domingo, fevereiro 20, 2022

O BECO DO PESADELO (Nightmare Alley)



A minha relação com os filmes de Guillermo del Toro é muito particular. Tendo a gostar muito ou desgostar bastante. Tendo a ficar empolgado, especialmente com aqueles que exploram mais o terror ou a violência gráfica, ou a dormir de tédio. Até consigo fazer uma tabelinha com duas colunas separando os filmes que me fizeram dormir e aqueles que me deixaram ligado. Dito isso, O BECO DO PESADELO (2021) só me manteve acordado talvez por causa do café, mas acho que fiquei sonolento em alguns momentos. É por isso que eu adoro, por exemplo, A COLINA ESCARLATE (2015), um deslumbre visual e um banquete sangrento, que não costuma ser muito bem querido pela maior parte da crítica ou dos cinéfilos talvez por ser assumidamente over. Como del Toro é um cineasta mais feliz nos aspectos visuais do que nos enredos e em construções de personagens, O BECO DO PESADELO não me pareceu um projeto ideal para ele.

O BECO DO PESADELO é a segunda adaptação do livro O Beco das Ilusões Perdidas, de William Lindsay Gresham. A primeira foi O BECO DAS ALMAS PERDIDAS (1947), de Edmund Goulding, estrelada por Tyrone Powell. Esse filme, aliás, também já possuía alguns problemas de narrativa atabalhoada em sua conclusão, mas como tinha aquele jeitão de filme B, isso é muito mais fácil de relevar. Sem falar que há aquele dinamismo que é característico dos filmes noir do período. Já del Toro procurou encher o filme de um requinte visual que acaba comprometendo esse tipo de relação entre espectador e obra. Ou seja, olhamos para o filme querendo uma obra sofisticada em todos os sentidos.

E mais: del Toro não consegue fugir da conclusão apressada, ou com a sensação de que o corte final estaria faltando muitas cenas. E olha que ele fez um filme com uma duração 40 minutos maior que a de O BECO DAS ALMAS PERDIDAS. Não sei se o romance no qual os dois filmes se baseiam é difícil de ser adaptado, mas em diversos momentos O BECO DO PESADELO parece ser uma obra toda errada, como quando utiliza uma música não condizente com o momento da cena, ou na escolha de um Bradley Cooper inexpressivo para interpretar justamente alguém que engana as pessoas.

Aliás, todos os personagens do filme parecem meio mortos. Se essa é a intenção, talvez o diretor tenha conseguido alguma coisa. Algumas escolhas são acertadas (comparando com o filme de 1947). Por exemplo, a última cena achei muito boa. Foi a hora certa de terminar e teria passado um sentimento de extremo desencanto com a vida se o filme tivesse conseguido manter esse tipo de pesar contaminando a audiência desde o começo.

Na trama, Bradley Cooper é um homem que chega para trabalhar em um circo e, com sua ambição e talento, passa a aprender a técnica da “adivinhação” usada nesses espetáculos. Com o sucesso, e após casar com uma moça de lá (Rooney Mara), ele passa a fazer suas apresentações em hotéis chiques e a se envolver com pessoas da alta sociedade, entre elas uma psiquiatra tão esperta quanto ele, vivida por Cate Blanchett, que aparece com um visual tão “boneca de porcelana” quanto em NÃO OLHE PARA CIMA.

É curioso como o filme acaba deixando de lado um monte de atores excelentes pelo caminho, como Willem Dafoe, Toni Collette, David Strathairn, Richard Jenkins e o próprio ator-fetiche de del Toro, Ron Pearlman. Quem mandou fazer filme luxuoso demais, não é? Na verdade, não sei o quanto o Oscar que del Toro recebeu por A FORMA DA ÁGUA (2017) foi prejudicial ou não para sua carreira. 

O BECO DO PESADELO recebeu quatro indicações ao Oscar, incluindo melhor filme, direção de arte, figurino e fotografia.

+ DOIS FILMES

MORTE NO NILO (Death on the Nile)

Acho que aquela teoria que se aplicava a Paul McCartney, sobre ele estar morto e ter sido substituído por um sósia etc., podia se aplicar a Kenneth Branagh. Não consigo acreditar que o atual Branagh seja o mesmo de seus trabalhos iniciais, como HENRIQUE V (1989), VOLTAR A MORRER (1991), MUITO BARULHO POR NADA (1993) e HAMLET (1996). Ou então eu fui enganado e ele nunca foi mesmo um grande diretor. O que vemos em MORTE NO NILO (2022) é uma produção classe A com qualidade de teatrinho de escola. Todos os personagens são ridículos. Não sei se é para levar a sério ou se é para ser mesmo algo feito para se pensar como uma comédia. Do elenco, acho que gosto apenas de Emma Mackey, que os sortudos que veem a série SEX EDUCATION devem conhecer. A moça tem um carisma e uma expressividade que a destacam, por mais que a trama a deixe em segundo plano em vários momentos. Além do mais, como não sou muito fã desses whudunits mais clássicos, se não tiver algo diferente, não me interessa muito. Mas há uma cena que muito me surpreendeu pelo tempero erótico, a cena da "serpente do Egito", com Gal Gadot e Armie Hammer. :o

MOONFALL - AMEAÇA LUNAR (Moonfall)

Uma das coisas que mais me deixa indignado em superprodução ruim é a quantidade de dinheiro jogado fora. Sei que isso é até bastante comum e faz parte do jogo de Hollywood, mas no caso deste MOONFALL – AMEAÇA LUNAR (2022) até naquilo que poderia se esperar de bom, que são os efeitos visuais, é tudo muito desleixado. E aí temos a história, que nas mãos de um diretor bacana, até poderia render algo interessante, mas infelizmente Roland Emmerich, que nem sei se um dia já foi um bom diretor, certamente desistiu aqui de se esforçar. Na trama, a lua começa a sair do eixo e um casal de astronautas volta para uma missão para salvar o planeta, junto com um cara que se fazia de doutor. Há quem vá se divertir com essa tranqueira, mas não foi o meu caso, infelizmente.

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