sexta-feira, dezembro 29, 2017

RODA GIGANTE (Wonder Wheel)

A década de 2010 não começou muito promissora para Woody Allen. Seu filme daquele ano, VOCÊ VAI CONHECER O HOMEM DOS SEUS SONHOS (2010), é uma de suas obras mais apagadas e esquecíveis. Mas eis que ao menos dois títulos costumam ser lembrados como dois dos melhores de sua fase recente, MEIA-NOITE EM PARIS (2011) e BLUE JASMINE (2013), embora seja digno de nota seu filme mais romântico em muitos anos, um dos poucos que seguem uma linha mais alto astral, fugindo do amargo da vida: MAGIA AO LUAR (2014).

Mas é com BLUE JASMINE que o novo filme, RODA GIGANTE (2017), dialoga melhor dentro do corpo de sua obra, tanto pelo teor amargo quanto pelo texto, que valoriza suas protagonistas. Trata-se de um filme que namora o teatro não apenas na dramaturgia, mas também nas próprias citações (Eugene O'Neill, Shakespeare, Tchekov, a tragédia grega etc.).

Porém, por mais que o texto esteja em um dos primeiros planos, há a fotografia deslumbrante de Vittorio Storaro, que explora lindamente a luz. A luz do parque de diversões que ilumina o quarto de Ginny (Kate Winslet), a luz do sol que traz um tom alaranjado para a Coney Island dos anos 1950, e até mesmo as luzes mais diáfanas, como as luzes da noite, como em uma cena em que Ginny está com o amante (Justin Timberlake) à luz das estrelas e da lua e em certo momento a luz diminui. São pequenos detalhes que valem ser percebidos em apreciações seguintes do filme.

Quanto à Kate Winslet, ela está fantástica. É uma de suas melhores atuações e só não deve ser lembrada nas premiações por ocasião da atual caça às bruxas, que não está sendo um bom negócio para Woody Allen e quem quer que esteja envolvido com ele. De todo modo, independente de premiações, o que conta mesmo é o impacto de seu desempenho como uma garçonete infeliz no casamento que encontra na figura de um rapaz mais jovem que ela, um salva-vidas, a razão para voltar a ter esperança no futuro.

Acontece que o rapaz, Mickey, não entra na relação com tanto ímpeto quanto ela. Para ele, trata-se mais de uma relação que é curtida sem necessariamente ter um comprometimento. As coisas ficam ainda mais turvas para Mickey quando ele passa a ficar interessado na enteada de Ginny, a jovem Carolina (Juno Temple), que vai para Coney Island fugida dos mafiosos. Ela havia casado, para desgosto do pai (Jim Belushi), com um mafioso perigoso. Mickey, por sua vez, considera a história de vida de Carolina muito interessante. Ela viveu a vida intensamente, mesmo sendo tão jovem, segundo ele. Sua visão é de alguém que vê a vida como uma peça, ou como algo próximo de uma encenação. Pena o filme não aprofundar mais essas questões, mas no começo, em diálogo com Ginny, ele fala sobre a questão do destino em oposição aos atos e escolhas de cada pessoa.

No sentido de que se trata também de um filme sobre amor e desamor, RODA GIGANTE também dialoga com o título anterior de Allen, CAFÉ SOCIETY (2016). Ambos são contos de época sobre pessoas que se apaixonam, mas que percebem que seus objetos de desejo não estão tão à disposição quanto elas gostariam. A cena do relógio em RODA GIGANTE é uma das mais dolorosas. Nada nos prepara, porém, para o desfecho: sutil e ao mesmo tempo carregado de força cinematográfica e teatral.

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