CASTANHO
Eis um filme que chama a atenção pelo mistério em seus 19 minutos. As cenas são curtas, mas sempre atraentes; as informações são passadas de maneira sutil; há a questão da morte que está e ao mesmo tempo não está. María, a personagem argentina de Sofia Sahakian, é uma jovem mulher que tem seus segredos e agora vive na comunidade Cachoeiro do Castanho, interior do Amazonas. CASTANHO (2023, foto acima), de Adanilo, é um filme que eu gostaria de ver transformado num longa. Gostei dos personagens, da ambientação, do cuidado visual. Fiquei sem entender direito a história, mas isso faz n parte da graça. Entender não é tão necessário assim e às vezes até atrapalha.
CIDA TEM DUAS SÍLABAS
Um desses filmes bem fáceis de se apreciar, de torcer pela evolução da heroína, uma senhora que mora sozinha com a neta, não sabe ler, e começa a se sentir explorada pelo dono da empresa de costura onde trabalha. CIDA TEM DUAS SÍLABAS (2023), de Giovanna Castellari, é um filme que tem muito amor e carinho, em especial nas personagens femininas, que se ajudam mutuamente. Uma obra que tem uma força política imensa dentro de uma simplicidade muito bonita.
HOJE SÓ VOLTO AMANHÃ
Animação delirante e que capta muito bem o espírito do carnaval de Olinda, a partir do ponto de vista de diversos personagens, vivendo experiências distintas, desde euforia e cansaço, passando por angústia e entorpecimento. O visual de HOJE SÓ VOLTO AMANHÃ (2024), assinado por Diego Lacerda e vários diretores, é como um sonho e é incrível que tenha sido feito por várias pessoas e tenha mantido a mesma coesão ao final. O colorido remete tanto a um espírito lisérgico quanto a animações japonesas que exploram mitologias.
RAPOSA
Com uma trama envolvente, o curta cearense RAPOSA (2024), de Margot Leitão e João Fontenele, nos apresenta basicamente a três personagens: Lelé, o rapaz que aceita o serviço doméstico para uma senhora da região, a senhora em questão e uma moça que mora sozinha na vizinhança e que emite estranhos gritos e gemidos, a Raposa do título. Lelé é observador e fica curioso em entender a história dessa mulher. A aproximação deles revela o que a aflige e tira sua alegria de viver. Filme simples, político, sensível, mas também ousado no modo como os personagens resolvem a situação. Os diretores interpretam os personagens principais da trama.
AMARELA
Acho que existem poucos filmes brasileiros que falam sobre questões relativas às pessoas descendentes de japoneses que nasceram e vivem no Brasil. Levando em consideração que é no Brasil a maior colônia de japoneses e descendentes de japoneses no mundo, é algo a se pensar esse, por assim dizer, silêncio. AMARELA (2024), de André Hayato Saito. nos apresenta a uma adolescente que está entusiasmada com a Copa do Brasil de 1998, aquela que o Brasil perdeu para a França na partida final. Só que ela não sabe ainda, claro. O filme é curto, mas poderia se estender um pouco mais, de modo a termos mais tempos de nos apegarmos um pouco mais à sua família (mãe, pai, avó, irmão). Ainda assim, o uso da câmera com frequência muito próxima da protagonista nos passa essa tristeza dela de não se adequar, ou melhor, não ser exatamente aceita na comunidade onde vive. É um pequeno retrato de um momento de desencanto, raiva e compreensão de mundo daquela personagem.
LAGRIMAR
A animação é um recurso que permite uma liberdade muito grande para o criador. É possível qualquer coisa na animação. E as animações que adotam a ausência de fala acabam por se aproximarem mais do cinema da era silenciosa, quando as expressões precisavam ser mais explícitas, ou menos dúbias. Por outro lado, essas animações, justamente por essa liberdade narrativa, acabam optando por contar uma história que funciona como uma fábula. E sendo simpática assim como LAGRIMAR (2024), de Paula Vanina, ainda podem atrair o público infantil. E imagino que essa seja a intenção da diretora. Na trama de seu filme, que se passa num lugar deserto como a caatinga do nordeste brasileiro, uma menina vive em busca de água e acaba fazendo amizade com uma minhoca.
