domingo, outubro 31, 2021

SEIS FILMES VISTOS NA 45ª MOSTRA INTERNACIONAL DE CINEMA DE SÃO PAULO



Como neste ano tive bem menos tempo para ver os filmes da Mostra e também para escrever sobre eles, o que me deixa um pouco triste, vou optar nesta postagem por textos curtinhos sobre eles. Ainda pretendo ver mais algumas coisas da programação nos próximas dias, mas é bom eu dar uma dinamizada neste espaço.

HIGIENE SOCIAL (Hygiène Sociale)

O único filme que havia visto de Denis Côté era ANTOLOGIA DA CIDADE FANTASMA (2019). Despreparado com o tipo de cinema que ele faz, não foi uma sessão das mais prazerosas. Em HIGIENE SOCIAL (2021), ele já entrega o jogo, o seu hermetismo, logo de cara. Você aceita e vê (com prazer ou não) se quiser. Na primeira cena, temos um longo diálogo entre um trapaceiro e sua irmã. Os dois conversam como se estivessem em um teatro, sempre distantes um do outro - eis um filme que respeita mesmo o distanciamento social. E é a partir dessa primeira conversa que vamos também conhecendo um pouco mais do protagonista. Depois da longa cena com câmera parada, sem direito a close-ups, outra virá, depois outra, com personagens diferentes, excetuando o protagonista. Gosto do uso do anacronismo, de como se fala de cinema, de internet e de notebook, enquanto as imagens parecem de séculos passados, graças principalmente aos figurinos das mulheres. Embora a experiência não seja fácil, de vez em quando nos pegamos impressionados com a sabedoria que sai da boca de alguns personagens, além da beleza plástica que é criada principalmente a partir da natureza.

LUZ NATURAL (Természetes Fény)

Ao que parece a Hungria ainda tem muito o que remoer de seu passado na Segunda Guerra, quando se aliou aos nazistas. E o cinema tem servido, eventualmente, para tratar desse tipo de relação. Em LUZ NATURAL (2021), o diretor Dénes Nagy, vindo principalmente de documentários, faz um filme seco, duro, lento e pesado sobre um grupo de soldados húngaros que tem o objetivo de espionar grupos partidários existentes em uma região rural da União Soviética ocupada. O protagonista tem um aspecto de quem está naquela guerra tentando ao máximo agir sem violência. Ele até simpatiza com aquele povo que mal tem o que comer. Há uma situação triste em que um rapaz tenta roubar as batatas de uma senhora e é humilhado pelo grupo de soldados. Destaque para a fotografia, com preferência pela penumbra, o que acentua o tom de tristeza e quase apatia. Prêmio de direção em Berlim-2021.

CAPITÃES DE ZAATARI (Captains of Za'atari)

É curioso como CAPITÃES DE ZAATARI (2021), de Ali El Arabi, é categorizado como documentário, mas tem toda uma estrutura de ficção. Principalmente no que há de mais importante: a trajetória dos dois rapazes, melhores amigos, que são refugiados sírios na Jordânia e sonham em se tornar jogadores profissionais de futebol. A oportunidade aparece na visita de um homem ao acampamento. Há participações de alguns craques do futebol mundial, ainda que de relance. A mensagem é positiva e traz um olhar para os refugiados e é interessante o contraste entre o espaço em que eles "moram" no acampamento e o vasto mundo que eles têm a oportunidade de conhecer, com o torneio internacional, no Egito.

LISTEN

Desses filmes que começam e terminam bem, do ponto de vista dramático. Quando vi a última imagem, já imaginei que aquele seria o momento ideal para acabar o filme, depois de me sentir quase tão dilacerado quanto a família da história. LISTEN (2020), de Ana Rocha de Sousa, tentou a indicação ao Oscar de filme internacional, mas não conseguiu pelo fato de a maior parte de seus diálogos ser em inglês. Conta a história de uma família portuguesa em Londres passando por dificuldades financeiras e recebendo visitas perigosas da assistência social. Adoro os dizeres do cartaz português, altamente dramático, e que tem tudo a ver com o espírito do filme: "quando não se tem nada e ainda nos levam tudo". Dizendo assim, até pode parecer excessivo nas emoções, mas é de certa maneira contido, o que não quer dizer que não possa levar às lágrimas. Os atores adultos estão ótimos, assim como a garotinha surda. Um dos pontos altos: a cena no tribunal. Se o filme fosse realizado em Hollywood seria um sucesso e tanto.

SANGUESSUGAS - UMA COMÉDIA MARXISTA SOBRE VAMPIROS (Blutsauger)

Logo de início chama a atenção a beleza das cores, mas também a discussão sobre algo que Marx disse em O Capital a respeito do capitalismo, de ser um vampiro. Em seguida, mas de maneira muito sutil, os personagens principais são apresentados: o russo que foge da União Soviética (a história se passa em 1928) e vai parar na Alemanha e se apaixona por uma vampira, que por sua vez tem um servo, que é apaixonado por ela e que não desconfia da chefe ser um sanguessuga. O problema é que SANGUESSUGAS - UMA COMÉDIA MARXISTA SOBRE VAMPIROS (2021), de Julian Radlmaier, se arrasta de tal maneira em sua narrativa que as duas horas de duração parecem quatro. E por mais que as imagens, de vez em quando chamem a atenção pela beleza plástica, isso não é suficiente. Assim como não são suficientes as discussões entre membros da burguesia alemã sobre coisas que já antecipam o pensamento nazista. Quanto ao amor, que é também um tema do filme, ele fica muito para trás.

O ATLAS DOS PÁSSAROS (Atlas Ptáku)

Belo conto moral que brinca com algumas frases um tanto óbvias da realidade, mas que às vezes precisam ser relembradas, como "a maior riqueza é a saúde etc.". Em O ATLAS DOS PÁSSAROS (2021), de Olmo Omerzu, um velho empresário tem um infarto e depois descobre que boa parte da fortuna de sua empresa está sendo saqueada por uma amante (ou ex-amante) e secretária. O filme poderia tratar do caso mais sensacionalista da trama, que é a curiosa relação da tal empregada com um outro homem, mas faz isso de maneira até discreta, e sem se estender muito no assunto. A questão da família (e do dinheiro) é que ganha mais foco pelo diretor neste seu quarto longa-metragem.

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