quinta-feira, junho 01, 2006

O JOELHO DE CLAIRE (Le Genou de Claire)



Não tinha contato com os filmes de Eric Rohmer desde 2004, quando tive o prazer de assistir no cinema a cinco filmes do diretor: os quatro "Contos das Estações" e A INGLESA E O DUQUE (2001). Por causa dessa maravilhosa experiência anterior na sala escura, acreditava que seus filmes perderiam muito se vistos em vídeo. E, de fato, perdem, mas nem tanto. Mesmo assim, fico imaginando como deve ser bom poder ver no cinema a cena-chave de O JOELHO DE CLAIRE (1970) - a tempestade, a tensão, as lágrimas, o joelho.

O JOELHO DE CLAIRE se assemelha um pouco com LIGAÇÕES PERIGOSAS em suas diversas versões. Como no romance de Laclos, os personagens de Jean-Claude Brialy (de UMA MULHER É UMA MULHER, de Godard) e Aurora Cornu são amigos que se divertem brincando com a vida e com os sentimentos dos mais jovens. Aurora propõe ao amigo que se envolva com a adolescente mais nova, Laura, para depois lhe contar o que rolou, a fim de que isso sirva como material para o seu romance - ela é escritora. A principal diferença entre os personagens rohmerianos e os maquiavélicos Visconde de Valmont e Marquesa de Merteuil é que os protagonistas do filme de Rohmer são mais humanos, menos autoconfiantes. O personagem de Brialy, inclusive, é tímido e nunca teve a sorte de desejar uma mulher e obter o seu objeto do desejo. Ele nunca teve a coragem de abordar uma mulher, sem ter certeza de que ela está interessada por ele. Por isso, acabei me identificando com ele, facilitando, assim, o meu envolvimento com o filme. O fato de Claire, a adolescente do título, ser bonita e ter belas pernas também ajuda ao espectador - principalmente se ele for homem - a se envolver e a se colocar um pouco no lugar do protagonista.

A estrutura de O JOELHO DE CLAIRE é bem peculiar, como se fosse dividido em capítulos bem curtos, sendo que cada capítulo é um dia das férias de Brialy. Como em CONTO DE OUTONO (1998), o gosto pela natureza é acentuado nas cenas em que os personagens colhem frutas e as saboreiam. Poucos filmes passam um prazer de viver tão grande quanto as obras de Rohmer. Uma coisa que me passou pela cabeça como uma possível falha do filme talvez esteja no fato de a personagem Laura, a adolescente mais nova, aparentar ser muito madura para sua idade. Mas como sei que as mulheres amadurecem de maneira precoce, melhor não subestimá-las. Talvez o que tenha me incomodado um pouco seja o fato de os personagens serem muito conscientes de suas falhas e desejos. Laura, por exemplo, diz que acredita que o seu interesse por homens mais velhos se deve ao fato de ela ter uma carência paterna. Mas esse "problema" é o de menos, e eu adoro esses filmes que trabalham com a psicologia dos personagens, vide os maravilhosos ANTES DO AMANHECER e ANTES DO PÔR-DO-SOL, do melhor dos herdeiros de Rohmer, Richard Linklater.

O JOELHO DE CLAIRE é o quinto filme da série de seis "Contos Morais". Os filmes dessa série mostram pessoas passando por crises morais e sofrendo as tentações da infidelidade. Os outros filmes da série são A PADEIRA DO BAIRRO (1962), A CARREIRA DE SUZANNE (1963), A COLECIONADORA (1967), MINHA NOITE COM ELA (1969) e AMOR À TARDE (1972). Espero ainda viver bastante para conferir essas pérolas.

Agradecimentos ao amigão Renato Doho, que fez a gentileza de me gravar esse filme, quando da exibição no canal TV5.

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