quinta-feira, julho 07, 2016

A ILHA DO MILHARAL (Simindis Kundzuli)



O cinema é uma arte que parece mais universal do que as outras, por lidar com imagens em movimento que se mostram menos propensas a se perderem na tradução e de ter maiores chances de alcançar os mais diversos países do mundo. Vendo A ILHA DO MILHARAL (2014), de George Ovashvili, essa impressão se amplifica, tanto pelo domínio excepcional da direção, quanto pela opção por contar uma história com a menor quantidade de diálogos possível.

Até eu, que sou tão apegado à palavra, não senti falta dela vendo este filme que conta com bem poucos personagens que ficam o tempo todo dentro de uma ilha muito pequena, lutando para sobreviver naquele espaço restrito, que vez ou outra acaba servindo de fogo cruzado entre dois povos inimigos.

O fato de não haver diálogos não significa dizer que o filme funcionaria perfeitamente na época do cinema mudo. Aliás, até que seria um sucesso e tanto, mas o som é muito importante para impor uma atmosfera tanto de quase calmaria quanto de perturbação. O som das águas do rio, da chuva, da palha do milho plantado, do telhado de palha e da própria casa de madeira que eles constroem naquele lugar, tudo isso é muito importante e muito bem trabalhado para a construção da trama.

O filme começa com uma cartela informando que os camponeses daquela região da Geórgia aproveitam, anualmente, a diminuição do nível da água para se estabelecerem em pequenas ilhas e assim poderem trabalhar na plantação de milho. É uma tradição e é algo que se sabe que é provisório.

Na trama, um camponês idoso se muda para a ilhota com sua neta, uma menina que está desabrochando para a vida adulta ainda, e, por isso, ainda que bastante interessada em seguir os conselhos e a tradição do homem velho, também se vê tentada em atender o chamado do corpo, que aparece principalmente quando um homem ferido é acolhido pelo patriarca na casa até que fique restabelecido.

Sem a necessidade de dar nomes aos personagens, até por serem poucos, o filme vai ganhando ares de fábula em sua construção narrativa, que sempre se mostra intrigante a cada cena. A força do filme se apresenta desde o primeiro fotograma e se sustenta até o final, numa impressionante aula de direção deste homem até então desconhecido nosso, o georgiano George Ovashvili.

Há um clima de tensão constante que permeia o lugar que seria aparentemente tranquilo. Na verdade, desde o começo, por chegar àquele espaço, o homem velho sente que poderá ter sua paz perturbada a qualquer momento. E este sentimento permeia todo o longa e faz com que não desgrudemos os olhos das imagens, tão belas quanto fascinantes.

Há quem diga que é um filme contemplativo, mas isso talvez se dê mais pela beleza da paisagem e pela pouca pressa em se contar a história, mas a verdade é que o filme até que é bastante compacto em suas tomadas, podendo agradar um público bem grande que se permitir a apreciá-lo. Uma pena que é o tipo de filme que alcança uma audiência pequena por não ter um apelo comercial e por causa de uma distribuição bem escassa. Ainda assim, apesar de ser bem melhor apreciado na tela grande, é um filme que também deve ser descoberto por meios alternativos, como qualquer outra grande obra do cinema.

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