LADEIRA ABAIXO
Um filme fácil de conquistar a atenção do espectador este LADEIRA ABAIXO (2024), de Ismael Moura, que já vê, de início, a situação apresentada. Um homem idoso (Fernando Teixeira) é um tatuador que adora ouvir rock no talo e mora sozinho. Suas vizinhas são duas mulheres: a mais velha, uma senhora idosa que só sai de casa na cadeira de rodas levada pela filha, a mulher mais nova da casa, uma mulher que se diz católica, mas muito hipócrita e perversa com a mãe. Desse modo, é fácil se pegar torcendo pelo casal de idosos e sua liberdade. Ótimo desempenho dos atores.
MAR DE DENTRO
Vivemos num país cuja história de escravidão (oficial) ainda é muito recente. Ao mesmo tempo, as histórias dos nossos antepassados foram esquecidas pelo tempo. Por isso achei muito interessante este MAR DE DENTRO (2024), de Lia Letícia, que foi desenvolvido a partir do que foi narrado por Preto Sérgio, homem que foi preso e fugiu diversas vezes da ilha de Fernando de Noronha. A diretora opta pela tela dividida para fazer ora uma comparação entre passado e presente, ora tornar a leitura da história (escrita) prazerosa, como boa literatura.
ONDE ESTÁ MYMYE MASTROIAGNNE?
Um barato ONDE ESTÁ MYMYE MASTROIAGNNE? (2023), inclusive por valorizar as imperfeições do uso da computação gráfica e da IA atualmente mais disponíveis para o grande público para a construção de narrativas em animação ou quadrinhos. E a diretora e artista multimeios biarritzzz faz isso de forma muito inteligente. Na trama, uma cabeleireira trans chora sentindo a falta de sua amiga, também trans, Mymye, dançarina de boate, que sumiu, inclusive, dentro do universo virtual. Ela parte, então, numa busca por esses universos como que assumindo um avatar. Fica muito divertido quando ela passa a usar a voz de IA feminina que estamos acostumados a ouvir em memes e no Google Maps. Sem falar que há toda uma fauna de tipos do mundo de Mymye que são divertidos, embora também em alguns momentos passem certo ar de noir. Mas um noir colorido e cheio de purpurina.
ZAGÊRO
"Nesse filme, todas as cabeças de equipe são pessoas com deficiência. Sim, isso é uma sinopse." Está escrito na sinopse. E já chama a atenção pelo quanto o filme é tão bem construído formalmente e ainda manda muito bem sua mensagem, através do personagem-ator Victor di Marco, que por ser PCD, faz questão de fazer suas reclamações quando ao fato de que 1/4 das pessoas do Brasil são PCD e, no entanto, o país as mantêm, geralmente, à margem, praticamente invisibilizadas. A revolta de Victor é genuína, especialmente quando se fala tanto de inclusão. Além do mais, em algum momento ZAGÊRO (2024), de Victor Di Marco e Márcio Picoli, abraça um momento musical, como se fosse o instante de libertação do protagonista.
EU FUI ASSISTENTE DO EDUARDO COUTINHO
O filme de Allan Ribeiro já tem como vantagem o nosso amor por Eduardo Coutinho, a saudade que sentimos dele. Além do mais, o diretor usa uma brincadeira de repetições muito interessante para contar a sua história de quando foi assistente do Eduardo Coutinho. Para isso, em EU FUI ASSISTENTE DO EDUARDO COUTINHO (2023, foto acima), há menções de quando Ribeiro não conhecia pessoalmente o nosso mestre do documentário, passando pelas oportunidades de seus destinos se cruzarem. A narração, em alguns momentos lembra tanto ILHA DAS FLORES, de Jorge Furtado, quanto a prosa de José Saramago. Foi o filme de Ribeiro que mais me deu prazer de ver.
