segunda-feira, janeiro 20, 2014

ALABAMA MONROE (The Broken Circle Breakdown)























Um dos mais belos filmes dos últimos anos, ALABAMA MONROE (2012), de Felix Van Groeningen, é uma história de amor narrada com uma edição brilhante. O pequeno quebra-cabeças de idas e vindas no tempo não se constitui em nenhum empecilho para que o racional se sobreponha ao emocional. Antes de mais nada, o amor, seja dos próprios protagonistas, seja o amor pela música country americana, mais exatamente o bluegrass, o mais belo exemplar de música, conforme explica Didier (Johan Heldenbergh) à mulher que se tornaria sua alma gêmea, Elise (Veerle Baetens), é um elemento que faz com que o filme seja acompanhado mais pelo coração.

Os dois não poderiam ser mais diferentes. Ela, uma mulher moderna, com o corpo cheio de tatuagens e dona de uma loja que pratica a pintura no corpo. Ainda por cima, uma crente, no sentido de crer não somente em Deus mas naquilo que ela julga ser válido e até poético. Ele, por outro lado, é um homem apegado às raízes, tanto que seu estilo de música favorito e que ele exerce cantando e tocando com seus amigos em um bar é música de raiz de um país que ele adora. De tão enraizado com a Terra (ele cuida de um sítio cercado de animais), não acredita em Deus nem em nada que não seja material. Não deixa de ser memorável o discurso raivoso que ele pronuncia, perto do final do filme, sobre os inúmeros defeitos de Jeová no Antigo Testamento e a culpa da religião pelo atraso científico.

Essas duas visões extremas da vida em figuras tão distintas funcionam muito bem quando eles se conhecem e se apaixonam. No entanto, logo que o filme começa, já sabemos que os dois estão/estarão enfrentando uma barra pesadíssima, com a grave doença de sua filha de seis anos, Maybelle. O filme, com essa estrutura de idas e vindas no tempo, vai nos mostrando o mel e o fel do relacionamento. Como eles dizem no casamento: na saúde e na doença, na alegria e na tristeza. O problema é que passar pelo pior da vida com sobriedade não é para todos. E a doença da criança desestabiliza o relacionamento dos dois.

Entre uma situação e outra, vemos cenas belíssimas das apresentações do grupo de bluegrass de Didier, que fica ainda mais bonito quando Elise passa a fazer parte, com sua doce voz. Algumas cenas são particularmente tocantes, como a que eles cantam uma canção religiosa. Elise, com um ar de quem está se apegando cada vez mais à sua espiritualidade. Didier, por outro lado, só quer que a relação dos dois volte ao que era antes. E ao voltarmos frequentemente no tempo e ver a alegria e o entusiasmo, inclusive sensual, do início do relacionamento, não dá para não torcer pelos dois novamente.

ALABAMA MONROE é um filme em que temas grandes com o amor, a fé, a vida e a morte são explorados de maneira muito sensível. Algumas pessoas podem ficar incomodadas com o citado discurso antirreligioso de Didier, incentivado pelo veto do Presidente George W. Bush aos estudos em células-tronco, algo que poderia diminuir ou mesmo extirpar o câncer na medula óssea. E difícil não dar razão a Didier, mas o filme também não compra essa postura do personagem para si totalmente. É a junção dos dois pontos de vista que interessa.

Talvez falte ao filme mais momentos que equilibrem a tristeza. Mesmo as cenas em que os personagens estão felizes raramente arrancam sorrisos da plateia. Mas isso, obviamente, porque já sabemos de um futuro não muito feliz que os aguarda. O que não impede que o clima do filme não seja aceito com prazer pela audiência, que sai do cinema um tanto transtornada, depois de olhar por alguns minutos os créditos finais subindo, ao som de mais um belo bluegrass.

ALABAMA MONROE fez um sucesso incrível na Bélgica e sua trilha sonora foi mais vendida do que a trilha do TITANIC. As canções são todas interpretadas pelos próprios atores, o que só aumenta o nosso respeito por esse filme singular que está concorrendo ao Oscar de melhor filme estrangeiro.

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