domingo, setembro 20, 2015

SEIS LONGAS VISTOS NO CINE CEARÁ 2015



Não cheguei a ver todos os filmes da mostra competitiva deste ano do Cine Ceará (faltei dois dias), mas até que vi bastante, e o meu preferido do festival, JAUJA, que não vi no evento, tive a chance de vê-lo com mais tranquilidade numa sala do Cinema do Dragão, o que acredito que tenha sido melhor para a apreciação. O Cine São Luiz é lindo e grande e majestoso, mas para certas obras que exigem um pouco mais de atenção do espectador, ele chega a dispersar um pouco os dispersos (como eu). Vamos, então, aos filmes que faltaram eu comentar aqui no blog. Será, mais uma vez, um exercício de memória, já que vi esse filmes no mês de junho.

O CLUBE (El Club)

Uma pena que um dos filmes mais interessantes do festival, o chileno O CLUBE (2015), tenha sido exibido em uma cópia ruim. E logo na noite de abertura. Isso não impediu que ele fosse eleito pelo júri oficial e também o da crítica como o melhor do Cine Ceará. Pablo Larraín é mais famoso por NO (2012), que mostra o processo de eleições do Governo do Chile, em um diferente e difícil processo de redemocratização. Em O CLUBE, o diretor se volta para um assunto distante da política do país e entra com coragem num assunto delicado: o do padres que se afastam da igreja por seu passado como pedófilos. O filme se passa numa casa em que moram um grupo de padres que têm esse passado em comum, mas que têm suas vidas reviradas quando chega uma espécie de fiscal da Igreja, que quer colocar na linha a vida mansa e de jogos apostados em corridas de cachorros daqueles homens. Entra em cena também, pra completar, um homem que afirma ter sido molestado por um deles quando era criança. E a coisa só piora e o filme vai ganhando ares cada vez mais sombrios. Gostaria de revê-lo em melhores condições. É possível que eu goste mais.

ESTRELA CADENTE (Stella Cadente)

Entre uma pescada e outra de sono (estava com déficit de sono e havia acordado cedo), tive que chegar até o fim desse drama de época espanhol de Luís Miñarro, que se destaca principalmente pela bela fotografia e caprichadíssima direção de arte. O filme, estranho em dramaturgia e andamento, mostra o incômodo reinado de Amadeo I da Espanha, que governou o país - por assim dizer, já que ele era rejeitado pela população - durante os anos de 1870 a 1873. Foi o menor tempo que um monarca ficou no Poder na Espanha. Logo depois foi proclamada a República. As convulsões sociais se percebiam só pelo som, enquanto a ação se passa quase toda dentro do palácio que só não é totalmente solitário por causa dos poucos habitantes, alguns ali para diminuir o tédio do Rei com sexo com homens, mulheres e até com melancia. Miñarro faz um trabalho que namora o teatro e a pintura. Ficou bonito, ao menos. Com sono, não dá pra julgar direito.

A OBRA DO SÉCULO (La Obra del Siglo)

O cubano A OBRA DO SÉCULO (2015), de Carlos Quintela, mistura ficção com documentário e descreve a rotina ruim de um engenheiro desiludido que vive na mesma casa com seu pai inconveniente e seu filho frustrado. O lugar onde moram parece largado no meio do nada. Fica localizado em uma parte de Cuba que possui instalações ambiciosas que foram abandonadas quando o país pretendia fazer, junto com a União Soviética, uma central nuclear em 1982. E há várias imagens de arquivo que aparecem de vez em quando na narrativa que ajudam a nos situar historicamente e nos dá uma ideia da ambição daquele projeto que foi abortado com o fim da União Soviética. Era o fim da Guerra Fria também. Ao mesmo tempo, vemos o vazio existencial daquela família que parece não ter muito motivo para viver.

NN

Filmes sobre os anos de chumbo das ditaduras militares dos países da América Latina, temos aos montes. Mas é sempre bom ver a perspectiva de outras cinematografias, como é o caso do Peru. NN (2015), de Héctor Gálvez, se debruça sobre a tentativa de pessoas que trabalham em órgãos dedicados a encontrar ossadas de pessoas desaparecidas para as famílias. O filme acompanha um grupo de pessoas que trabalha exumando os corpos de presos políticos em covas descobertas em regiões desertas do Peru. O “NN” do título quer dizer “non nomine”. O filme lida com frustrações, tanto dos familiares em busca de seus entes queridos quanto dos profissionais que encontram dificuldades e obstáculos para seguir em seu trabalho. É um filme cruel ao mostrar essa realidade, mas também pouco eficiente e pouco envolvente em causar emoções no espectador.

CORDILHEIRAS NO MAR - A FÚRIA DO FOGO BÁRBARO

Trata-se do filme mais político do festival e que, mesmo não sendo tão agradável de ver, é interessante para o público brasileiro, por causa de sua relação íntima com um determinado momento da vida de Glauber Rocha. CORDILHEIRAS NO MAR – A FÚRIA DO FOGO BÁRBARO (2015), de Geneton Moraes Neto, é um documentário que procura discutir um ponto em que Glauber procurou um meio termo ao acreditar que podia contar com o apoio do Presidente Ernesto Geisel. Isso acabou por queimar o filme dele entre seus colegas cineastas, todos de esquerda, que jamais iriam querer fazer acordo com a ditadura. Ele acabou sofrendo perseguição ideológica e sendo visto como traidor da causa. O filme apresenta diversos depoimentos coletados, sendo os mais interessantes os de Jaguar e de Fagner. Em meio a um momento em que vemos uma polarização extrema e que ninguém parece querer achar solução para os problemas de nosso país, mas apenas lutar por suas ideologias, mesmo quando estão errados, é muito bem-vinda a discussão que o filme provoca. Sem falar que acaba por ajudar a acentuar a imagem de santo louco desse cineasta tão polêmico quanto genial.

CAVALO DINHEIRO

Sinto não ter gostado desse filme, mas CAVALO DINHEIRO (2014, foto), do português Pedro Costa, é definitivamente uma obra que merece ser visto principalmente por quem tem um pouco mais de intimidade com o trabalho do diretor português, até por se tratar de parte de uma série de filmes com o personagem caboverdiano Ventura, numa trama que é necessário um pouco mais de conhecimento ao menos do contexto histórico português e sua relação com Cabo Verde. A verdade é que não via a hora de o filme acabar e pra mim foi sim uma sessão de tortura. Na trama, Ventura procura em desespero e com olhar de louco a esposa Zulmira em um hospital abandonado. O filme tem uma fotografia quase sempre muito escura, o que constitui mais um desafio para o público que acompanha a história desses imigrantes de Cabo Frio enfrentando demônios pessoais num filme lúgubre e cheio de momentos no mínimo estranhos para marinheiros de primeira viagem, como a cena do elevador, em que um personagem conversa com uma estátua. Talvez seja um filme que mereça uma outra oportunidade em uma sala menor e mais apropriada. De preferência depois de ter visto outros trabalhos do cineasta.

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