Um desses filmes bem fáceis de se apreciar, de torcer pela evolução da heroína, uma senhora que mora sozinha com a neta, não sabe ler, e começa a se sentir explorada pelo dono da empresa de costura onde trabalha. CIDA TEM DUAS SÍLABAS (2023), de Giovanna Castellari, é um filme que tem muito amor e carinho, em especial nas personagens femininas, que se ajudam mutuamente. Uma obra que tem uma força política imensa dentro de uma simplicidade muito bonita.
HOJE SÓ VOLTO AMANHÃ
Animação delirante e que capta muito bem o espírito do carnaval de Olinda, a partir do ponto de vista de diversos personagens, vivendo experiências distintas, desde euforia e cansaço, passando por angústia e entorpecimento. O visual de HOJE SÓ VOLTO AMANHÃ (2024), assinado por Diego Lacerda e vários diretores, é como um sonho e é incrível que tenha sido feito por várias pessoas e tenha mantido a mesma coesão ao final. O colorido remete tanto a um espírito lisérgico quanto a animações japonesas que exploram mitologias.
RAPOSA
Com uma trama envolvente, o curta cearense RAPOSA (2024), de Margot Leitão e João Fontenele, nos apresenta basicamente a três personagens: Lelé, o rapaz que aceita o serviço doméstico para uma senhora da região, a senhora em questão e uma moça que mora sozinha na vizinhança e que emite estranhos gritos e gemidos, a Raposa do título. Lelé é observador e fica curioso em entender a história dessa mulher. A aproximação deles revela o que a aflige e tira sua alegria de viver. Filme simples, político, sensível, mas também ousado no modo como os personagens resolvem a situação. Os diretores interpretam os personagens principais da trama.
AMARELA
Acho que existem poucos filmes brasileiros que falam sobre questões relativas às pessoas descendentes de japoneses que nasceram e vivem no Brasil. Levando em consideração que é no Brasil a maior colônia de japoneses e descendentes de japoneses no mundo, é algo a se pensar esse, por assim dizer, silêncio. AMARELA (2024), de André Hayato Saito. nos apresenta a uma adolescente que está entusiasmada com a Copa do Brasil de 1998, aquela que o Brasil perdeu para a França na partida final. Só que ela não sabe ainda, claro. O filme é curto, mas poderia se estender um pouco mais, de modo a termos mais tempos de nos apegarmos um pouco mais à sua família (mãe, pai, avó, irmão). Ainda assim, o uso da câmera com frequência muito próxima da protagonista nos passa essa tristeza dela de não se adequar, ou melhor, não ser exatamente aceita na comunidade onde vive. É um pequeno retrato de um momento de desencanto, raiva e compreensão de mundo daquela personagem.
LAGRIMAR
A animação é um recurso que permite uma liberdade muito grande para o criador. É possível qualquer coisa na animação. E as animações que adotam a ausência de fala acabam por se aproximarem mais do cinema da era silenciosa, quando as expressões precisavam ser mais explícitas, ou menos dúbias. Por outro lado, essas animações, justamente por essa liberdade narrativa, acabam optando por contar uma história que funciona como uma fábula. E sendo simpática assim como LAGRIMAR (2024), de Paula Vanina, ainda podem atrair o público infantil. E imagino que essa seja a intenção da diretora. Na trama de seu filme, que se passa num lugar deserto como a caatinga do nordeste brasileiro, uma menina vive em busca de água e acaba fazendo amizade com uma minhoca.
LADEIRA ABAIXO
Um filme fácil de conquistar a atenção do espectador este LADEIRA ABAIXO (2024), de Ismael Moura, que já vê, de início, a situação apresentada. Um homem idoso (Fernando Teixeira) é um tatuador que adora ouvir rock no talo e mora sozinho. Suas vizinhas são duas mulheres: a mais velha, uma senhora idosa que só sai de casa na cadeira de rodas levada pela filha, a mulher mais nova da casa, uma mulher que se diz católica, mas muito hipócrita e perversa com a mãe. Desse modo, é fácil se pegar torcendo pelo casal de idosos e sua liberdade. Ótimo desempenho dos atores.
