quarta-feira, outubro 07, 2009

SALVE GERAL



O cinema de Sérgio Rezende quase sempre namorou a História. Nos anos 90, o diretor fez três filmes abordando diretamente personagens históricos - LAMARCA (1994), GUERRA DE CANUDOS (1997) e MAUÁ - O IMPERADOR E O REI (1999). Depois de dois trabalhos fugindo um pouco desse território, Rezende retornou à História com ZUZU ANGEL (2006), com a diferença de que, dessa vez, os acontecimentos históricos são pano de fundo para o drama de pessoas comuns em circunstâncias extraordinárias. ZUZU ANGEL é, talvez, o seu filme mais bem acabado. SALVE GERAL (2009) se assemelha ao trabalho anterior de Rezende em um aspecto que qualquer pessoa que viu os dois filmes facilmente percebe: ambos mostram a trajetória dolorosa de uma mãe tentando salvar a vida do filho. Quem me conhece sabe que eu sempre me comovo com histórias sobre mães. Enquanto tantos riam com as presepadas dos presos em CARANDIRU, eu chorava, pensando no sofrimento das mães e no amor incondicional aos filhos que entraram no mundo do crime e passaram a viver um inferno pessoal. Não é preciso ser mãe, portanto, para sentir empatia pelas personagens dos dois filmes.

Em SALVE GERAL, Andréa Beltrão é Lúcia, uma mulher na faixa dos quarenta que passa por problemas financeiros e se muda de uma casa num bairro privilegiado de São Paulo para a periferia. Ela é formada em advocacia, mas não excerce a profissão. Em vez disso, dá aulas de piano. Seu filho fica insatisfeito com a nova vida e dá uma de James Dean nas ruas. Acaba se metendo em uma encrenca grande quando um sujeito atira em seu amigo e ele, de posse de uma arma, acaba matando uma garota. A burrada o leva para uma prisão lotada e ele é transferido para uma penitenciária, graças a uma ação do PCC, o partido dos presidiários, que se mostra mais poderoso do se imaginava. Pensar que todo aquele caos que se instalou em São Paulo em maio de 2006 foi por causa de alguns prisioneiros que foram transferidos para outra penitenciária chega a ser difícil de acreditar. Mas por mais que o filme de Sérgio Rezende dê alguns passos em falso, depois de vê-lo, certas coisas tornam-se um pouco mais claras.

Não que tudo seja preto no branco. Na verdade, Rezende tem o cuidado para não pintar os líderes do PCC como vilões, seres essencialmente maus, mas como pessoas normais, capazes até de ganharem a simpatia do espectador, como o "professor", o prisioneiro intelectual que conquista o coração de Lúcia. Por outro lado, o personagem do filho, desde o começo não se mostra à altura do elenco mais experiente. Como Denise Weinberg, em sua excelente caracterização da "Ruiva", a mulher que apresenta Lúcia ao PCC e que a coloca em situações perigosas. Sua personagem é, do início ao fim, interessante, chegando a lembrar algumas vilãs de filmes noir americanos.

O aspecto de sujeira na imagem passa a impressão de que estamos vendo um filme brasileiro dos anos 80. Bem diferente do cuidado visual de ZUZU ANGEL. Será isso reflexo da crise do cinema brasileiro atual, de uma produção mais barata, ou foi decisão estética do diretor, a fim de captar melhor a crueza da situação e da ambientação? De todo modo, por falta de dinheiro ou por vontade própria, isso acabou contribuindo para o bom resultado do filme. Que também se beneficia com seu final. Em ZUZU ANGEL, gostei bastante da cena do acidente de carro, ao som de Chico Buarque. SALVE GERAL também traz uma conclusão bem diferente do que se esperaria de uma obra baseada num acontecimento histórico. É mais um ponto a favor para SALVE GERAL.

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