sexta-feira, setembro 20, 2019

O FIM DA VIAGEM, O COMEÇO DE TUDO (Tabi no Owari Sekai no Hajimari)

Considerado por muitos um dos maiores cineastas de cinema de horror da atualidade, Kiyoshi Kurosawa tem, com frequência, demonstrado interesse em variar. Basta lembrar que um de seus mais recentes trabalhos, PARA O OUTRO LADO (2015), por mais que adentre o terreno do espiritual, não opta pelo medo como fator principal, é sobre um grande amor que retorna da morte, tudo de maneira muito serena. O FIM DA VIAGEM, O COMEÇO DE TUDO (2019), seu mais recente filme, exibido no Festival de Locarno, é de uma delicadeza impressionante. É, desde já, um dos melhores lançamentos deste ano.

O filme nos apresenta a uma repórter de um programa de variedades do Japão que está com sua equipe no Uzbequistão para gravar a história de um lendário peixe de dois metros de comprimento que habita, supostamente, um lago. Como não conseguem gravar o tal peixe, a equipe procura alguma coisa que possa ser interessante para o tal programa. Enquanto passa esse tempo em território estrangeiro, a protagonista de nome Yoko procura conhecer os pontos turísticos do lugar, ao mesmo tempo que lida com a solidão e o sentimento de saudade do namorado e uma forte insegurança também, tendo em vista que em determinado momento ele deixa de retornar suas mensagens.

Yoko é protagonizada por Atsuko Maeda, em terceira colaboração com Kurosawa. A primeira foi, inclusive, em outro filme ambientado fora do Japão, com ela como protagonista. Trata-se de O SÉTIMO CÓDIGO (2013). Outra informação muito interessante sobre Atsuko é que ela é uma cantora famosa no Japão, uma cantora que se tornou atriz, e que em O FIM DA VIAGEM.. canta em duas lindas cenas. Ela canta uma versão em japonês de "Hino ao Amor" nas duas cenas, mas o sentido da canção muda de acordo com o que acontece na vida da personagem e com o fluxo de seus sentimentos.

Impressionante como o filme nos faz próximos de Yoko. Sentimos medo quando ela sente medo; sentimos solidão quando ela se sente só; sentimos o seu mal estar diante do trabalho quando ela assim se sente; o sentimento de não pertencimento etc. Só por isso o filme já é louvável. Por isso o diretor não economiza elogios a Atsuko, que consegue passar aquilo que sente estando sozinha em cena. E há muitas cenas em que ela está sozinha naquele país estrangeiro e estranho.

Há uma cena especialmente tocante: ela tem a ideia de rodar uma matéria sobre um bode que está preso em uma casa e ela deseja libertar o animal. Como a equipe compra a ideia, eles vão em busca de realizar esta ação. E as cenas de Yoko com o bode e o reencontro são tão cheias de ternura que só aumentam ainda mais o grau de quase inocência que a personagem transmite. De vez em quando personagens assim fazem bem para nosso espírito. E por isso filmes assim são tão valiosos.

+ TRÊS FILMES

RETRATO DO AMOR (Photograph)

Uma baita decepção este novo trabalho de Ritesh Batra, depois do lindo LUNCHBOX e do muito bom NOSSAS NOITES. Aqui a história de amor parece não funcionar em momento algum. Faltam tanto ao rapaz quanto à moça carisma e também química entre os dois. Talvez o excesso de "sutileza" tenha resultado em algo quase nulo. A trama fica tão morna que nem mesmo cheguei a torcer pelos dois. O filme não traz tanto do habitual caos nas ruas tão comuns nos filmes indianos. É mais focado na relação entre os dois e na mentira que criam para a avó do sujeito. Se bem que não deixa de ser um diferencial ver um personagem homem e heterossexual sofrendo a pressão de ter que casar. Geralmente só vemos isso em personagens femininas. Ano: 2019.

VISION

É o tipo de filme que a gente quer gostar, que contém cenas muito bonitas e um enredo complicado e que é meio que a cara de filmes japoneses de ficção científica e de alguns animes cabeça, mas que se revela um problema ao final da projeção. Naomi Kawase parece desde o começo puxar um sentimentalismo através de imagens (as lágrimas da personagem de Juliette Binoche ao presenciar o espaço geográfico milenar japonês), mas que precisa de uma maior conexão com o espectador para que se efetive. Gosto das duas cenas discretas de sexo, mas isso é mérito principalmente da beleza e da sensualidade de Binoche. É algo que já estamos acostumados a ver em filmes franceses. No final, a tal erva vision me pareceu bem pouco compreensível. Mas como eu acho que cinema é mais para sentir do que para entender, nem foi esse o problema. Ano: 2018.

BANGLA

E, ao que parece, nasce um novo talento das comédias românticas. O jovem Phaim Bhuiyan dirige e protagoniza esta história de amor sobre um jovem bengali que se apaixona por uma italiana. Como sua religião não permite sexo antes do casamento, isso começa a perturbá-lo, e muito. Um dos méritos do filme é nos fazer torcer pelo romance dos dois, entender os obstáculos, se apaixonar pela moça (que adorável que é Carlotta Antonelli!) e saber que toda grande história de amor traz obstáculos para que a tensão se estabeleça e a união seja possível. Saí do cinema leve. Se a vida real não está sendo tão gentil, às vezes é o cinema que traz um desses sonhos materializados. Ou quase. Ano: 2019.

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