O grego Yorgos Lanthimos é o caso de cineasta que conseguiu prestígio internacional através, primeiramente, do caráter único de seus filmes. O indicado ao Oscar de filme em língua estrangeira DENTE CANINO (2009) foi a obra que deu início ao domínio mundial desse cineasta cheio de idiossincrasias. Nesse filme já se percebia um gosto tanto pelo bizarro quanto por um senso de humor muito particular. Afinal, por mais que alguém ache o filme um tanto perturbador em diversos aspectos, há ali tantos momentos desconcertantes que às vezes o que nos resta é rir.
O gosto pelo surreal inundou o seu primeiro filme em língua inglesa, O LAGOSTA (2015), que contou com astros de Hollywood de primeiro escalão (Colin Farrell e Rachel Weisz).Trata-se de uma obra difícil de classificar, embora alguns possam imaginá-la como uma comédia romântica perversa e bizarra. A trama nos apresenta a um mundo em que pessoas que não conseguem um par são condenadas a se transformarem em animais. Detalhe: elas tem o direito de escolher que animal se tornar.
O trabalho seguinte de Lanthimos, O SACRIFÍCIO DO CERVO SAGRADO (2017), já se encaminhava mais para o gênero horror, embora fuja dos clichês e seja igualmente estranho. Mas é inegável o flerte pela atmosfera de medo, que intensifica os climas dos trabalhos anteriores do diretor. O filme contou novamente com Colin Farrell, no papel de um cirurgião, e mais uma vez em um trabalho de dramaturgia estranha, como pede o diretor, e também com Nicole Kidman, no papel da esposa. Os dois são perturbados por um jovem adolescente com sede de vingança.
Eis que o cineasta grego chuta a porta com os dois pés em seu mais recente trabalho, já que A FAVORITA (2018) recebeu 10 indicações ao Oscar. Trata-se de um filme bem mais acessível, do ponto de vista das esquisitices, mas ainda assim pega desprevenido muitos espectadores que vão ao cinema ver um drama de época inglês típico. Para começar, há quem entre na sala sem saber que o filme também lida com a temática do relacionamento homossexual. Como estamos vivendo um período em que o conservadorismo está mais forte, isso pode incomodar a alguns desavisados.
Mas A FAVORITA é, antes de tudo, um filme sobre o jogo de poder. E há tempos não vemos um trio de atrizes tão fortes representando seus papéis com tanta beleza que até parece que o jogo de poder também acontece por trás das câmeras, no sentido de que Emma Stone, Rachel Weisz e Olivia Colman, que se tornou famosa nos Estados Unidos com este filme, parecem disputar não apenas o seu papel, mas também o nosso respeito e admiração.
Na trama, Emma Stone é uma jovem pobre que é recebida para trabalhar no palácio de Anne (Colman), Rainha da Inglaterra do início do século XVIII. Além de ela chegar toda cheia de lama e fezes, ainda é ridicularizada pela mulher que é o braço direito da rainha (Weisz, inspirada). O que a jovem descobre, graças à sua inteligência e luta pela sobrevivência naquele ninho de cobras, é que as personagens de Colman e Weisz também são amantes. É então que ela percebe o caminho para conquistar o seu lugar ao sol, através daquela rainha que na maioria das vezes mais parece uma criança mimada.
Para contar essa história, Lanthimos usa lente grande angular que se destaca principalmente nos interiores. Há também cenas com utilização apenas de luz natural, o que só aumenta a comparação que o filme vem recebendo com BARRY LYNDON, de Stanley Kubrick. Há também uma suntuosidade nos cenários e figurinos que é de dar gosto, mesmo a quem não está muito interessado no enredo. Se bem que é difícil não se divertir com a trama e com o show de interpretação das três atrizes. Gostei especialmente de Stone, que ganha talvez até mais tempo de cena que a Olivia Colman. As cenas dela tentando seduzir um dos nobres do castelo a base de porrada são muito engraçadas.
Em tempos de safra fraca de filmes indicados à categoria principal do Oscar, A FAVORITA é um alívio e tanto.
A FAVORITA recebeu indicações ao Oscar nas categorias de filme, direção, atriz (Olivia Colman), atrizes coadjuvantes (Emma Stone e Rachel Weisz), roteiro original, desenho de produção, figurino, direção de fotografia e montagem.
+ TRÊS FILMES
GREEN BOOK - O GUIA (Green Book)
Que safra horrível a do Oscar deste ano, hein! O que é isso, meu Deus? Há tempos eu não vejo um filme tão medíocre assim. Não é que seja ruim, mas tem toda pinta de filme ultrapassado, que até se costumava a ver em premiações dos anos 80, por exemplo. E que discussões rasas que o filme provoca. Um desperdício de uma dupla de atores ótimos. Na trama, homem branco e rude de origem italiana é contratado para ser o chofer de um músico negro nos Estados Unidos dos anos 1960. Indicado ao Oscar nas categorias de filme, ator (Viggo Mortensen), ator coadjuvante (Mahershala Ali), roteiro original e montagem. Direção: Peter Farrelly. Ano: 2018.
A ESPOSA (The Wife)
Perde na originalidade e na construção dramática para o MONSIEUR & MADAME ADELMAN, de Nicolas Bedos, mas não dá para negar que é um filme que consegue capturar o espectador do início ao fim. Gosto bastante das cenas de flashback e da personagem jovem. Como não é uma história real, mas baseado em um romance, fica difícil comprar às vezes a trama. Ainda mais em pelo século XX. Indicado ao Oscar de melhor atriz para Glenn Close. Direção: Björn L Runge. Ano: 2017.
ASSUNTO DE FAMÍLIA (Manbiki Kazoku)
Difícil não gostar do Koreeda e do modo sensível com que ele aborda os dramas familiares. Acho que ainda gosto mais de PAIS & FILHOS e DEPOIS DA TEMPESTADE, mas este aqui tem algo em comum com o primeiro. O interessante é que primeiro o filme faz com que a gente goste daquelas pessoas imperfeitas para depois fazê-las entrar em situações mais dramáticas, longe da rotina de comer e se socializar em família. O último frame é lindo. Indicado ao Oscar de filme em língua estrangeira. Direção: Hirokazu Koreeda. Ano: 2018.
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