MAR DE DENTRO
Vivemos num país cuja história de escravidão (oficial) ainda é muito recente. Ao mesmo tempo, as histórias dos nossos antepassados foram esquecidas pelo tempo. Por isso achei muito interessante este MAR DE DENTRO (2024), de Lia Letícia, que foi desenvolvido a partir do que foi narrado por Preto Sérgio, homem que foi preso e fugiu diversas vezes da ilha de Fernando de Noronha. A diretora opta pela tela dividida para fazer ora uma comparação entre passado e presente, ora tornar a leitura da história (escrita) prazerosa, como boa literatura.
ONDE ESTÁ MYMYE MASTROIAGNNE?
Um barato ONDE ESTÁ MYMYE MASTROIAGNNE? (2023), inclusive por valorizar as imperfeições do uso da computação gráfica e da IA atualmente mais disponíveis para o grande público para a construção de narrativas em animação ou quadrinhos. E a diretora e artista multimeios biarritzzz faz isso de forma muito inteligente. Na trama, uma cabeleireira trans chora sentindo a falta de sua amiga, também trans, Mymye, dançarina de boate, que sumiu, inclusive, dentro do universo virtual. Ela parte, então, numa busca por esses universos como que assumindo um avatar. Fica muito divertido quando ela passa a usar a voz de IA feminina que estamos acostumados a ouvir em memes e no Google Maps. Sem falar que há toda uma fauna de tipos do mundo de Mymye que são divertidos, embora também em alguns momentos passem certo ar de noir. Mas um noir colorido e cheio de purpurina.
ZAGÊRO
"Nesse filme, todas as cabeças de equipe são pessoas com deficiência. Sim, isso é uma sinopse." Está escrito na sinopse. E já chama a atenção pelo quanto o filme é tão bem construído formalmente e ainda manda muito bem sua mensagem, através do personagem-ator Victor di Marco, que por ser PCD, faz questão de fazer suas reclamações quando ao fato de que 1/4 das pessoas do Brasil são PCD e, no entanto, o país as mantêm, geralmente, à margem, praticamente invisibilizadas. A revolta de Victor é genuína, especialmente quando se fala tanto de inclusão. Além do mais, em algum momento ZAGÊRO (2024), de Victor Di Marco e Márcio Picoli, abraça um momento musical, como se fosse o instante de libertação do protagonista.
EU FUI ASSISTENTE DO EDUARDO COUTINHO
O filme de Allan Ribeiro já tem como vantagem o nosso amor por Eduardo Coutinho, a saudade que sentimos dele. Além do mais, o diretor usa uma brincadeira de repetições muito interessante para contar a sua história de quando foi assistente do Eduardo Coutinho. Para isso, em EU FUI ASSISTENTE DO EDUARDO COUTINHO (2023, foto acima), há menções de quando Ribeiro não conhecia pessoalmente o nosso mestre do documentário, passando pelas oportunidades de seus destinos se cruzarem. A narração, em alguns momentos lembra tanto ILHA DAS FLORES, de Jorge Furtado, quanto a prosa de José Saramago. Foi o filme de Ribeiro que mais me deu prazer de ver.
PEQUENAS INSURREIÇÕES
Adoro filmes assim com esse ar de rebelião. Aqui somos apresentados a cinco mulheres que conversam sobre uma vaga de babá que está sendo negociada a partir de entrevistas e testes. Senti um pouco de quando assisti a ARÁBIA, com a diferença que o filme mineiro era mais carregado de melancolia, enquanto neste aqui, paranaense, PEQUENAS INSURREIÇÕES (2023), de William de Oliveira, o que reina é a revolta. Gostei muito, inclusive da decisão da janela quadrada, que serve para enfatizar os rostos de cada mulher como retratos, além de passar o clima de inquietação e um pouco de claustrofobia.
