sexta-feira, setembro 26, 2014

MAGIA AO LUAR (Magic in the Moonlight)























Depois de um filme tão amargo e carregado como BLUE JASMINE (2013), Woody Allen precisava voltar ao território das comédias leves. Ainda assim, percebe-se em MAGIA AO LUAR (2014) uma inquietação espiritual muito interessante, com o pessimismo, o sarcasmo e a visão negativa da vida tão comum nos trabalhos de Allen postos em xeque através de outro de seus alter-egos.

No caso, o alter-ego (bem menos afetado, desta vez) é representado por Stanley (Colin Firth), um mágico profissional que se traveste de chinês e apresenta espetáculos grandiosos de ilusionismo. Não é a primeira vez que Allen presta tributo a essa arte, que lhe é cara desde a juventude. Basta lembrar a aparição de mágicos em filmes como O ESCORPIÃO DE JADE (2001) e SCOOP – O GRANDE FURO (2006). O filme também presta tributo a um dos períodos favoritos de Allen, os anos 1920, lugar de fantasia de um de seus trabalhos mais inspirados dos últimos anos, MEIA NOITE EM PARIS (2011).

Na trama, Stanley aceita o desafio de um velho amigo: desmascarar uma jovem que se diz médium. Trata-se de Sophie (Emma Stone), uma americana que veio de família pobre e atualmente está sendo assediada pelo membro de uma família de aristocratas do sul da França. Ao ver Sophie pela primeira vez, ele fica fascinado por sua beleza e demora a acreditar nos acertos da jovem no que se refere à sua vida. Stanley também é o tipo de sujeito que renega não apenas as crenças em algo que não seja visível, mas que também custa a perceber que está nutrindo sentimentos por aquela moça, no tempo em que passam juntos.

Obviamente Allen não faz nenhum tratado sobre a fé, mas faz questionamentos, reflexões. A velha pergunta que a muitos instiga: o mundo é só isso mesmo, o visível, e tudo o mais é fruto da imaginação ou da enganação dos ser humano? Ou há algo mais? Ao ter contato com Sophie, Stanley passa a ter suas convicções de ateu convicto abaladas.

Talvez por se passar no sul da França e quase sentirmos o perfume das flores que o filme lembre tanto os deliciosos trabalhos de Eric Rohmer. Mas não é só por isso. Há algo na atmosfera, nos diálogos e mesmo nessas questões morais e espirituais que lembram alguns dos melhores trabalhos do cineasta francês. E podemos dizer isso como um elogio.

Visto por muitos como uma obra menor de Allen, MAGIA AO LUAR é cheio de momentos bem especiais. Talvez falte algum tempero na química para que seja uma obra arrebatadora, mas certamente esta não era a intenção do diretor, já que em nenhum momento há tentativas forçadas de fazer algo que desperte emoções fáceis ou profundas no espectador.

MAGIA AO LUAR carrega os paradoxos e idiossincrasias de seu autor. Ou pelo menos da persona que ele criou ao longo dos anos. Convivem harmonicamente o inconformismo diante da brevidade da vida e o ceticismo, Nietzche e Charles Dickens, a alegria da música dos loucos anos 1920 e a gravidade da "Sinfonia nº 9 em ré menor", de Ludwig van Beethoven. Não é pouco para uma comédia aparentemente despretensiosa.

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