quarta-feira, dezembro 28, 2016

O QUE ESTÁ POR VIR (L'Avenir)























Dizer que um filme é sobre nada até que não é algo ruim. Falam isso sobre a melhor sitcom de todos os tempos (SEINFELD), falam isso de um dos melhores romances de todos os tempos (Madame Bovary). Na verdade, trata-se de uma descrição exagerada dessas obras, mas que se for aplicada a O QUE ESTÁ POR VIR (2016), novo trabalho de Mia Hansen-Løve, até que cabe melhor, já que não vemos muita coisa "importante" acontecendo, não há grandes reviravoltas ou um plot convencional.

O que há é gente normal fazendo coisas normais, levando a vida do jeito que dá, com suas alegrias e angústias, sem muitos arroubos dramáticos. Pelo menos, não de maneira explícita, já que há sim momentos em que a protagonista está chorando sozinha no quarto ou dentro de um ônibus. A vida não é fácil, mas é possível seguir em frente. Além do mais, o prazer pela leitura, o amor pelos livros, faz com que a vida tenha sentido, seja prazerosa.

E que legal ver um filme mostrando pessoas lendo bastante. Isso é raro de se ver em filmes, em que os livros parecem ser ausentes ou quase intrusos na vida das pessoas, quando na verdade eles são companheiros e representativos do crescimento espiritual. O fato de a protagonista ser uma professora de Filosofia ajuda e muito a transmitir esse sentimento. E há até alguns momentos em que certas questões existenciais são levadas pela professora aos seus alunos em sala de aula.

O jeito como a diretora Mia Hansen-Løve trata sua personagem é de uma delicadeza admirável. E, claro, o fato de ser interpretada por Isabelle Huppert ajuda bastante. Sua personagem aqui é bastante diferente daquela que será mais lembrada em 2016, a de ELLE. Temos uma interpretação mais sutil, como o filme requer, como a vida, que a diretora quer mostrar, requer. É provavelmente com O QUE ESTÁ POR VIR que finalmente entendemos melhor outros filmes da diretora que também possuem esse tipo de característica marcadamente voltada para as coisas simples da vida, como ADEUS, PRIMEIRO AMOR (2011) e EDEN (2014). Rever os trabalhos anteriores da cineasta agora pode fazer mais sentido, pode dar a eles uma dimensão maior, mais interessante.

A trama, como se vê, é o de menos, mas se for possível fazer uma breve sinopse, temos a história de uma professora de Filosofia que é casada com um homem que também é professor, e que tem dois jovens filhos. Aos poucos, sua vida irá mudar por uma série de incidentes que são tratados como coisas que fazem a personagem sofrer, mas que a própria montagem faz questão de cortar, em vez de estender esses momentos, mudando para o dia seguinte, quando o sol nasce mais uma vez. E o sol, aliás, tem tudo a ver com a vitalidade da personagem, uma das mais leves da carreira recente de Huppert, em um dos filmes mais poéticos do cinema recente.

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