quinta-feira, janeiro 26, 2017

ATÉ O ÚLTIMO HOMEM (Hacksaw Ridge)























Finalmente, depois de uma década de espera, Mel Gibson retorna à função de diretor, depois de amargar momentos de rejeição do público, por causa de sua vida pessoal um tanto controversa. ATÉ O ÚLTIMO HOMEM (2016) é um trabalho muito coerente com sua obra, embora não tenha o mesmo peso de obras-primas como CORAÇÃO VALENTE (1995) e A PAIXÃO DE CRISTO (2004). Mas o que mais se esperava neste novo trabalho, sabendo que se trata de um drama de guerra, é podermos ter a chance de ver mais uma vez cenas de batalha bem coreografadas e extremamente gráficas e viscerais.

E Mel Gibson cumpre sim o que esperamos, mas até chegar este momento, que é o grande momento do filme, sem dúvida, temos que encarar um trabalho bem tradicional que emula as produções da Velha Hollywood, quando o mundo parecia mais ingênuo. Inclusive, as cenas do namoro do protagonista (Andrew Garfield) com a enfermeira por quem ele se apaixona (Teresa Palmer) são até um pouco cafonas, mas tudo isso não só é perdoado, como visto como algo muito belo.

A trama de ATÉ O ÚLTIMO HOMEM nos apresenta a Desmond Ross (Garfield), um rapaz que se alistou no exército para salvar vidas e se recusou a sequer pegar numa arma. Isso ia contra os seus princípios éticos e cristãos e por isso ele sofreu bullying de seus colegas durante o treinamento e quase foi para a corte marcial por desobedecer ordens de seus superiores.

No elenco, destaque para Vince Vaughn no papel do Sargento Howell, clássico sargento duração que arranca de seus soldados o máximo de suas capacidades, mas também representa, ao menos em um par de cenas, os momentos de maior alívio cômico do filme. Interessante que durante a sua primeira aparição, quando os demais soldados ficam todos tensos, só quem ri da situação é Desmond, o único que tem consciência daquele momento e do papel de ator do sargento. É um momento de aproximação do personagem com o público.

Gibson apresenta mais um filme que trata da culpa e da redenção, temas recorrentes em sua filmografia. Inclusive, não apenas de filmes que ele dirige, mas em outros em que ele "apenas" atua, como é o caso de obras tão diferentes entre si, como MÁQUINA MORTÍFERA (1987), O PATRIOTA (2000), SINAIS (2002) e O FIM DA ESCURIDÃO (2010). Ator-autor, Gibson empresta muito de suas crenças e obsessões a seus personagens. A culpa em ATÉ O ÚLTIMO HOMEM aparece principalmente quando Ross vê seu pai batendo na mãe e reage com uma arma. Naquele momento, diz ele, é como se ele tivesse matado o pai, mesmo não tendo feito. A culpa, assim, funcionou como catalisador das ações pacifistas do herói.

Sobre o ato de heroísmo de Ross, é algo tão impressionante que, se não tivesse acontecido na vida real, jamais acreditaríamos em um roteiro original contando tal história. Não se trata de um simples militar pacifista que age bravamente, como o Sargento York, do filme homônimo de Howard Hawks, mas de alguém que não apenas entra no inferno de uma guerra que desmonta e destrói os corpos dos jovens soldados, mas que prefere salvar vidas a ter que tirar.

A primeira cena do primeiro embate dos soldados com os japoneses é chocante. Não porque se trata de algo inédito em termos de carnificina (não é algo que já não tenha sido visto em O RESGATE DO SOLDADO RYAN, por exemplo), mas choca diante do que o filme vinha mostrando até então. É a total quebra da inocência, a saída do paraíso terreno e o encontro cara a cara com o inferno de corpos mutilados, dor e medo da morte, que chega de maneira tão rápida e assustadora.

O trabalho de edição do filme, que até então vinha se mostrando muito discreto, nessas cenas se apresentam admiráveis. Depois, há uma quebra desses instantes intensos do filme, mas que servem para mostrar os atos seguintes de Ross, os seus grandes atos de heroísmo e fé.

ATÉ O ÚLTIMO HOMEM foi indicado a seis Oscar: filme, direção, ator (Garfield), montagem, edição de som e mixagem de som.

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