sexta-feira, fevereiro 12, 2021

O TESOURO DE BARBA RUBRA (Moonfleet)



Acostumei-me tanto com o preto e branco estiloso de Fritz Lang (e me apaixonei por ele, na verdade) que confesso que já cheguei para ver O TESOURO DE BARBA RUBRA (1955) com um pouco de má vontade. Mesmo tendo pelo menos uma curiosidade e um detalhe importante, que é o fato de ser o único de seus filmes com janela em scope, e de ter um colorido também bem vivo e bonito, há algo de muito próprio daqueles filmes épicos nascidos com o advento do cinemascope que me desanimaram um pouco. Sem falar que a trama do filme não me pegou. O que mais gostei foi do aspecto formal. E, ao que parece, foi isso que também elevou o filme a status de obra-prima por vários críticos franceses dos anos 1960.

Quando Fritz Lang recebeu o convite para a produção do filme ele nem pensou duas vezes e nem queria saber muito do que se tratava. Afinal, era a chance de trabalhar na MGM novamente, desde sua bem-sucedida estreia em 1936 com FÚRIA. E para fazer a produção mais cara já realizada por ele em Hollywood. Talvez por eu já saber da famosa reclamação de Lang com o formato de tela (ele dizia que só servia para filmar cobras e funerais), eu fiquei mais atento com o uso da imagem e de fato pode ser complicado ter que preencher a tela com alguma coisa em cenas com apenas uma ou duas pessoas mostradas em plano geral.

E há muito plano geral em O TESOURO DE BARBA RUIVA, já que havia mesmo a intenção naquela época de chamar a atenção do público novamente para os cinemas, que já estava perdendo audiência para o sucesso da televisão nos lares. A cor e o tamanho da tela eram, assim, dois grandes chamarizes. E por mais que eu não tenha amado o filme, tenho que admitir que há sim momentos de tensão muito interessantes, como o uso do suspense na cena do poço.

O filme começa com a chegada do jovem órfão John Mohune, de onze anos de idade, na cidade de Moonfleet. Ele já chega assustado com a imagem de um anjo de madeira, que mais parece um demônio, no cemitério. O uso da música dá ao filme logo de cara um tom de horror gótico, tom que retorna com certa frequência ao longo da narrativa. O resto da trama será praticamente toda vista pelos olhos do garoto, que se depara com um jogo de intrigas envolvendo um grupo de contrabandistas e uma aristocracia corrupta. A missão do pequeno John é encontrar um amigo que sua falecida mãe havia dito ser de confiança, Jeremy Fox (Stewart Granger), um dos líderes dos contrabandistas, mas também um sujeito que ganha a simpatia quando consegue ser cínico, mas também gentil, cavalheiro e corajoso.

Como o filme é visto pelo olhar de John e como ele vê Fox como uma espécie de herói, um certo romantismo é sentido no ar, ainda que Lang seja um diretor muito interessado na forma e isso faça com que criemos algum distanciamento dos personagens. No caso, há um distanciamento entre e espectador e protagonista (o garoto) também no momento final, quando o espectador sabe que o personagem de Fox está morto, mas o garoto o espera, deixando o portão da mansão aberto para quando seu grande amigo voltar. É mais um exemplo de final agridoce comum em diversas obras do realizador, ainda que sem a força, por exemplo, de um SÓ A MULHER PECA (1952), para citar um que me impactou muito.

+ TRÊS FILMES

PINÓQUIO

É curioso essa coisa de querer fazer um filme mais sombrio de Pinóquio. Esperava algo mais perturbador vindo de um diretor que fez filmes violentos da máfia italiana. No fim das contas, a narrativa de PINÓQUIO (2019), de Matteo Garrone, me pareceu um tanto tediosa, mesmo quando tratava de situações bem fantásticas, como na cena da baleia (ou seria um peixe maior?). Eu lembro que quando eu era criança fiquei muito impressionado com o momento em que Pinóquio se transforma em um jumento. Aquilo me apavorou, mesmo na animação da Disney. Aliás, as animações da Disney já foram mais ousadas nesse sentido: não tinham medo de traumatizar as crianças. O visual do filme é bonito, mas achei que faltou magia, principalmente nas cenas com a fada. E que ideia idiota da distribuidora de mandar pra cá as cópias dubladas em inglês. hein?! E é um inglês com sotaque italiano.

UM CRIME EM COMUM (Un Crimen Común)

A atriz de UM CRIME EM COMUM (2020), de Francisco Márquez, é ótima; o filme não consegue se manter nos momentos de suspense. E a atriz é a principal daquela filme enorme de mais de 13 horas de duração, LA FLOR, de Mariano Llinás. Bom saber. Mais um motivo para ver o LA FLOR em um dia em que estiver com disposição. Na trama, uma professora de sociologia comete o erro de ter medo na noite em que o filho da empregada mais precisava. Queria ter me conectado melhor com a angústia da personagem em esconder seu segredo. Não rolou desta vez, mas eu até daria uma nova chance ao filme num futuro próximo ou não tão próximo.

RIVER OF GRASS

Nesta estreia na direção de Kelly Reichardt podemos ver sementes do que apareceriam em filmes como WENDY E LUCY (2008) e FIRST COW (2019), mas é uma obra muito mais distanciada e talvez mais alegórica também. Os personagens não são fáceis de serem gostados, mas ao que parece não é essa a preocupação de RIVER OF GRASS (1994). Acho interessante o jeito mais bruto do material produzido, a figura feminina querendo distância da rotina de mãe e da família e também da voice-over que se diferencia bastante dos filmes noir. Aqui temos a voz da mulher nos ajudando um pouco a entender a personagem. Às vezes parece uma muleta, mas tem a sua beleza. Só depois que a diretora ganharia força para contar a história muito mais com as imagens do que com as palavras. (Se bem que eu adoro as palavras.)

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