sexta-feira, abril 10, 2020

A GRANDE JORNADA (The Big Trail)

Não sei por que passei tanto tempo achando que A GRANDE JORNADA (1930) era apenas o primeiro filme importante de John Wayne, o filme que não tinha dado certo, um western menor. E eis que, ao ler um texto do amigo Chico Fireman, percebi que estava muito enganado. Estava deixando de ver uma das obras mais ambiciosas e importantes de seu tempo, além de contar com a direção sempre confiável do mestre Raoul Walsh.

De todo modo, foi até bom só ver agora, pois, provavelmente as cópias existentes em DVD só devem conter a versão padrão, a versão que foi lançada em 35 mm, com formato de tela mais comum para a época, a 1,2:1. A versão que eu vi foi a de 70 mm, com janela de aspecto de 2,1:1. Ou seja, quase o padrão usado posteriormente para o que se chamaria de cinemascope, na década de 1950.

Pouquíssimas salas dos Estados Unidos exibiram a versão em 70 mm, já que o país estava ainda enfrentando a Grande Depressão e os cinemas já haviam gastado bastante com a transição do cinema mudo para o cinema falado. Assim, A GRANDE JORNADA, tendo custado uma fortuna, acabou por se tornar um fracasso de bilheteria em seu país de origem, embora tenha tido bastante sucesso na Europa.

Um dos cartazes do filme dizia: "The most important picture ever produced". E, de fato, desde CAVALO DE FERRO, de John Ford, feito na era do cinema mudo, não se havia feito algo tão grandioso do ponto de vista também da relevância para a História dos Estados Unidos, de sua expansão para o Oeste. Na trama de A GRANDE JORNADA, um grupo enorme de pessoas sai do Mississipi em direção ao Oeste, a fim de se estabelecer. No grupo, há todo tipo de pessoas, inclusive alguns bandidos, que seriam os antagonistas do personagem de Wayne. Há também um interesse amoroso para o protagonista, vivida pela bela Marguerite Churchill.

A GRANDE JORNADA impressiona desde as primeiras imagens. Em tempos de computação gráfica, é admirável o tanto de gente, cavalos, carroças, que o filme dispõe. E aquilo tudo foi feito na aurora do cinema falado e em cenários de verdade. Na época, o som ainda era um obstáculo, e é natural, vez ou outra, percebermos um silêncio comum de se encontrar em produções do início dos anos 1930. Mas aqui em menor escala: até para a música havia uma preocupação, já que se tratava de um grande épico.

Há também espaço para o riso, como nas cenas em que determinado personagem sempre fala mal de sua sogra e depois ela aparece para lhe dar uma dura. É algo que ainda funciona bastante nos dias de hoje. Dei boas risadas. Há outros momentos dignos de atenção, coisas pequenas, como a atenção para as mulheres fazendo coisas do cotidiano, como lavarem os cabelos, ou cenas com os animais. Afinal, a intenção daquele povo de atravessar quilômetros e quilômetros de terra perigosa era levar o máximo que podiam para se estabelecer.

Quanto ao personagem de Wayne, Brek Coleman, ele tem um jeito honrado que nos faz apreciá-lo desde o começo. É um herói no sentido mais puro da palavra. É capaz de matar, mas é compreensível para a época. Na cena em que Ruth Cameron (Churchill) tenta pedir para que ele não vá atrás de seus algozes, ele afirma que é preciso. E lhe traz certa segurança quanto a isso. Por mais que alguns vilões pareçam saídos de animações - um deles parece o Brutus de Popeye -, tudo isso pode ser relevado em prol da aventura, da emoção e das tantas cenas admiráveis, como as difíceis passagens por tempestades de chuva e neve, por uma guerra contra os índios, por um desfiladeiro, ou por um rio violento.

Outra coisa admirável, não relacionada diretamente ao filme, mas ao gênero western em si, é o quanto o cinema o abraçou e o transformou em uma mitologia. Sendo que, quando o cinema começou com força no início do século XX, a distância entre os acontecimentos mostrados nos westerns não era assim tão grande, embora desse impressão. Que bom que filmes como esse foram criados, apreciados e se tornaram uma febre no mundo todo.

+ TRÊS FILMES

DOIS IRMÃOS - UMA JORNADA FANTÁSTICA (Onward)

Sei que tenho meus problemas com as animações mais tradicionais, mas suspeito que este é um belo exemplo de que a Pixar anda perdendo a mão e entregando filmes menos inventivos. Aqui vemos a história de dois irmãos que tentam, de alguma maneira, reencontrar o falecido pai, através de um feitiço. E a ideia é até bem boa e nas mãos de um diretor habilidoso poderia resultar em algo bastante sensível, tanto no que se refere à ausência do pai, quanto no relacionamento entre os dois irmãos, tão diferentes entre si. Mas faltou um pouco de tato e o que temos é uma aventura que parece muito um videogame, no sentido de passar etapas para se chegar a um fim. Mas tudo pode ser besteira minha e o público pode estar gostando. Uma moça estava comentando que chorou o filme inteiro ao fim da sessão, por exemplo. Direção: Dan Scanlon. Ano: 2020.

UM LUGAR SILENCIOSO (A Quiet Place)

Um dos mais belos e inventivos filmes de monstro e de futuro pós-apocalíptico dos últimos anos. Talvez tenha faltado só um pouco para ser um grande filme. Mas tanto a ideia quanto a realização são notáveis. Pena que a sala 2 do UCI Iguatemi estava uma bosta. Imagem mais escura e mais lavada do que nunca. Pra completar, a projeção não acertou direito o quadro, deixando espaço na parte de cima da tela, e o som estava com problema também. Direção: John Krasinski. Ano: 2018.

WESTERN

Não consegui gostar tanto assim deste celebrado filme, embora tenha achado bem interessante o estudo sobre a masculinidade e a alegoria com o gênero americano por excelência em um formato despojado de enfeites. Senti falta de mais mulheres. Aquele bando de macho idiota conversando e fazendo besteira me encheu o saco. Direção: Valeska Grisebach. Ano: 2017.

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