quarta-feira, janeiro 14, 2009

LOS HERMANOS NA FUNDIÇÃO PROGRESSO - 9 DE JUNHO DE 2007





















Parece que foi ontem quando levei pra casa o primeiro disco dos Los Hermanos. Na época, o segundo álbum, Bloco do Eu Sozinho, já havia sido lançado, mas resolvi começar pelo disco original. Duas das minhas irmãs estavam em casa, justo as que se tornaram fãs da banda imediatamente, assim como eu. Assim que cheguei, botei logo o disco no player. E a gente ouviu o cd de cabo a rabo, com atenção, emoção e maravilhamento. A primeira faixa, "Tenha dó", iniciada com um triste solo de metal, antes de as guitarras hardcore e ska entrarem com força e o vocal de Marcelo Camelo, flertando com o romantismo exacerbado e com a dor de cotovelo, me conquistou de imediato. A segunda faixa, "Descoberta", era outra canção de desilusão amorosa. E segue a famosa "Anna Julia", que na época já era hit, mas é dessas canções perfeitas e mágicas que mesmo tocada tantas e tantas vezes nunca consegui enjoar. Cada vez gosto mais dessa canção. O fato de a banda passar um tempo sem tocá-la nos shows, talvez por recusarem o sucesso fácil e preferirem sempre desafios, tornou a rara audição ao vivo da canção festejada pelos fãs, embora a decisão da banda de não tocá-la tenha sido sempre respeitada.

Poucos meses depois, após ter ouvido bastante o primeiro disco, trouxe o elogiado mas pouco vendido Bloco do Eu Sozinho. Que foi igualmente ouvido por mim e minhas duas irmãs. Coincidência ou não a audição foi coletiva nesse disco. Confesso que chorei na primeira audição de duas faixas: "Veja bem, meu bem" e "Mais uma canção", que tem sua base tocada no trombone. A utilização cada vez mais sofisticada dos metais e de arranjos mais elaborados fez com que o disco se tornasse um divisor de águas para a banda. Foi também a partir desse disco que Rodrigo Amarante começou a obter mais destaque nos álbuns. Se no primeiro disco ele contribuía apenas com duas faixas, entre elas a excelente "Quem sabe", no segundo, ele mostrava ainda mais o seu lado sensível com a bela "Sentimental". Apesar do tom de fossa enfatizado, havia também espaço para "cabecismos" como "Cadê teu suin-?" e "Cher Antoine". Depois desse disco, passei a procurar na internet canções inéditas, covers tocadas em shows e versões demo. Destaque para "À palo seco", do Belchior, "Vou tirar você desse lugar", do Odair José, e "Esquadros", da Adriana Calcanhoto. Era algo parecido com a minha relação com os Smashing Pumpkins, outra banda que me despertava sede por novas canções e me fazia buscar raridades na internet.

Com o sucesso e a repercussão do mais redondo Ventura, o terceiro disco, os shows da banda em Fortaleza passaram a se tornar cada vez mais cheios de fãs fervorosos, que cantavam todas as faixas a plenos pulmões e com uma sinceridade no coração e gestos de dramaticidade raramente vistos em outros shows. Talvez o fenômeno de adoração e emoção nos shows da banda só seja comparado no Brasil com o que aconteceu com a Legião Urbana, guardadas as devidas proporções, e levando-se em consideração que a Legião era uma banda que tinha muito mais hits radiofônicos, enquanto que Los Hermanos não era uma banda tão popular assim. O rádio, já nos anos 90, deixava de ter fundamental importância para o sucesso comercial de uma banda. No disco Ventura, Rodrigo Amarante já demonstrava os seus questionamentos espirituais, suas preocupações com a vida e a morte e temas como a reencarnação e a morte do ego eram sutilmente desenvolvidos em suas letras. Também havia espaço para que tanto ele quanto Camelo pudessem se outrar, como seu ídolo Chico Buarque. Camelo canta como uma mulher corneada pelo homem no delicioso bolero "A Outra" e Amarante canta um diálogo envolvendo uma complicada relação entre pai e filho em "Um par". Os compositores mostravam que tinham talento suficiente para compor até mesmo estando felizes e podiam tratar de assuntos um pouco mais distantes de seus próprios umbigos.

A crise e o novo rumo tomado pela banda, que geraria o seu fim, ou o recesso, como os fãs mais otimistas querem acreditar, veio com o álbum 4, que acentuava uma falta de unidade nas composições de Camelo e Amarante que já se mostrava em Ventura. Assim como já tínhamos visto com os Beatles, é realmente complicado quando dois artistas muito talentosos estão numa mesma banda, rivalizando nas composições. Se por um lado, Amarante mostrava uma veia mais rock, Camelo não abria mão de se aproximar cada vez mais da MPB, abrindo o álbum com uma composição sombria e lenta como "Dois barcos". Ainda assim, trata-se de um disco fantástico, ainda que um pouco mais difícil que os anteriores, exigindo audições a mais para uma melhor assimilação.

E foi com esse histórico que a banda resolveu se dispersar, fazendo shows memoráveis de despedida em 2007. O show apresentado na Fundição Progresso, no Rio de Janeiro, flagra os músicos completamente emocionados. Era um misto de tristeza e celebração. Afinal, a banda estava se despedindo em seu auge criativo. O álbum 4 pode ter afastado alguns fãs, mas o surgimento de novos parecia crescer ainda mais a julgar pelos shows. Talvez a banda não estivesse preparada para tanta fama. A certa altura, um deles, não lembro se Camelo ou Amarante, comenta assustado: "Quanta gente!". E o show está perfeito. Recebi o DVD nessa semana e coloquei-o no player apenas para conferir as primeiras faixas e ir vendo as demais aos poucos, noutro dia, mas não imaginava que estava como um viciado em abstinência e não consegui desgrudar os olhos da tela, nem parar de cantar junto as canções ou descer para comer alguma coisa. Transformei o meu quarto numa festa na segunda-feira à noite. Eles tocam faixas de todos os discos, inclusive várias do primeiro, o que muito me agradou. Rolou até "Anna Julia", no bis, a linda "Último romance", e a penúltima música do show, "Todo carnaval tem seu fim", parecia sintetizar a situação: "É o fim, é o fim", cantava emocionado Camelo. Sinto que vou ver/ouvir ainda esse registro emocionado várias vezes.

As faixas do DVD: 1. Dois Barcos; 2. Primeiro Andar; 3. O Vento; 4. Além do que Se Vê; 5. Morena; 6. Retrato Pra Iaiá; 7. O Vencedor; 8. Condicional; 9. Tenha Dó; 10. Adeus Você; 11. Último Romance; 12. Um Par; 13. Lágrimas Sofridas; 14. Sentimental; 15. Conversa de Botas Batidas; 16. Deixa o Verão; 17. A Outra; 18. Casa Pré-Fabricada;19. Paquetá; 20. Cara Estranho; 21. A Flor; 22. Tá Bom; 23. Anna Júlia; 24. Quem Sabe; 25. Todo Carnaval Tem Seu Fim; 26. Pierrot. Extras: 27. Azedume; 28. O Velho e o Moço; 29. Descoberta; 30. De Onde Vem a Calma; 31. Pois É.

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