Dilacerador. É o primeiro adjetivo que vem à mente quando terminamos de ver TCHAU AMOR (1982), obra-prima subestimada de Jean Garrett, um de nossos mais talentosos cineastas. Um dos méritos do diretor neste que é considerado seu último grande filme é nos colocar no lugar do personagem de Antônio Fagundes, um homem desiludido com a vida e que parece querer pular de um viaduto, quando é abordado por uma moça rica e linda vivida por Angelina Muniz.
E o filme já nos ganha a partir daí, quando começa a história de amor de Paulo (Fagundes) e Rejane (Angelina). Afinal, imagina só você estar na merda e aparecer um anjo que além de lhe propor salvação na vida ainda traz sexo gostoso! Paulo é um homem casado, de meia-idade, que trabalha de radialista, mas que acaba perdendo o emprego por ter um estilo considerado ultrapassado. Ela é uma moça que está longe de ser careta e que faz o que bem entende da vida. Vive em um apartamento sofisticado, às custas do pai milionário. Tinha tudo para dar errado entre eles. E muitas vezes dá. Mas a moça insiste em manter um relacionamento com aquele homem.
E o amor dos dois é bonito, mas também perigoso, pois machuca primeiramente a esposa de Paulo, vivida por Selma Egrei, aqui em papel de mulher dedicada e tolerante - pelo menos até certo ponto. O filme trata de mostrar as variações de poder dentro da relação e isso vai mudando à medida que o interesse e a paixão vão pesando mais para determinado lado da balança. E é assim que Paulo se vê completamente apaixonado por Rejane, a ponto de fazer as maiores loucuras para tê-la para si. Em determinado momento, lembra um pouco o segmento "Lições de Vida", de Martin Scorsese, para o filme CONTOS DE NOVA YORK. Mas aqui o fundo do poço é ainda mais despido de glamour, com uma São Paulo suja de pano de fundo e quase personagem da história.
E o filme de Garrett não é simplista a ponto de apresentar seus personagens unilaterais em seus sentimentos e vontades. Paulo passa por oscilações de pensamento. É capaz de suportar, com muita dor, sua namorada transando com outro homem e ainda beijar-lhes os pés, para depois perceber que deve deixá-la para conservar sua sanidade mental. São variações totalmente normais na mente confusa de qualquer pessoa que se apaixona por alguém complicado e se vê nesse movimento pendular e angustiante.
Ao final de TCHAU AMOR a sensação não é das melhores para o espírito, apesar da catarse. Sentimos vontade de respirar fundo de tão intenso que é todo esse processo, que dura apenas uma hora e meia. Cineasta genial é assim: não tem apenas o domínio da narrativa; tem o domínio de nossos corações e mentes.
+ TRÊS FILMES
O FOTÓGRAFO
Engraçado como este filme consegue trazer tantos sentimentos e sensações conflitantes, como é um pouco a cabeça do protagonista, vivido por Roberto Miranda. O sexo, o amor, a solidão, a frustração, a poesia, a força das imagens do Garrett. Os créditos de abertura já apontam para uma beleza de filme. Pena que não exista uma cópia boa disponível. Mas esse VHSrip quebra o galho. Na trama, Roberto Miranda é um fotógrafo especializado em nus femininos e que passa a se apaixonar pela jovem vizinha vivida por Aldine Muller. Destaque para as belas cenas de sexo, que ainda hoje excitam e inspiram. Direção: Jean Garrett. Ano: 1980.
BLUE JAY
Um filme que passaria desapercebido por mim se não fosse a indicação do amigo Renato Doho. É produção da Netflix, o que já me deixaria de pé atrás, mas tem a Sarah Paulson e a indicação e o fato de ser uma história de amor. Ou melhor, a história de duas pessoas que foram namorados e que se reencontram depois de vários anos. Gosto do modo como o filme vai nos apresentando aos poucos o drama dos personagens até sabermos mais deles. Chega a machucar para quem já teve alguma relação parecida e que pode muito facilmente se identificar. Como sou do tipo sentimental e que guardo as boas recordações de relacionamentos passados (os mais importantes), não tive como não ficar emocionado, por mais que em um ou outro momento o filme perca um pouco o passo. Mas termina muito bem. Direção: Alex Lehmann. Ano: 2016.
CUBA LIBRE
Não gosto da primeira metade, centrada no personagem masculino. Quando o filme foca mais na mulher e em seu drama, trazendo a questão da vingança, da mudança física e na dúvida quanto ao amor, o filme cresce bastante, e só revela o quanto as obsessões de Petzold já estavam presentes desde os seus primeiros trabalhos. Na trama, homem tenta se redimir de mulher que magoou no passado. Ela, que vive na pior e fazendo programa para sobreviver de vez em quando, tenta dar uma segunda chance a ele. Direção: Christian Petzold. Ano: 1996.
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