sábado, abril 11, 2020

OLHOS DE SERPENTE (Dangerous Game / Snake Eyes)

Primeiro trabalho de Abel Ferrara que foge da categoria "filme de gênero", OLHOS DE SERPENTE (1993), feito em acordo com a Warner, depois de alguma concessão por parte do diretor na sci-fi de terror OS INVASORES DE CORPOS - A INVASÃO CONTINUA (1993), a produção acabou não ganhando tanta força assim, já que a própria estrela do filme, Madonna, insatisfeita com a quantidade grande de cortes de cenas suas por parte do diretor, rogou praga no filme e referiu-se a Ferrara como um canalha.

Ferrara, por sua vez, se defendeu, em entrevista: "ela é a porra de uma escrota. Como se a gente ficasse de sacanagem tirando as melhores cenas do filme só pra encher o saco dela. É preciso ser muito paranoico pra dizer uma porra dessas".

E, assim, mais uma produção do diretor acaba entrando na lista de obras mais ou menos malditas de sua filmografia. Também não foi um filme fácil para grande parte dos espectadores. É uma obra um tanto difícil e cheia de aparentes travas, já que vemos o filme dentro do filme, Mother of Mirrors, como também as cenas do cotidiano do cineasta, sua relação com a família se desgastando, bem como a confusão entre personagem e ator vivida pela dupla de protagonistas da produção, Madonna e James Russo.

No tal Mother of Mirrors, eles vivem um casal que está passando por uma crise enorme, já que ela se converteu ao Catolicismo e decide viver uma vida pacata e longe dos excessos, enquanto ele ainda quer continuar com a vida de drogas, álcool e sexo promíscuo que os dois estavam acostumados a viver. Inconformado com a decisão da esposa, ele parte para a violência. Como o ator confunde a vida real com a ficção (precisa usar cocaína e beber muito para entrar no personagem), até na cena de estupro, o sexo não consentido é real.

Há também algo de repulsivo em Eddie Israel, o cineasta vivido por Harvey Keitel, como se o ator ainda estivesse impregnado do "mau policial" de VÍCIO FRENÉTICO (1992). Uma cena como a da piscina, de Keitel e Madonna dançando e se beijando, poderia ter, se não algo de romântico, ao menos alguma coisa de excitante. Ao contrário. Isso é proposital ou acidental? É um problema do filme ou uma qualidade?

De todo modo, isso é coerente com a obra de Ferrara. Como acontece com os homens das ruas em SEDUÇÃO E VIGANÇA (1981), a violência masculina se materializa estúpida no personagem de James Russo. Sua namorada/traficante que tenta trazer algo de excitante, por exemplo, chupando seu dedo e perguntando se Sarah Jennings (Madonna) havia feito sexo oral com ele daquela maneira, recebe uns tapas, como que merecendo uma punição por ser indecente ou algo do tipo. Isso acontece em oposição ao personagem que ele interpreta no filme, que implora para que a esposa volte a ser como era antes. Em comum, a falta de respeito quanto à vontade e à ação da mulher.

Há também algo de interessante na construção do personagem de Keitel. Ele anseia pela transformação, inclusive insatisfeito com a forma como os personagens de seu filme estão presos a suas identidades fechadas, deixando-o frustrado. Em paralelo, Eddie termina sozinho, destruindo sua vida familiar em nome de uma suposta honestidade. Ele fica cansado de mentir para a esposa, tendo dormido com um grande número de mulheres enquanto esteve casado.

Quem interpreta a esposa de Keitel é Nancy Ferrara, esposa do diretor. Simbólico? Talvez, mas quem Ferrara queria para o papel, na verdade, era a cineasta Jane Campion.

+ TRÊS FILMES

3 FACES (Se Rokh)

Vendo 3 FACES, fico me perguntando por que não se fazem mais filmes assim. Tão simples, mas tão fáceis de agradar como que por uma magia. O segredo de uma grande direção está aí. Não sei muito sobre os bastidores e nem como está a situação de Jafar Panahi no Irã, mas esse homem merece mais respeito por parte dos governantes de seu país. Na falta de Kiarostami, talvez ele tenha tomado a posição de cineasta mais importante de lá. Uma verdadeira viagem pelo interior de um país distante e complicado, mas hospitaleiro. Ano: 2018.

A CÂMERA DE CLAIRE (La Caméra de Claire)

Outro delicioso filme de Hong Sang-soo. Para quem está habituado com o estilo do cineasta, é certamente um prazer. Não é mais do mesmo, pois ele sempre está acrescentando algo ao seu processo. É como se aqui ele nos mostrasse uma nova maneira de ver a vida através da filosofia da mulher estrangeira que tira fotografias. O romance nos bastidores com Kim Min-hee é novamente posto em discussão, mesmo que boa parte do público fique sem saber. Ano: 2017.

O ARTISTA DO DESASTRE (The Disaster Artist)

Da temporada de premiações de 2018, este é um dos filmes que eu mais estava empolgado para ver. Não é tão bom quanto eu gostaria que fosse, mas entretém que é uma beleza. E ajuda a gente a pensar no aspecto trágico do personagem Wiseau. Embora dê pra rir um bocado também. Está longe de ser um ED WOOD, mas comparar os dois filmes é quase inevitável pela temática. Direção: James Franco. Ano: 2017.

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