segunda-feira, novembro 01, 2021

DUNA (Dune)



Tenho uma lembrança nebulosa de quando DUNA, a versão de 1984 dirigida por David Lynch, foi exibida na televisão. Foi em julho de 1989 e eu trabalhava no setor de compensação do Banco do Nordeste. Se não me engano foi em uma semana em que estrearam vários outros filmes atraentes na Rede Globo e eu ficava animado por essas possibilidades de ver coisas diferentes em um tempo em que nem videocassete eu tinha ainda. E acredito que foi em um momento em que nem era fã do Lynch também. E embora eu tenha achado confuso pra caramba essa produção complicada, achei linda a fotografia de Freddie Francis e o filme em si um bocado charmoso. Anos depois tive a oportunidade de rever em DVD e vi que se tratava mesmo de um filme complicado. Muito disso por causa dos produtores, que cortaram muita coisa do que foi filmado e a trama ficou bem pouco inteligível para quem não leu o romance de Frank Herbert.

Ao que parece, a única pessoa que ficou feliz com o fracasso da adaptação cinematográfica de Duna foi Alejandro Jodorowsky, que levou anos tentando montar uma super-equipe para, ele mesmo, fazer a adaptação, mas que, infelizmente, não deu certo. Isso pode ser visto no ótimo documentário JODOROWSKY’S DUNE, de Frank Pavich.

E eis que Dennis Villeneuve abraça o projeto de levar Duna para as telas de forma mais bem-sucedida. Como ele já vinha de duas sci-fies muito boas, A CHEGADA (2016) e BLADE RUNNER 2049 (2017), o nome do diretor foi facilmente aceito. Levando em consideração o tom cada vez mais solene e sério de seus filmes, seriedade, em todos os sentidos, é o que se esperaria de uma adaptação do clássico romance de Herbert. 

E DUNA (2021) é apenas a primeira parte. Isso fica claro logo no começo dos créditos. Sem ter certeza se o estúdio aprovaria a continuação, ele fez a aposta arriscada em um filme de duas horas e meia que conta metade da trama. Nada mais justo para um romance tão complexo e que necessitaria de tempo para dar conta das explicações acerca das particularidades daquele universo.

Villeneuve descobriu o livro na adolescência e sonhou em adaptá-lo por muitos anos, a ponto de se tornar uma espécie de projeto para sua vida. Quando conseguiu terminar a produção, veio a pandemia e a dificuldade de obter uma bilheteria boa o bastante parecia complicada. 

A trama lida com imperialismo, colonialismo, magia e vermes gigantes em um planeta altamente inóspito chamado Arrakis que detém o bem mais precioso do universo, a especiaria. Faz lembrar, de propósito, a época das grandes navegações, nos séculos XIV e XV. Em Arrakis, só é possível viver graças a um tipo de tecnologia que permite que a água do corpo seja reaproveitada e consumida de modo que as pessoas não morram desidratadas. Não à toa, ser capturado e assassinado para ter o sangue consumido é claramente uma possibilidade.

O andamento lento e paciente que Villeneuve adota é perfeitamente necessário, portanto, não apenas para que conheçamos detalhes desse universo, mas para que também possamos conhecer um pouco melhor os nossos heróis. Timothée Chalamet vive Paul Altreides, o jovem sucessor do Duque Leto Altreides (Oscar Isaac) e de uma mulher cheia de conhecimentos de magia, Lady Jessica, vivida de maneira brilhante por Rebecca Ferguson. Aliás, digo, sem dúvida nenhuma, que Lady Jessica é minha personagem favorita e que Ferguson nunca esteve tão bem, seja de beleza, quanto de interpretação.

Quanto a Chalamet, seu físico franzino funciona bem para o papel, dando um tipo de fragilidade que parece necessária para alguém que vai se aventurar em um planeta como esse com sua família. Na primeira hora de duração, vemos seus treinamentos com o chefe dos soldados do Duque, vivido por Josh Brolin, junto com um tipo de tecnologia que protege o corpo com um escudo de força invisível, e vemos também seu treinamento mental com a mãe. Ele, assim como ela, é dotado de uma força psíquica. Mais à frente, ambos os treinamentos serão necessários para a sobrevivência de mãe e filho.

