domingo, outubro 04, 2015
TRÊS CLÁSSICOS DO CINEMA BRASILEIRO
De vez em quando surgem oportunidades de ouro de vermos certos filmes clássicos em cópias decentes no cinema, seja em 35 mm, seja em DCP. Os três títulos abaixo foram vistos em diferentes momentos de diferentes mostras no Cinema do Dragão, e o meu sentimento de agradecimento pelos curadores por terem trazido essas obras é grande. Falemos um pouco sobre cada um deles.
O BEIJO DA MULHER ARANHA (Kiss of the Spider Woman)
A repercussão de PIXOTE – A LEI DO MAIS FRACO (1981) chamou a atenção dos americanos para Hector Babenco, que acabou por fazer três produções americanas, a começar por O BEIJO DA MULHER ARANHA (1985, foto), coproduzido com o Brasil e que traz em seu elenco, além de Sônia Braga no papel-título, um grande elenco de apoio de rostos conhecidos do cinema e da televisão brasileiros. O BEIJO DA MULHER ARANHA é um filme que traz bastante da estética suja de PIXOTE, principalmente quando se passa dentro da cela em que dois homens, um deles gay, vivido por William Hurt, passam a estabelecer uma relação de amizade. Há todo um contexto político, muito bem-vindo naquele momento de redemocratização brasileira e Raul Júlia e Hurt se entregam aos seus papéis muito bem. As origens literárias da obra se tornam evidentes nos momentos em que Hurt procura contar história fictícias para ambos passarem o tempo. É também um filme sobre confiar no outro em um momento especialmente difícil para presos políticos ou perseguidos pela ditadura.
O GRANDE MOMENTO
Provavelmente uma das comédias mais divertidas e mais interessantes do cinema brasileiro, O GRANDE MOMENTO (1958), de Roberto Santos, não faz parte nem do período das chanchadas, que estava moribundo, nem do Cinema Novo, que estava nascendo. Trata-se de um objeto diferente, ainda que se visto hoje possa ser encarado como uma produção de narrativa convencional. Na trama, passada na periferia de São Paulo, o jovem Gianfrancesco Guarnieri é um rapaz que vive problemas financeiros na hora de casar, tendo que vender a bicicleta, por exemplo, para pagar o aluguel do terno para o casório. E ainda precisa pagar o fotógrafo, a florista, as bebidas para a festa etc. E ainda precisa de dinheiro para a lua-de-mel. É toda uma lógica de tentar mostrar que está tudo bem em uma situação de falta de dinheiro, que ainda impera nos dias de hoje. O que não impede que o filme seja cheio de momentos engraçadíssimos e situações que divertem até hoje. O GRANDE MOMENTO segue sendo um grande filme e ainda fala às novas audiências, passados todos esses anos.
VERA
Visto mais recentemente, VERA (1986), de Sérgio Toledo, foi exibido no 9º For Rainbow – Festival de Cinema e Cultura da Diversidade Sexual. A escolha do título, pela organização do evento, foi muito feliz, tanto para aqueles que acompanham o festival pelo interesse na temática ou como exercício de cidadania, como para cinéfilos que valorizam um trabalho que até hoje é respeitado. VERA é um dos melhores filmes de sua época e é uma pena que Toledo tenha se aposentado do cinema. A história é baseada na vida de Anderson Herzer, transexual e poeta que passou a infância na Febem e foi protegido por Eduardo Suplicy, que, sensibilizado por seu talento artístico e sua condição, resolveu arranjar emprego para ele. No filme, os nomes são mudados e a personagem principal se chama Vera, embora prefira que a/o chamem de um nome masculino, Bauer. O papel rendeu a Ana Beatriz Nogueira o prêmio de melhor atriz no Festival de Berlim de 1987. A narrativa alterna cenas dos momentos em que Vera vive na Febem e em momentos que ela tenta, muito timidamente, contato com a sociedade preconceituosa que foi apresentada pelo personagem de Raul Cortez. Gosto do filme inteiro, mas gosto especialmente das cenas de intimidade de Vera com uma moça negra por quem ela se apaixona. O drama de rejeitar o próprio corpo feminino também sensibiliza a plateia.
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