quinta-feira, abril 24, 2008

VIOLÊNCIA GRATUITA (Funny Games)



Até onde me lembro o alemão Michael Haneke sempre foi um cineasta mais odiado do que amado, fazendo sempre trabalhos polêmicos. Porém, quando surgiu com CACHÉ (2005), a crítica quase em peso se rendeu ao talento do diretor. E quando isso acontece, é mais ou menos como aconteceu com Gus Van Sant: toda a filmografia pregressa do diretor passa a ser reavaliada. Nesse contexto, e por ocasião da expectativa para o lançamento no Brasil da refilmagem americana de VIOLÊNCIA GRATUITA (1997), dirigida pelo próprio Haneke, resolvi priorizar a apreciação do original, que foi acusado por muitos como um filme asqueroso. Como o filme original não é americano e naquela época o público médio ainda não estava acostumado com filmes de tortura como O ALBERGUE e JOGOS MORTAIS, e como geralmente esses filmes europeus passam em salas do circuito alternativo - supostamente freqüentadas por pessoas menos acostumadas ao horror e ao cinema de gênero em geral - é até natural que VIOLÊNCIA GRATUITA tenha sido reprovado de tal maneira.

Mas uma coisa é certa: é impossível assistir VIOLÊNCIA GRATUITA e ficar apático ou sem demonstrar qualquer reação. A intenção de Haneke é mesmo causar mal estar na platéia, ainda que não haja em momento algum do filme uma seqüência de violência gráfica. Prova de que um bom diretor consegue encher a tela de violência e crueldade sem mostrar balas ou facas penetrando na carne - não que haja nada de errado com isso. Ainda que a câmera se esquive desses momentos mais violentos, a nossa mente, já abalada pela fragilidade da situação, sente o impacto de cada investida sádica dos dois vilões. E a expectativa de que haja alguma salvação para as vítimas vai se tornando quase nula à medida que o filme se aproxima de seu final. Tanto que Haneke usa um recurso genial, metalingüístico e de humor negro, para fugir até mesmo da tentação de fazer um filme em que haja alguma espécie de redenção ou alívio para as vítimas. Por isso, chegar até o final de VIOLÊNCIA GRATUITA é encontrar-se intoxicado de sentimentos negativos como o ódio e a frustração.

Na trama, um casal - Ulrich Mühe (o espião comunista de A VIDA DOS OUTROS) e Susanne Lothar - e seu filho pequeno viajam para uma casa de verão próxima a um lago para passar uma temporada de descanso. Desde o início, ao vermos os créditos iniciais com uma música perturbadora ao fundo, já temos a absoluta certeza de que o mal está por vir, na forma de dois rapazes que invadem a casa do casal para torturar física e psicologicamente e de forma lenta e gradual a família. Na refilmagem, como o papel dos homens perversos é interpretado por atores conhecidos - Tim Roth e Michael Pitt - pode ser que o impacto seja menor e o evenenamento que o original produz em nossa corrente sangüínea seja também inferior. A minha esperança é que Naomi Watts faça a diferença no papel principal. O risco de Haneke é estragar a sua própria obra por causa dos executivos de Hollywood, a exemplo do que aconteceu com o hoje esquecido George Sluizer, que fez do seu excepcional O SILÊNCIO DO LAGO um suspense bobo e genérico.

A propósito, consegui há algum tempo uma cópia de TEMPOS DE LOBO (2003), que pretendo ver em breve.