quarta-feira, julho 15, 2020

THE OLD GUARD

Tem surtido um efeito positivo a maior abertura de produções de Hollywood para diretoras mulheres. No caso de Gina Prince-Bythewood, trata-se de uma mulher negra que contava no currículo com alguns poucos dramas e comédias românticas com uma repercussão relativamente pequena: ALÉM DOS LIMITES (2000), A VIDA SECRETA DAS ABELHAS (2008) e NOS BASTIDORES DA FAMA (2014). Todos são filmes que lidam com questões étnicas e que põem a diretora na crescente lista das cineastas ativistas.

No caso de THE OLD GUARD (2020), há o ativismo negro e do poder da mulher, mas há também um interesse muito forte em abraçar a luta contra a homofobia. Dos personagens imortais da trama, há histórias de personagens homossexuais vistos de maneira muito bonita e respeitosa, como é o caso do casal Joe e Nicky, vividos, respectivamente, por Marwan Kenzari e Luca Marinelli, o excelente ator de MARTIN EDEN.

Quanto ao fato de termos uma mulher dirigindo um filme de ação de super-heróis, Prince-Bythewood se junta a Patty Jenkins (MULHER-MARAVILHA), Cathy Yan (AVES DE RAPINA - ARLEQUINA E SUA EMANCIPAÇÃO FANTABULOSA) e Cate Shortland (VIÚVA-NEGRA, ainda inédito). Ou seja, há uma movimentação muito interessante acontecendo para que mulheres possam dar voz a protagonistas femininas com suas sensibilidades próprias, afastando aos poucos a sombra do machismo dominante na indústria.

E se THE OLD GUARD ainda não é um grande exemplo de filme de ação, é interessante aceitar a obra como ela é, e não como ela poderia ter sido. As principais reclamações sobre o filme são com relação à falta de um maior cuidado com as coreografias nas cenas de luta; ou à falta de uma continuidade na adrenalina nas cenas de ação, já que o drama se instala imediatamente após essas cenas. Mas eu diria que está justamente aí a beleza do filme: em conseguir trazer dramaticidade e seriedade para aquilo que parecia até um tanto ridículo no início: aquele grupo de mercenários imortais cheios de pose prontos para uma missão em um país distante.

Aos poucos essa pose se desconstrói e vemos também personagens frágeis. Tendo tantos anos de existência na Terra, há também muitas experiências trágicas acumuladas, em especial nas memórias da protagonista, Andy, vivida com sensibilidade e carisma por Charlize Theron. Andy tem especialmente duas lembranças muito dolorosas de parceiros imortais do passado, que serão contadas à nova imortal, a jovem soldado negra Nile, vivida por Kiki Lane.

É pelos olhos dessa jovem imortal que vamos descobrindo um pouco mais sobre as vidas secretas desse pequeno exército de imortais, que têm suas próprios sensos de honra e de justiça. E quanto à fragilidade deles, há um momento em especial que torna Andy tão frágil quanto incrivelmente forte, lá pelo terceiro ato, quando eles enfrentam a indústria farmacêutica que deseja lucrar com seus corpos. Aliás, o vilão caricato (Harry Melling) é um dos pontos fracos do filme, é verdade, mas não chega a comprometer tanto assim, se pesarmos os prós e os contras na balança.

Poderia haver um cuidado maior com as imagens, um certo rigor formal cairia bem, até como forma de compensar a falta de coreógrafos de luta e diretores de cenas de ação mais íntimos no assunto. Acaba ficando um filme de cenas um tanto genéricas. Porém, como disse, há algo na dramaticidade que faz com que THE OLD GUARD se torne digno de nossa atenção e carinho.

Derivado de uma HQ do ótimo Greg Rucka, que também é o roteirista desta adaptação cinematográfica, o filme até tem grandes chances de ter uma continuação. E será ótima se tiver, tanto como uma maneira de revisitarmos os personagens, quanto como uma forma de a diretora, ou quem pegar o projeto, ter a chance de torná-lo ainda melhor, aproveitando-se das tantas potencialidades. Afinal, o tema da imortalidade ainda é visto por muitos como algo extremamente fascinante.

+ TRÊS FILMES

ATÔMICA (Atomic Blonde)

Acho que minhas expectativas para o filme eram maiores e também era de um filme menos de espionagem, até pela roupagem tão apelativa para o pop. Então, essa cara pop, se é muito agradável e é uma das melhores coisas do filme, acaba prejudicando o interesse pela trama, que é mais complicada do que eu imaginava. Mas sei lá se isso importa. O que importa são algumas cenas pontuais muito boas, especialmente de ação, que lembram JOHN WICK, pela liberdade e leveza. Direção: David Leitch. Ano: 2017.

O REI LEÃO (The Lion King)

O único motivo de existir um filme como este acaba sendo puramente faturar. Claro que o próprio Jon Favreau podia estar acreditando que faria algo tão bom quanto MOGLI - O MENINO LOBO (2016), mas alguma coisa saiu muito errado no meio do caminho. O próprio desenho original já carecia de boas canções. Daí o uso delas aqui só serve para deixar o produto final extremamente cafona. Mas não cafona-legal, como em ALADDIN, que emulou Bollywood, mas cafona-ruim mesmo. E a trama, mesmo que não fosse conhecida, não empolga, nem emociona. Enfim, corre o risco de ser o pior equívoco dessas refilmagens da Disney. Ano: 2019.

O HOMEM QUE VIU O INFINITO (The Man Who Knew Infinity)

Muito complicado fazer filme sobre matemáticos, mesmo utilizando um registro de drama tradicional como o deste trabalho, que até consegue se erguer lá perto do final, mas é muito pouco para o que gostaria de ser e de emocionar a audiência. Direção: Matthew Brown. Ano: 2015.

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