A MENINA E O POTE
Tenho um pouco de dificuldade com animações com esse caráter mais surrealista, por assim dizer, ou mais delirante. Mas este A MENINA E O POTE (2024), de Valentina Homem e Tati Bond, mesmo eu me perdendo, me ganhou com a narração da indígena questionando sobre o desaparecimento de seu povo e usando elementos da vida cotidiana para servir de base para as imagens livres, que às vezes parecem desenhadas por crianças. Esta é a sinopse oficial: Em um mundo distópico, uma menina quebra seu pote de cerâmica que guarda um segredo dentro dele. A quebra do pote abre portais para um universo paralelo e ela entra num momento de transformação em que a criação de um novo mundo é possível. Certamente é um filme que cresce na revisão.
A SUA IMAGEM NA MINHA CAIXA DE CORREIO
Às vezes a gente se vê diante de um filme que tem uma ideia tão boa e de uma abordagem tão simples que nos perguntamos por que não tivemos a mesma ideia. No meu caso, eu teria que reaver as minhas revistas SET e também resgatar as fitas VHS jogadas fora. Na verdade, não é só sobre isso A SUA IMAGEM NA MINHA CAIXA DE CORREIO (2024), de Silvino Mendonça. No começo, há esse efeito nostálgico e também esse remeter às formas mais artesanais de comunicação, na seção de cartas da revista. O filme não tem uma intenção de contar uma história fechada, mas é como se víssemos o começo de várias histórias. E os trechos de cartas são tão bonitos e cheios de amor, às vezes bem juvenil, que nos pegamos tocados.
BURACO DE MINHOCA
A ideia do buraco de minhoca como um meio de uma criança se conectar com sua mãe, hospitalizada. A força de BURACO DE MINHOCA (2024) está mais nas imagens da natureza e na bela textura obtida pela dupla Hughes e Marques (DEPOIS DA CHUVA, 2013). Gosto também da cena do menino se vendo, quando bebê, no celular do pai, especialmente da imagem dele com a mãe, como se aquela memória distante, já que não mais presente no que ele consegue busca na mente, fosse preciso também ser revivida.
CASSINO
Acabei vendo duas vezes CASSINO (2024), de Gianluca Cozza, para compreender melhor e checar algumas passagens que julguei terem um caráter mais misterioso - e talvez tenham mesmo. A primeira parte do filme não mostra os rostos dos três jovens criminosos que trabalham apenas no verão, invadindo casas vazias das pessoas que viajam em busca de algo de valor. Os diálogos da terceira parte são agradáveis de ver, divertidos pelo grau de amizade e de cumplicidade dos três, e um deles conta do motivo de ter estado um tempo afastado.
QUANDO AQUI
Quando André Novais Oliveira opera no registro dos curtas, ele se vê com mais liberdade de exercitar experimentações e mais novidades no campo da forma. Em determinado momento de QUANDO AQUI (2024) eu percebi que se tratava de uma ideia muito próxima de Aqui, o quadrinho de Richard McGuire, recentemente adaptado por Robert Zemeckis. E nos créditos isso é dito. Mas Oliveira faz isso com a sua cara. Primeiro nos levando para uma conversa familiar (no duplo sentido do termo) entre seu pai Norberto e seu irmão Renato. A conversa é justamente sobre como se deu a aquisição da casa onde moram (ou moravam), a casa que foi apresentada em outros filmes do realizador. E o cinema, como essa máquina do tempo incrível, é até mesmo capaz de trazer de volta à vida a mãe do realizador, Maria José Novais Oliveira (ELA VOLTA NA QUINTA, 2015). Imagino o quanto deve ter sido incrível ver este filme na telona, e não só por conta dos quadros dentro dos quadros, mas pela própria força mesmo da mise-en-scène e da música.
Adoro filmes assim com esse ar de rebelião. Aqui somos apresentados a cinco mulheres que conversam sobre uma vaga de babá que está sendo negociada a partir de entrevistas e testes. Senti um pouco de quando assisti a ARÁBIA, com a diferença que o filme mineiro era mais carregado de melancolia, enquanto neste aqui, paranaense, PEQUENAS INSURREIÇÕES (2023), de William de Oliveira, o que reina é a revolta. Gostei muito, inclusive da decisão da janela quadrada, que serve para enfatizar os rostos de cada mulher como retratos, além de passar o clima de inquietação e um pouco de claustrofobia.
