domingo, novembro 06, 2016
CINEMA NOVO
A opção de Eryk Rocha em fazer um documentário em formato de ensaio-poesia ao invés de um mais convencional e informativo é compreensível, inclusive dentro da curta duração – cerca de uma hora e meia. Para se contar a história do Cinema Novo em um projeto audiovisual o ideal seria através de uma minissérie para a televisão com mais tempo disponível. Apesar de entendermos a proposta, sentimos muita falta de saber qual é tal filme em tal cena mostrada em CINEMA NOVO (2016).
Como um projeto em que prevalece a edição e a força das imagens de grandes obras – algumas até bem pouco conhecidas do grande público – CINEMA NOVO também se beneficia bastante de depoimentos de arquivo da época (anos 60 e 70) do pessoal do Cinema Novo, que, nota-se, mais parece um clube bem fechado, ainda que bastante diversificado. Esses cineastas (Nelson Pereira dos Santos, Carlos Diegues, Joaquim Pedro de Andrade, Glauber Rocha, Leon Hirszman, Ruy Guerra e vários outros) contribuem direto do túnel do tempo. Não há depoimentos novos, o que torna o trabalho de Eryk mais interessante.
Um dos problemas do filme está no fato de que, se ele for exibido para uma plateia que desconhece totalmente esse cinema pode até despertar uma sensação de desinteresse. Já para quem viu pelo menos alguns dos filmes que são mostrados não deixa de ser muito bom poder rever sequências lindas, como as de A FALECIDA, VIDAS SECAS, RIO, ZONA NORTE, TERRA EM TRANSE, MACUNAÍMA, além de filmes que não são necessariamente do Cinema Novo, mas do passado, como LIMITE, de Mário Peixoto, e filmes de Humberto Mauro.
Ainda assim, acaba parecendo estranho quando, no final, aparecem os créditos de diversos cineastas envolvidos com o Cinema Novo e lá está o nome de Walter Hugo Khouri, que não era muito bem-visto pelo movimento, e que aparece rapidamente junto com a turma em um evento. Não sei o quanto isso é interessante ou respeitador, levando em consideração a forma como Khouri passou a ser visto - basicamente como um cineasta alienado, distante dos interesses sociais e de natureza revolucionária de Glauber, Diegues e cia.
De todo modo, há tanta gente boa envolvida nesse que é o maior movimento cinematográfico da América Latina e que merece o nosso respeito, que a vontade de ver e rever os filmes apresentados é grande. A admiração que já temos por cineastas como Leon Hirszman e Joaquim Pedro de Andrade, por exemplo, só aumentam, ao vermos seus depoimentos e trechos de filmes. Há também algo que faz com que CINEMA NOVO seja um filme que dialoga muito bem com o momento atual em que estamos vivendo, tanto do ponto de vista político, como no que se refere à baixa audiência de público para o cinema brasileiro (que importa).
Há uma cena em CINEMA NOVO que mostra Diegues e Jabor debatendo sobre essa dificuldade que eles têm de dialogar com o grande público, que continuava resistente ao tipo de filmes que eles faziam. Mas, ao ver, por exemplo, uma cena de TERRA EM TRANSE, com dois personagens recitando suas falas de forma poética e teatral, percebe-se o porquê de esses filmes terem ganhado pouca audiência. O cinema brasileiro só reganharia o público na década de 1970, com o advento das pornochanchadas. Mas isso já é outra história, que seria até bem mais divertida de ser vista em um filme-ensaio desse tipo.
O que importa é que Eryk é feliz em nos deixar intrigados com certas cenas de filmes que desconhecemos, deixa claro a grandeza de nosso cinema, pontua tudo de forma mais ou menos organizada em blocos temáticos, e procura emular o clima de tensão que surge a partir dos eventos políticos ocorridos no Brasil durante o Golpe militar, através de um som e de uma montagem inteligentes.
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