Quanto aos coadjuvantes, Zendaya aparece muito pouco, mas sua presença é como um fantasma, como uma espécie de espírito atraente e também perigoso para o jovem Paul. Mas quem chama a atenção logo de cara é Javier Bardem, muito provavelmente o ator mais versátil de sua geração. Sua presença de cena no momento que ele se apresenta para o Duque Leto é impressionante. Tanto Zendaya quanto Bardem estarão mais presentes na segunda parte de DUNA. Ou seja, a segunda parte tem tudo para ser tão boa ou melhor que a primeira. Outros coadjuvantes de peso no filme são vividos por Dave Bautista, Jason Mamoa, Stellan Skarsgård, Chang Chen e Charlotte Rampling. Um elenco impressionante.

Algo que chama muito a atenção em DUNA é o quanto ele possui imagens escuras. Isso pode incomodar a muitos, mas me pareceu bastante interessante. Por isso é importante escolher uma excelente sala de cinema de sua cidade (se for uma IMAX, melhor ainda) para aproveitar a grandiosidade épica do filme. E é bom também já ir preparado para uma narrativa mais lenta e não algo frenético como MAD MAX – ESTRADA DA FÚRIA, para citar outro grande filme que se passa em um deserto. Villeneuve opta pelo tom solene, pela tensão de quem chega em um planeta muito perigoso. Se lembrarmos do tipo de tensão que Villeneuve usou em filmes tão distintos quanto OS SUSPEITOS (2013) e SICARIO – TERRA DE NINGUÉM (2015), podemos ficar tranquilos: DUNA está em boas mãos.

+ DOIS FILMES

ESPÍRITOS OBSCUROS (Antlers)

Certamente se o próprio Guillermo Del Toro tivesse dirigido ESPÍRITOS OBSCUROS (2021) o resultado seria bem mais interessante. Scott Cooper não tinha nenhuma intimidade com o gênero horror até então, o que não quer dizer que não funcionasse em sua primeira vez, mas me parece que seria necessário maior domínio da atmosfera para que o filme funcionasse e não parecesse um horror genérico, por mais que haja algo de diferente no enredo, principalmente quando se aproxima da conclusão. Na trama, professora percebe um comportamento estranho em uma criança, ao mesmo tempo que terríveis assassinatos começam a aparecer na cidadezinha. O filme desde o começo flerta com a mitologia, como forma de fazer um link com o monstro, mas achei o resultado final fraco. Digo uma coisa, porém: sou a favor de passarem o filme nas escolas para mostrar o que uma professora é capaz de enfrentar.

HALLOWEEN KILLS - O TERROR CONTINUA (Halloween Kills)

David Gordon Green erra a mão nesta sequência, depois de ter feito um trabalho muito bom anteriormente. A intenção de fazer o capítulo mais sangrento, mais violento e com mais mortes de todos acaba fazendo com que a violência seja banalizada e as cenas de mortes sejam vistas com tédio. Em nenhum momento de HALLOWEEN KILLS - O TERROR CONTINUA (2021) nos preocupamos minimamente com os personagens e isso é um problema em se tratando desse tipo de filme - por mais que o subgênero já esteja desgastado, ainda é possível reinventar. O lado positivo do filme é o quanto ele também funciona melhor como uma história sobre as pessoas da cidade de Haddonfield. Tanto que vários personagens ainda crianças no filme de 1978 são trazidos de volta neste novo. Há também uma tentativa de trazer um pouco da ingenuidade do mito do bicho-papão, presente no original de Carpenter, mas nem sempre de maneira bem-sucedida. No mais, que final bagunçado e torto foi esse, hein? Parece que Gordon Green entregou para o estagiário terminar e foi embora.

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