, embora o filme não consiga aprofundar muito bem seus personagens. SAMBA (2014) é um feel good movie que também tem algo de amargo em alguns momentos. E isso depõe a seu favor, compensando suas falhas (o final é bem problemático). Os diretores quase acabam desperdiçando o bom material que têm, os bons personagens que têm. Se Omar Sy não estivesse ali para salvar a pátria nem sei o que seria do filme. Ainda assim, é um desses trabalhos tão agradáveis de ver que é preferível relevar seus deslizes.

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