quarta-feira, agosto 19, 2009

SE NADA MAIS DER CERTO






















Em certo momento de SE NADA MAIS DER CERTO (2009), um dos protagonistas faz uns questionamentos interessantes: "qual a lógica do pobre quando ele rouba alguém que tem mais dinheiro do que ele?", "qual a lógica de querer algo que ele não tem?" e "qual a lógica do rico que rouba o pobre se ele já tem?". O filme abre com uma frase do filósofo Jean-Jacques Rousseau que diz: "Uma sociedade só é democrática quando ninguém for tão rico que possa comprar alguém e ninguém seja tão pobre que tenha de se vender a alguém". E é com reflexões como essa que José Eduardo Belmonte se firma como um dos cineastas brasileiros que melhor tratam de questões políticas no país. A CONCEPÇÃO (2005), que também mostrava personagens que transgridem as regras da sociedade, já apontava para esse caminho. Com o novo filme, ainda que sofra de uma duração um pouco excessiva, nota-se que o cineasta ganhou maturidade.

Seguindo também a maturidade está Cauã Raymond, que se mostrou perfeito para o papel do jornalista freelancer que está passando por sérias dificuldades financeiras e que encontra num taxista (João Miguel) e numa traficante andrógina (Caroline Abras) parceiros de luta, ainda que tenham que praticar atos criminosos para seguir vivendo. Se o personagem de João Miguel não é tão bem aprofundado no filme, Caroline Abras como a Marcin é uma bela de uma revelação. Também no elenco, mas em papéis menores, vale destacar Milhem Cortez, que já havia trabalhado com Belmonte em papel de destaque em A CONCEPÇÃO (2005) e que nesse filme aparece como um travesti; e Leandra Leal, que aparece aparentemente sem maquiagem.

O filme adota esse visual despojado em seus personagens, quase sem retoques, em contraponto a uma classe na construção dos planos e certa inventividade na divisão por capítulos. O título de capítulo mais memorável é "o trabalho danifica o homem". O que me incomodou no filme foi justamente o que eu já comentei no primeiro parágrafo: em certo momento, já não acompanhei o mesmo pique inicial. É como se Belmonte não quisesse se desfazer de seus personagens e esticou demais o enredo. Mas nem dá pra dizer que alguns cortes tornariam o filme mais fluido, já que em certos casos acontece justamente o contrário. O filme apresenta uma interessante quebra no tempo narrativo, com saltos temporais que só são notados a partir de alguns diálogos.

Por mais que eu não compartilhe da opinião de que SE NADA MAIS DER CERTO é um grande filme, não deixa de ser estimulante ver um novo cineasta brasileiro despontando com trabalhos interessantes e provocadores. Agora é esperar que o filme anterior de Belmonte, MEU MUNDO EM PERIGO (2007), seja lançado pelo menos em dvd no Brasil.

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