A MENINA E O POTE
Tenho um pouco de dificuldade com animações com esse caráter mais surrealista, por assim dizer, ou mais delirante. Mas este A MENINA E O POTE (2024), de Valentina Homem e Tati Bond, mesmo eu me perdendo, me ganhou com a narração da indígena questionando sobre o desaparecimento de seu povo e usando elementos da vida cotidiana para servir de base para as imagens livres, que às vezes parecem desenhadas por crianças. Esta é a sinopse oficial: Em um mundo distópico, uma menina quebra seu pote de cerâmica que guarda um segredo dentro dele. A quebra do pote abre portais para um universo paralelo e ela entra num momento de transformação em que a criação de um novo mundo é possível. Certamente é um filme que cresce na revisão.
A SUA IMAGEM NA MINHA CAIXA DE CORREIO
Às vezes a gente se vê diante de um filme que tem uma ideia tão boa e de uma abordagem tão simples que nos perguntamos por que não tivemos a mesma ideia. No meu caso, eu teria que reaver as minhas revistas SET e também resgatar as fitas VHS jogadas fora. Na verdade, não é só sobre isso A SUA IMAGEM NA MINHA CAIXA DE CORREIO (2024), de Silvino Mendonça. No começo, há esse efeito nostálgico e também esse remeter às formas mais artesanais de comunicação, na seção de cartas da revista. O filme não tem uma intenção de contar uma história fechada, mas é como se víssemos o começo de várias histórias. E os trechos de cartas são tão bonitos e cheios de amor, às vezes bem juvenil, que nos pegamos tocados.
BURACO DE MINHOCA
A ideia do buraco de minhoca como um meio de uma criança se conectar com sua mãe, hospitalizada. A força de BURACO DE MINHOCA (2024) está mais nas imagens da natureza e na bela textura obtida pela dupla Hughes e Marques (DEPOIS DA CHUVA, 2013). Gosto também da cena do menino se vendo, quando bebê, no celular do pai, especialmente da imagem dele com a mãe, como se aquela memória distante, já que não mais presente no que ele consegue busca na mente, fosse preciso também ser revivida.
CASSINO
Acabei vendo duas vezes CASSINO (2024), de Gianluca Cozza, para compreender melhor e checar algumas passagens que julguei terem um caráter mais misterioso - e talvez tenham mesmo. A primeira parte do filme não mostra os rostos dos três jovens criminosos que trabalham apenas no verão, invadindo casas vazias das pessoas que viajam em busca de algo de valor. Os diálogos da terceira parte são agradáveis de ver, divertidos pelo grau de amizade e de cumplicidade dos três, e um deles conta do motivo de ter estado um tempo afastado.
QUANDO AQUI
Quando André Novais Oliveira opera no registro dos curtas, ele se vê com mais liberdade de exercitar experimentações e mais novidades no campo da forma. Em determinado momento de QUANDO AQUI (2024) eu percebi que se tratava de uma ideia muito próxima de Aqui, o quadrinho de Richard McGuire, recentemente adaptado por Robert Zemeckis. E nos créditos isso é dito. Mas Oliveira faz isso com a sua cara. Primeiro nos levando para uma conversa familiar (no duplo sentido do termo) entre seu pai Norberto e seu irmão Renato. A conversa é justamente sobre como se deu a aquisição da casa onde moram (ou moravam), a casa que foi apresentada em outros filmes do realizador. E o cinema, como essa máquina do tempo incrível, é até mesmo capaz de trazer de volta à vida a mãe do realizador, Maria José Novais Oliveira (ELA VOLTA NA QUINTA, 2015). Imagino o quanto deve ter sido incrível ver este filme na telona, e não só por conta dos quadros dentro dos quadros, mas pela própria força mesmo da mise-en-scène e da música.
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